De cada vez que reaparecem, presencialmente ou por escrito, Pedro Passos Coelho e Cavaco Silva têm o condão de deixar as esquerdas nervosas, ou num estado de ansiedade de quem vê neles a personificação do mafarrico…

Foi assim quando Cavaco surgiu, inesperado, em vésperas e durante a campanha eleitoral a defender as opções e as cores do PSD, convidando o eleitorado a não desperdiçar votos.

E repetiu-se agora com Passos Coelho, que se “atreveu” a apresentar um livro, elaborado em coautoria por quatro personalidades identificadas com a direita – entre as quais o ex-ministro, Bagão Félix e o académico Paulo Otero – e que remete, em título, para a “Identidade e Família”, um tema que as esquerdas avocam para si, segundo os seus preceitos iluminados e que consideram tabu fora da sua órbita.

A obra agora publicada, que reúne testemunhos de mais de duas dezenas de personalidades que se debruçaram sobre o tema, estava obviamente fadada para ser polémica, primeiro por reflectir sobre o conceito de família, segundo uma óptica não disfuncional; depois, por abordar noções tão pouco debatidas com seriedade, como a trajectória da “escola pública” ou a “ideologia de género”, sujeitos de uma doutrinação intensiva, designadamente, por parte de “militantes” oriundos de comunidades LGBT.

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Por fim, o livro inclui, ainda, depoimentos contrários à eutanásia ou à “cultura da morte”, matéria que as esquerdas querem definir como irrevogável.

Por isso, tanto os autores do livro como o apresentador do trabalho, meteram-se, voluntária e corajosamente, num vespeiro, que reage à defesa e contra-ataca sempre que pressente que os seus dogmas ou os chamados “direitos adquiridos” arriscam ser beliscados.

A controvérsia ficou mais azeda quando Passos Coelho, em complemento da apresentação do livro – onde lamentou que as políticas públicas “muitas vezes desconsideram a família e isso não é bom” -, se tenha “atrevido“, nas entrelinhas, a não excluir  uma aproximação  entre as direitas, com  André Ventura presente na sala.

E não hesitou mesmo em falar de rótulos, que “são colocados com uma intenção clara de desqualificar aqueles que lançam as discussões, de os diminuir e de os condicionar”.

De facto, basta olhar à volta e, sem esforço, logo se encontram, a cada passo, tentativas de condicionamento, com paragem obrigatória nas televisões, através de “oráculos”, pagos regiamente para semearem doutrinas culturais, sociais, de género e políticas – próximas, por vezes, de uma visão totalitária -, desqualificando quem está fora desse “casulo” ideológico.

Em certos aspectos, trata-se de uma agenda panfletária a lembrar, com outra configuração, os tempos vividos no PREC, posterior ao 25 de Abril, quando quem ousasse pensar fora da “caixa” era sumariamente desqualificado como “fascista” ou “reaccionário”.

Ademais – para recreio das esquerdas -, Ventura não se limitou a associar-se à sessão de lançamento do livro, indo mais longe ao classificar a intervenção de Passos Coelho como “brilhante “, e, pior um pouco, ao dar sinal de que o seu partido o apoiaria numa eventual candidatura à Presidência. Um sacrilégio …

O segundo mandato de Marcelo em Belém ainda vai a meio, mas a questão das presidenciais ameaça saltar para o espaço público, com putativos candidatos a perfilarem-se e a marcar o “território”.

E se, à direita, Passos Coelho parece ser um nome incontornável – até pelo seu talento federador -, acredita-se que o mesmo espaço não está fora dos planos e dos perímetros de interesses de Luís Marques Mendes e de Paulo Portas, que nunca descartaram tal hipótese, contando ambos com a visibilidade de terem “loja aberta”, semanalmente, em “prime time”, respectivamente, na SIC e na TVI.

O panorama à esquerda tem outros ingredientes e presumíveis candidatos. O ex-presidente da AR e ex-ministro de várias pastas, Augusto Santos Silva, mostra-se pouco inclinado a retomar a vida académica como prometera, e não esconde (nem disfarça…) a ambição de chegar a Belém, embora a sua desastrosa presidência parlamentar tenha comprometido essas aspirações.

E não será abusivo incluir António Costa entre os candidatos, por muito que diga o contrário, simulando um desprendimento que não tem e contando, à partida, ao que consta, com assento garantido nas televisões. Somos um país estranho, onde os políticos desempregados ou com aspirações em carteira, se “travestem” de “comentadores”, como se fosse a coisa mais natural da vida.

Sem esgotar o campo das esquerdas – longe disso – será sempre de ponderar o regresso, desejado por muitos, de António Guterres, apesar da sua deserção em 2001 para fugir ao pântano…

Quanto a Passos Coelho, desde que cessou funções de primeiro ministro, tem-se resguardado num prudente e avisado silêncio, só interrompido, de quando em quando, para intervenções cirúrgicas, como esta da apresentação do livro.

A seu favor, Passos Coelho tem o facto de ter sido, um dos primeiros ministros a quem os portugueses mais devem um espírito de missão e de serviço público, ao assumir o governo em 2011 – a seguir ao desgoverno de Sócrates -, de quem herdou um País de cofres vazios, à beira da bancarrota, e com a troika “à perna”, vigiando a aplicação do memorando, negociado e assinado pelos socialistas “in extremis”.

Por muito que porfiem, a direita e as forças políticas moderadas do grande centro, não dispõem de muitas alternativas credíveis no mesmo patamar em que se encontra Passos Coelho, se quisermos falar a sério da sucessão de Marcelo em Belém.

A propósito, poderá parecer tardio recuperar o ramalhete de condecorações que, mais ou menos pela calada, Marcelo Rebelo de Sousa resolveu outorgar no Verão do ano passado, a um sortido elenco de personalidades militares, ligadas ao período mais quente da Revolução e algumas delas suficientemente controversas.

Soube-se agora que a cerimónia, embora teoricamente pública, ficou reservada aos familiares e amigos dos condecorados, ao que se crê, em ambiente sigiloso.

De facto, o assunto só agora transpirou, talvez por influência da proximidade do cinquentenário do 25 de Abril e de uma indiscrição do jornal Público. Com uma santa candura, o Presidente explicaria, quase um ano volvido, que desconhecia o facto de o site da Presidência não se ter feito eco da cerimónia.

E, afinal, de quem se tratou? Entre as propostas de Vasco Lourenço, em nome da Associação 25 de Abril, figuravam António de Spínola, que presidiu à Junta de Salvação Nacional e Francisco da Costa Gomes, que foi Presidente da República, num período político complexo e assaz atribulado.

Sucedeu, porém, que a par de  outros oficiais generais que integraram a Junta, foram condecorados, também,  o almirante Rosa Coutinho, que ficaria conhecido por “almirante vermelho”, pelas suas ligações comunistas,  às quais nunca renunciou, bem afirmadas enquanto alto–comissário em Angola; e Vasco Gonçalves, o “companheiro Vasco “, um primeiro ministro “sui generis”, que andou também de “braço dado” com o PCP, e que se distinguiu pela  nacionalização da banca e das seguradoras,  pela chamada reforma agrária, além da estatização de várias grandes empresas, desde o imobiliário, à comunicação social e ao turismo. Um terço da economia, grosso modo, passou então para as mãos do Estado. Mais de 1 300 empresas.

Se não fosse o 25 de Novembro – e comemorar o seu cinquentenário é absolutamente imperativo –, o País teria resvalado para outra ditadura, de sinal comunista, e tanto Rosa Coutinho como Vasco Gonçalves rejubilariam, decerto, com a queda da democracia nascente, sob os auspícios do Partido Comunista e da antiga União Soviética.

E foram estes militares agraciados com a Ordem da Liberdade, quando lutaram convictamente contra ela. Um erro e um absurdo que ficam para História com assinatura de Marcelo. E que mancham a sua presidência.

Porém, a única condecoração que causou engulhos em alguma comunicação social e incomodou as esquerdas, foi a de Spínola, por acaso autor do livro “Portugal e o Futuro”, um êxito editorial ao tempo de Marcelo Caetano e que alavancou o fim do regime, além de ter liderado a Junta de Salvação Nacional, sendo ainda o primeiro Presidente da República indicado pelo MFA – Movimento das Forças Armadas.

Mesmo tendo em conta que Spínola foi dado como fundador e dirigente do MDLP, organização de direita, activa durante o período revolucionário, e, entretanto, extinta, que o levou a sair do País em setembro de 1974, o seu currículo de luta pela liberdade nada tem a ver com Rosa Coutinho ou Vasco Gonçalves.

E é bom não esquecer – quando se ouve ainda hoje Francisco Louçã proferir barbaridades sobre essa distinção -, que Spínola já fora condecorado, em finais dos anos 80, pelo Presidente Mário Soares, com a Grã-Cruz da Ordem Militar da Torre Espada. Com toda a justiça.

A “bolha mediática” está de novo efervescente, e, ultrapassada a paralisia momentânea que tolheu os “activistas” – atónitos com a mudança profunda da paisagem eleitoral -, ei-los que regressam em força, empenhados numa ofensiva que não anda longe das fronteiras do ”pensamento único”, com a maioria dos media a reboque, talvez tocados pelo espírito de esquerda que domina as comemorações do cinquentenário de Abril, instituindo-se como parte activa da oposição política.

O debate do programa do governo foi fértil em ensinamentos. Para desespero dos instalados, Luís Montenegro demonstrou, desde a tribuna do governo, não ter perdido a ironia e o treino de antigo líder parlamentar, mas dispensava a trapalhada do IRS à qual as oposições “chamaram um figo”

Já do lado da bancada da oposição, com a ligeireza e o radicalismo que o caracterizam, Pedro Nuno Santos cedo se desembaraçou de impropérios, ao lançar que “estamos perante um embuste, uma fraude, um Governo a enganar os portugueses”.

Com discurso semelhante, só André Ventura que, além de garantir que o Chega não será “muleta do governo”, acusou Montenegro de “chantagem à oposição”.  Se fossem gémeos não seriam tão parecidos…

Dure o que durar, esta legislatura promete…