No rescaldo das eleições espanholas muitos foram os comentadores e políticos a apontar o Vox como o grande derrotado. Pela perda de 19 deputados, por falhar o objectivo de conquistar representatividade suficiente para garantir, com o PP, uma maioria parlamentar, ou pela expectativa para uns, receio para outros, de que conseguisse continuar a crescer.

O Vox teve indubitavelmente um mau resultado, mas parece-me claro que o partido que detém o poder e o perde será sempre o maior derrotado de um acto eleitoral. A política é um jogo de poder, quem não o tem quer conquistá-lo, quem o tem quer mantê-lo, ao não conseguir esse intento, é o maior derrotado.

A vitória do PP não foi o que se esperava, o Vox perdeu eleitos e juntos não conseguiram a maioria, mas o medo ou o alarme social que a esquerda tentou colar à possibilidade de a direita conseguir chegar ao poder, mesmo a reboque, devia ser consideravelmente inferior à gravidade que advém do PSOE se unir a partidos que albergam assassinos e terroristas para chegar ao poder, mesmo não tendo vencido as eleições. Isto sim, não só é pouco democrático, nada ético e bastante perigoso.

Existem semelhanças com a situação portuguesa, mas de forma nenhuma se podem fazer comparações directas, por várias razões. Em Portugal, o Partido Socialista, mesmo perdendo eleições uniu-se ao PCP e ao BE e tem também o desplante de agitar a bandeira do medo dos extremismos, não obstante o acordo com um partido que tinha nos seus órgãos, terroristas condenados (como denunciei em 2019).

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Também por cá é provável que o PSD volte a vencer as eleições, mas também é possível que não consiga, unindo-se ao Chega, atingir a maioria parlamentar. O crescimento do PP em Espanha foi à custa do Vox, por cá os descontentes e revoltados continuarão a votar Ventura, como forma de protesto, mas o PSD crescerá também às custas do Chega e da Iniciativa Liberal. Na minha opinião tanto o Chega como o seu líder atingiram o seu ponto de incompetência (princípio de Peter), tiveram o mérito de crescer até certo nível, mas foram colocados num patamar onde já não conseguem ter uma boa performance. O que pode ter influência nesta equação é também a falta de carisma e a incapacidade de Luís Montenegro se assumir como uma verdadeira alternativa e sobretudo a sua falta de coragem ao não conseguir assumir se faz ou não uma coligação pós-eleitoral com André Ventura. Os portugueses são um povo de garra e coragem, gostam muito pouco destes “nins”.

É claro para todos que a haver alternativa, serão os sociais-democratas, mas nem estes acreditam já na capacidade de Montenegro chegar aos portugueses. Pedro Passos Coelho seria a melhor opção, Moedas é falado, mas não se vislumbram mais alternativas e Montenegro pode ver-se como primeiro-ministro, pois na esquerda não haverá o voto útil de 2022 e não parece que PCP e BE cometam o erro de formar uma segunda geringonça.

Comparar o Vox ao Chega também não é linear, os espanhóis são um partido com mais anos, bem estruturado, com várias cabeças e vários rostos, goste-se ou não, com valor e densidade intelectual, com uma linha política coerente, tudo aquilo que o Chega não é.

Escrevi há uns anos que dificilmente um partido marcadamente personalista passaria dos 9% numas eleições legislativas e mantenho essa ideia, lembrando que as próximas são as europeias e nessas os portugueses habituaram-se a protestar. Podia haver aqui uma forma do Chega capitalizar um, até provavelmente interessante, resultado e o seu presidente sabe que pode ser a sua derradeira hipótese. Por isto, chegado de Espanha, reuniu o seu gabinete parlamentar para lhes pedir mais qualidade, mais empenho e mais força nas redes sociais. O presidente do Chega ainda está convencido que a qualidade e a capacitação surgem por osmose, mas na realidade está a pagar, até ao nível do escaldante clima interno, pelas (exclusivamente) suas escolhas.

Os resultados de Espanha demonstram que as políticas de esquerda lhes garantem um eleitorado fiel, agarrado a subsídios e apoios, a um aumento do número de funcionários públicos, mas que de uma forma geral, o povo está descontente. Em Portugal os socialistas também fidelizaram o seu eleitorado da mesma forma, mas o estado lastimoso da saúde, da educação, os aumentos das rendas, a manifesta incompetência de alguns dos ministros, o clima de insegurança crescente, a política de imigração inconsciente e a diminuição da qualidade de vida, vão levar a uma dispersão de votos.

No aproveitamento dos ventos de Espanha, o PS terá de fazer muito mais do que tem feito. No Chega, Ventura parece ter esgotado as estratégias populistas e suspeito que teremos um Ventura mascarado de político moderado e a tentar uma mais clara aproximação ao eleitorado social-democrata e a uma direita social. A Iniciativa Liberal parece-me perdida em problemas internos e vai dar muitos votos ao PSD que, terá de içar as velas e ganhar a coragem para se definir e enfrentar as tormentas, porque tempos difíceis se adivinham.