Bastou Pedro Passos Coelho reaparecer durante um comício da AD em Faro e citar a imigração no seu improviso para “cair o Carmo e a Trindade” como se tal matéria fosse um tabu, reservado em exclusivo às esquerdas, que se arrogam donas do espaço público.

Houve, aliás, tópicos que, por qualquer razão misteriosa, não foram incluídos no cardápio dos “moderadores”, que intervieram nos vários debates de pré-campanha com os líderes dos partidos representados no parlamento.

A imigração foi um deles, juntamente com outros temas que deveriam ter sido obrigatórios no perímetro dos debates, como a Demografia, o pré-colapso do SNS, a paralisia dos serviços públicos, a Segurança, o estado da Justiça, a Defesa e a guerra na Europa, ou a agenda radical, partilhada pelo PS “de braço dado” com o Bloco.

Por estas e por outras percebeu-se, novamente, que o escrutínio mediático era feito pela rama, confrontando vezes sem conta Luís Montenegro com a hipótese de um qualquer acordo, formal ou por “debaixo da mesa”, com André Ventura e o Chega, sem que alguém incomodasse Pedro Nuno Santos, sobre a eventualidade de aliar-se com a extrema esquerda do Bloco e do PCP.

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Tão pouco houve quem questionasse o novel líder socialista, em especial, sobre o que disse e desdisse no capítulo da viabilização de um governo minoritário da AD, caso a Aliança vença as eleições, sem dispor de uma maioria aritmética no Parlamento.

Mais tarde, já em campanha eleitoral, o discurso de Pedro Nuno foi um imenso vazio, que nem António Costa conseguiu compensar num comício no Porto, voltado para os indecisos, procurando branquear os seus fracassos como governante, com o desplante de acusar Cavaco Silva de ter pretendido “acabar com o SNS”. Um absurdo.

Incapaz de apontar ao futuro, ou tão-pouco de apresentar obra feita, Costa deu uma pirueta política ao ponto de elogiar “a obra” de Pedro Nuno, que despediu por “indecente e má figura”. E este, sem medo do ridículo, ainda considerou que o seu percurso no governo foi a oportunidade “para crescer politicamente”.

Não cresceu. E, estranhamente, parece que no PS ninguém deu por isso…

Ao contrário de Cavaco Silva, que tinha obra para mostrar quando se despediu de São Bento e das funções de primeiro ministro, António Costa, por muito que lhe custe, amealhou promessas e anúncios, repetidos amiúde como se fossem novos, mas nada mais. Um embaraço.

À mingua de obra feita – o que já tinha acontecido enquanto autarca em Lisboa -, o “legado” de Costa é um deserto, o que legitima pensar-se que a “acção” não é o seu forte.

Compreende-se, assim, melhor, o mote escolhido por Pedro Nuno para os “outdoors” espalhados pela cidade, onde surge a palavra “Ação“ em letras garrafais, associada ao rosto do candidato.

Infelizmente, para Pedro Nuno, acção é algo que escasseia também para os seus lados, e quando quis “mostrar serviço“ foi o desastre que se sabe, desde o dossiê TAP , à ferrovia e, principalmente, à localização do novo aeroporto de Lisboa.

Sibilino, em registo de autodefesa, Costa ainda afirmou – naquele tom genérico e vago que o define -, que Pedro Nuno teria “muita obra para inaugurar”, caso chegasse a primeiro ministro, sem mencionar nenhuma.

Longe de ter feitio de empreendedor, Costa habituou-se a empurrar a obra “com a barriga”, desbaratando fundos em inúmeros estudos e pareceres em oito anos de governo.

Cavaco poderá ser lembrado pela Expo e o Parque das Nações, que permitiram a reconversão da degradada zona oriental de Lisboa, hoje uma das mais modernas e dinâmicas da cidade; ou pelo CCB, que criou uma nova e importante polaridade cultural; ou, ainda, por autoestradas que encurtaram as distâncias no País.

Experimente o prezado leitor descobrir uma obra pública que possa imputar à “acção” de Costa? Se ficar sem resposta, não estranhe, porque não será o único…

Costa especializou-se nas manhas políticas de bastidores, onde revelou uma apreciável destreza, mas foi um “empata” de serviço, excepto na reversão da TAP e na adopção da lei das 35 horas para a administração pública (prometida “sem encargos” para os cofres do Estado…), com os resultados que se sabe, principalmente na Saúde, cuja herança vai pesar no futuro governo.

Costa e Pedro Nuno são, afinal, duas almas gémeas, cujo testemunho não passará à História, salvo no tempo perdido.

Ao incorporar a imigração no seu discurso, cruzando-a com a segurança, Passos Coelho sacudiu o marasmo, embora tenha atraído o azedume das esquerdas, que o elegeram há muito como um dos “culpados“  das suas desgraças.

O antigo líder do PSD e ex-primeiro ministro de um governo ao qual coube a ingrata tarefa de recuperar o País da bancarrota em que Sócrates e o PS o tinham mergulhado, continua a ser uma “pedra no sapato” para as esquerdas que o demonizam como se fosse o fantasma de Belzebu….

E, no entanto, deveriam estar-lhe gratas, por ter sabido restaurar a confiança das agências de rating e  dos credores do País, libertando-o do jugo da troika, trazida pelo PS em desespero de causa.

A complexidade da imigração tem servido de mote e de bandeira às esquerdas, apenas como apelo emocional e irrestrito, como se Portugal – e já agora a Europa – não devessem proteger-se e corrigir uma política de portas escancaradas, que permitiu a invasão maciça de muita gente, que aprendeu depressa a hostilizar o “modus vivendi” europeu, tão cedo sentiu força para isso.

Entendamo-nos: os imigrantes são naturalmente bem-vindos, contribuindo com o seu desempenho para melhorar actividades com dificuldades de mão-de-obra, e para cobrir os desequilíbrios demográficos europeus, onde se registam baixas taxas de natalidade.

Desde que integrados nas diferentes comunidades nacionais, é fundamental, também, que partilhem o “elevador social”, sem condicionamentos, mas com respeito pelos usos e costumes locais, não impondo os seus como dogma, à sombra de políticos fracos, ávidos de garantir o voto.

Ora aquilo a que se tem assistido em Portugal, pela mão de governos socialistas, é que nem sequer houve condições para regularizar a situação dos imigrantes, chegados para trabalhos sazonais ou com contratos precários.

No início do ano, ao que foi noticiado, contavam-se cerca de 350 mil processos de regularização pendentes, podendo arrastar-se por dois anos e mais, com os brasileiros na liderança dos pedidos.

Dados recentes indicam que Portugal acolhe, hoje, mais de um milhão de estrangeiros, o que é importante para o País manter um saldo populacional positivo.

E mesmo com a nova AIMA (Agência para a Integração, Migrações e Asilo), herdeira de algumas das competências anteriormente atribuídas ao extinto SEF, as demoras não se alteraram, para desespero dos imigrantes que não logram por os papeis em dia.

No meio desta confusão institucionalizada, vicejam acomodações saturadas, e aumentam os sem abrigo acantonados no interior da estação do Oriente e noutros sítios da cidade.

Ou ainda, mais longe, no Alentejo -, em Beja, Odemira e Cuba, por exemplo -, onde os imigrantes se amontoam em espaços superlotados, insalubres e sem as condições mínimas de habitabilidade.

Portanto, o que Passos Coelho fez foi lembrar um problema sério que, como tantos outros, os governos socialistas têm “varrido para debaixo do tapete”, até ao dia em que se tornarem num “barril de pólvora”.

E isto não tem nada a ver com “xenofobia” nem com “racismo”, epítetos que fazem parte do arsenal das esquerdas, lestas a rotular quem se preocupa com os problemas de acolhimento, em vez de deixar os imigrantes ao “deus dará” … e à mercê das “milícias” ideológicas, situadas nos extremos, que germinam facilmente no terreno dos descontentamentos.

Que disse Passos Coelho para ser logo vilipendiado pelas esquerdas?  Tão simplesmente considerou que “precisamos de ter um país aberto à imigração, mas cuidado, porque temos de ter também um país seguro”.

É certo que o Relatório Anual de Segurança Interna, referente ao ano de 2022, não estabelece nenhuma relação de causa-efeito entre a criminalidade e a chegada de mais imigrantes. E, segundo o Observatório das Migrações, registou-se, até, uma diminuição dos reclusos estrangeiros, sendo muito deles “indivíduos em trânsito”.

O relatório reconhece mesmo uma tendência de descida, tanto na criminalidade geral como na criminalidade violenta e grave. São boas notícias.

Mas será isso bastante para negligenciar a segurança e ignorar a balbúrdia em que vive o enquadramento dos imigrantes, tanto ao nível da documentação como da sua subsistência e instalação?

Os relatos pungentes de dramas humanos têm inundado, regularmente, as páginas de jornais e as reportagens da televisão que, rapidamente, caiem no olvido e na indiferença dos políticos. A   Wikipédia, para nossa vergonha, chama-lhe a “escravatura moderna em Portugal”.

Passos Coelho teve razão em trazer o delicado tema a lume na campanha eleitoral. Afortunadamente, não tem medo de ser incómodo…

Nota em rodapé: Em plena campanha eleitoral a RTP 1 incluiu, a fechar o Jornal da Tarde de 1 de março, um cartoon simplesmente execrável, visando Pedro Passos Coelho. A RTP perdeu a compostura e o mais elementar sentido de imparcialidade que se espera do operador público. Em vez de humor, viu-se mau gosto. Lamentável.