O português tem tendência para o fado. Desde D. Sebastião que a resignação (muito cómoda) com o nosso triste destino nos caracteriza. Nas próximas eleições legislativas, vamos ter, na noite eleitoral, os protagonistas a lamentar a elevada abstenção, a dizer que é preciso “repensar”, que temos de “tomar medidas”, que os partidos têm de fazer uma “profunda reflexão”. É assim há mais de trinta anos. Depois, feito o velório das eleições, já ninguém se lembra.

Muitos dos eleitores que se abstêm fazem-no por não se reverem nos projectos políticos que lhes são propostos no cardápio dos partidos existentes e, por isso, em Portugal o socialismo continua e continuará a ganhar eleições. O eleitor de esquerda é, por natureza, muito mais militante do que o eleitor de direita. E cá vem de novo o fatalismo: estamos destinados a ser governados por socialistas incompetentes. E interrogamo-nos: porque é que os eleitores continuam a escolher maioritariamente o socialismo para nos governar quando estas políticas já deram provas suficientes de que não servem? Ah e tal, cá vamos andando, com poucochinho, mas é melhor isto que nada…

A esquerda é, de facto, muito competente a comunicar. Passa uma mensagem atractiva, numa linguagem fácil e, presentemente, até facilitada com a moda do pensamento único politicamente correcto. Vejamos a expectativa versus realidade deste discurso.

O socialismo defende uma sociedade sem classes e igualitária (expectativa). A realidade é que os recursos não são ilimitados, pelo que o que a esquerda propõe é nivelar por baixo, de modo a que se consiga essa desejada igualdade para todos e não segundo os méritos de cada um, de modo que ninguém é estimulado a esforçar-se.

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Depois, a esquerda atribui ao capitalismo a origem de todos os males da sociedade, diaboliza os empresários, que considera tratarem mal os seus trabalhadores, explorando o sentimento de compaixão social por eles e gritando por “melhores salários” (expectativa). A realidade é que o progresso e a prosperidade no mundo ocidental se deve muito mais ao trabalho, à energia, ao talento e à criatividade dos empresários do que à acção dos políticos de esquerda que, no caso de Portugal, nos governaram nos últimos anos. Quem paga os salários são, maioritariamente, as empresas privadas e, por isso, é preciso que o estado não atrapalhe e que não sorva tudo o que essas empresas produzem.

Os outros jargões são “os direitos” (sem o sinalagma das obrigações): a saúde, a educação, a habitação que o estado deve assegurar (expectativa) e só através do serviço público, mesmo que este seja mais caro e menos eficiente. A realidade é que um político, quando gere a coisa pública, tem de ter, como primeira preocupação, a ideia de que o dinheiro que gere não é dinheiro sem dono – é dinheiro dos cidadãos, pelo que deve colocar o máximo cuidado na hora de o gerir e prestar contas depois. Esta ideia de responsabilidade perante os cidadãos obriga o político a procurar ser eficaz, e, por isso, se há uma empresa privada que presta melhor o serviço, de forma mais barata e eficiente, um gestor público, prudente e criterioso, deve optar por essa solução. E nem se diga que a encomenda pública vai engordar uma empresa privada (o discurso da esquerda mais radical): a verdade é que é preferível adjudicar o serviço a um privado que presta melhor e mais barato do que ser o estado a levar a cabo a tarefa. Se o serviço fica mais barato, os contribuintes poupam dinheiro, pagando menos impostos. E o dinheiro está melhor nos bolsos do contribuinte do que nos cofres do estado.

A esquerda consegue, à custa deste bem falar, passar a ideia de que ser de esquerda é ser progressista, é ser solidário, é ser anti-racista, pacifista, anti-clericalista (expectativa). A realidade é que muitas destas ideias que a esquerda reivindica não as pratica (lembre-se as manifestações pró-palestina e a defesa disfarçada dos talibãs, para ilustrar que a esquerda não é nem anti-racista nem pacifista) e, por outro lado, a direita também as tem e até de forma mais saliente, como é o caso do apego ao humanismo, à solidariedade e à igualdade de oportunidades para todos, segundo os méritos e as competências de cada um.

Acresce que a esquerda sempre cultivou, em demasia, o bom conceito que tem de si mesma: um intelectual, um homem das artes, da cultura, um escritor, um jornalista, teria de ser de esquerda, para ser aceite e ser credível (expectativa). Esta ideia, errada, tem as suas raízes no Iluminismo e no racionalismo pré-revolução francesa, mas bastará, na realidade, recordar pensadores modernos e contemporâneos como Burke ou Hegel, Hayek ou Popper para ver que isto não é verdade.

A esquerda arvora-se defensora da liberdade (expectativa). A realidade é que a esquerda, defendendo o controlo estatal e a regulamentação de tudo, não se destaca, em rigor, por ser defensora da liberdade. Aliás, os pensadores de esquerda sempre consideraram, no essencial, que o povo não possui nem conhecimentos, nem vagar para ser soberano, excepto em momentos de curto delírio. Pelo contrário, para a direita, a liberdade é vista como a oportunidade de cada pessoa realizar o seu projecto de vida individual.

Depois há outra ideia equívoca: a de que a esquerda tem simpatia pelos que sofrem ou são explorados, o que agora se chama “sentido de justiça social” (expectativa), mas basta recordar Robespierre, Estaline, Maduro, Chavez ou Fidel, para verificar que isso é uma falácia (realidade). E não consta que os pensadores ou governantes de direita tivessem ou tenham menor preocupação com os que sofrem: pense-se em Angela Merkel ou em Tatcher ou, indo mais atrás, em Bismark, político conservador alemão, grande reformador, a quem se atribui a concepção do estado social.

Por fim, o ambiente: a esquerda enche a boca com a “emergência climática”, achando-se detentora do monopólio destas preocupações (expectativa). A realidade é que é nos países ocidentais, de regimes democráticos liberais, que se têm desenvolvido mais e melhor as políticas de protecção da natureza; é graças ao capitalismo que se desenvolvem tecnologias que permitem a digitalização, as energias renováveis, os veículos eléctricos. O que é que os países socialistas fizeram para contribuir para as políticas ambientais até agora? Nada! Por isso, o jargão do clima não passa de conversa para enganar tolos. Relembro que o primeiro político português da história da democracia preocupado com as questões da conservação da natureza era um homem de direita: Gonçalo Ribeiro Telles.

Portugal é exemplo vivo de que a esquerda não é progressista: veja-se a estagnação a que estamos votados há anos. De resto, basta pensar no “conservadorismo” atávico dos que vivem comodamente pendurados na máquina do estado (o objectivo é engrossar a dependência para assim reforçar a militância socialista), que votam geralmente na esquerda, para perceber que isso de progressista não tem nada. O socialismo significa retrocesso e não progresso.

A história e a nossa triste situação demonstram que os governos de esquerda tendem a assumir não só o controlo da economia, mas também da sociedade, da cultura e dos demais sectores. O estado domina, nos tempos que correm, tudo o que se passa em Portugal: a economia (as inúmeras empresas que vivem penduradas no estado, que sobrevivem de subsídios e à conta da encomenda e da contratação pública); a educação; a saúde; a imprensa e a cultura (com subvenções que mais não são do que a compra de cumplicidades); a sociedade em geral (o governo diz-nos o que devemos comer nas escolas e nos hospitais, o que é proibido comer, como devemos andar, a que horas podemos circular, que tipo de comportamentos seguros devemos adoptar).

Entretanto, o governo vai aprovando estratégias: estratégia nacional de combate à corrupção, estratégia nacional para a educação e cidadania, estratégia nacional para o hidrogénio, estratégia nacional de segurança no ciberespaço, estratégia nacional para o mar. E medidas concretas, reformas, melhorias que se vejam? Resolveram o problema da TAP, do Novo Banco, da corrupção, da PT, da CP? Resolveram o problema das pessoas que vivem nas áreas suburbanas em condições miseráveis? Resolveram ou atenuaram a pobreza (considerando que o rendimento médio anual dos portugueses não chega a 13 mil euros que não dá para viver dignamente)? Tudo isto, com a ajuda da esquerda radical, dos sindicados amestrados e de uma oposição até agora adormecida. Nada parece ser culpa do governo socialista, ainda continuam a achar que a culpa é do Passos.

E os portugueses, satisfeitos, continuam a escolher isto. Neste momento, a situação económica do país é vista como um incontornável e irresistível destino. Ninguém se importa, desde que continue a pingar ao fim do mês o magro salário. E assim continuamos a caminhar velozmente para ser o país mais pobre da Europa, apesar dos milhares de milhões de euros que todos os anos recebemos e desbaratamos da União Europeia e apesar dos milhares de milhões de euros que pagamos de impostos, taxas, taxinhas, portagens, emolumentos e contribuições de toda a sorte, para serviços públicos mínimos. Ao mesmo tempo, a nossa democracia vai-se degradando, caminhando calmamente para a unicidade.

O problema, infelizmente, não é apenas político: é de cultura e de atitude. É, por isso, urgente que os portugueses mudem para uma atitude de rigor, de exigência, de responsabilidade, que implica também exigir responsabilidades dos que nos governam. Eles foram eleitos para isso.