Devido à literatura, ao cinema a também à propaganda política, popularizou-se entre nós ocidentais uma ideia bastante romantizada da Rússia.

Para o imaginário de alguma direita, os russos no fundo são os fidalgos trágicos e afrancesados de Tolstoi, a linda família imperial martirizada pelos verdugos bolcheviques e até certos príncipes Volkonski ou Trubetzkoi exilados no Mónaco e destilando charme nas páginas acetinadas da revista Point de Vue.

E no subconsciente de grande parte da esquerda, mesmo daquela que se proclama moderada, a Rússia afinal é ainda a pátria da Revolução. A eterna herdeira dos corajosos marinheiros amotinados no couraçado Potemkin, dos ‘bons selvagens’ que invadiam palácios em São Petersburgo para beber champanhe e libertar os operários do mundo inteiro.

Talvez por ser canhoto de nascença, inclinado portanto à dissidência e à controvérsia, eu vejo a Rússia principalmente como a sucessora eurasiática das hordas tártaras e não tanto como um prolongamento exótico da nossa civilização europeia. Quem já passeou pelas ruas desabrigadas de Moscovo sentiu-se mais numa espécie de Mongólia do que numa réplica de Paris ou mesmo dos arredores fabris de Manchester.

Putin é um Gengis Khan, tão desdenhoso como cobiçoso deste Ocidente de que não desvia o olhar. Em alternativa, poderá ser eventualmente um Rasputine – ou seja, o bode expiatório a sacrificar perante a catástrofe iminente, por um dos príncipes da própria corte imperial.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR