Andava eu à procura de características dos líderes para cruzar com algumas ideias que tenho sobre o assunto e, eis senão quando, me aparecem as coisas mais estafadas do mundo: tens de ser criativo, tens de estar comprometido, tens de compreender os outros, tens de usar flexibilidade, tens de usar de forma correta a autoridade, tens de ter maturidade, tens de conhecer bem as tuas pessoas, tens de ser um exemplo para todos, tens de te manter atualizado, tens de irradiar energia, tens de treinar as tuas pessoas, tens de estabelecer metas exequíveis, tens de estimular e desenvolver o trabalho em equipa, e por aí fora. São dezenas e dezenas, para não ir às centenas, de quotes deste tipo vindas dos sites mais insuspeitos. Digo eu. Insuspeitos porque são consultores, muitos deles, de recursos humanos ou de capital humano ou de pessoas, coisa que não sou. My bad.

Tomando pela base que nada percebo disto, deixo a minha ideia do que não é ser um líder. Se o quiseres ser prepara-te para uma coisa simples: esquece metade dos conselhos de amigo que te dão e confia mais em ti mesmo.

O que não é ser um líder? Um deus que tem todas e mais uma qualidade e que em nada falha. Alguém que procura listas de atributos, que pretende fazer o fit a tudo, que deseja estar bem com todos e chegar a todos e corresponder sempre de forma positiva a tudo quanto se lhe solicita. Um líder consensual, como já escrevi, não é um líder. É um líder que negociou com todos a sua liderança o que, em boa verdade, compromete caminho, direção e grandes objetivos desenhados. E acabará por deixar as suas pessoas a meio da ponte, a meio de nada.

Se há coisa má que se possa fazer a um líder é estar sempre à espera de qual o próximo coelho que vai tirar da cartola. O que irá ser? Irá surpreender-nos com o seu lado comprometido, com a sua energia, com um novo projeto? Não. Isso não existe. Não pode existir. Ninguém de bom senso aguenta ser líder assim. Ninguém de boa-fé expõe a sua liderança assim. Quer dizer, existe esse pseudo-líder, esse alguém perdido entre milhares de posts e frases bonitas, mas, como trade-off, trabalhando pouco naquilo que deve e sobretudo liderando pouco as suas pessoas. E, paralelamente, focando-se pouco em objetivos a cumprir.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Depois, bom, depois há um enormíssimo rol de coisas que não devias fazer para seres líder e que todos os que vão ao teu gabinete ou se cruzam contigo te transmitem como sendo obrigatório fazer. Vais anotando. Vais escrevendo. A tua bucket list não vai acabar nunca. Termina de uma vez com essas coisas que dizem que tens de fazer. Tens de cumprir isto. Tens de ser assim ou assado. Estar à altura das expetativas mais elevadas. Tens de te comportar desta maneira. Tens de te comportar daquela maneira. Esquece.

Como líder não vais fazer o que cada um quer que faças. Perderias a liderança em três tempos. Isso é a mesmíssima coisa que dizer “fazes desta maneira e a coisa resolve-se”. A resposta devia ser: “porque não resolves tu?”. Mas é a resposta que teima em aparecer a estes pseudo-líderes. “Porque não resolves?” “Ah, bom, porque não sou eu o líder.” Precisamos, para colmatar estas lacunas, de muitos shark tanks de liderança, de muitas simulações, sobretudo de muitos líderes por um dia, não líderes chamados a tomar decisões a sério, para saber como resolveriam mesmo, de facto, as coisas. E não apenas treinadores de bancada. Porque essa parte é fácil.

Tenho para comigo que se há coisa boa num líder é ser quem é. Transparente, próximo, acolhedor, claro. Mas também sabendo impor respeito e dando, concedendo, autonomia para que outros cresçam consigo. Tomando decisões, fazendo com que os seus se atravessem, conseguindo o seu compromisso e a sua responsabilidade. Não são eles os líderes. Mas pelo menos, assim, estarão a praticar liderança.

Deixo-te na poesia de Ricardo Reis (Fernando Pessoa) porque é do seu significado que precisas para te tornares tu, líder:

Para ser grande, sê inteiro: nada
Teu exagera ou exclui.
Sê todo em cada coisa. Põe quanto és
No mínimo que fazes.
Assim em cada lago a lua toda
Brilha, porque alta vive

E com um conselho final simples: não leias livros de auto-ajuda. Não sigas à letra frases que achas que têm todo o significado e julgas que são proferidas por este e aquele famoso humano. Este ou aquele líder galáctico. Não sejas isso. Sê tu. Simples. Não plástico. Frontal. Humano. Que agradece, que abraça, que pede licença, que diz bom dia às pessoas por quem passa.