Faz esta terça-feira um ano que o Presidente da República convocou pela última vez o Conselho de Estado. A temperatura política havia disparado com o chumbo do Tribunal Constitucional (TC) de abril, que provocou um rombo nas contas do Governo de cerca de 1300 milhões de euros. Um mês depois, Cavaco convocaria aquela que acabou por ser a última reunião do órgão consultivo do Presidente.

Essa reunião transformou-se numa autêntica esgrima política. O chefe de Estado colocou na agenda da discussão o pós-troika, mas à mesa os presentes acabaram por centrar-se no (nessa altura) ainda recente chumbo do TC ao Orçamento do Estado desse ano, que abalou o Governo e desencadeou críticas aos juízes do TC.

O presidente do TC, Joaquim Sousa Ribeiro, que tem direito por inerência de funções a uma das cadeiras do Conselho de Estado, levou um discurso preparado para ser dito cara a cara ao primeiro-ministro, Passos Coelho, sentado mesmo à sua frente na longa mesa rectangular do Palácio de Belém.

Segundo relatos do encontro que decorreu à porta fechada, Sousa Ribeiro disse ao líder do Executivo que a Constituição está acima do memorando com a troika e que os juízes são independentes face aos poderes políticos. “Vou dizer uma coisa muito simples e muito elementar, mas simultaneamente muito forte e que ninguém se pode esquecer, são as leis, e inclusivamente a lei do Orçamento, que têm de conformar à Constituição e não é a Constituição que tem de se conformar a qualquer lei”, afirmou, segundo o Diário de Notícias.

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A polémica prolongou-se ainda com uma discussão sobre o teor do comunicado que o Presidente preparou, porque conselheiros como Jorge Sampaio consideraram que este não podia deixar de mencionar os temas que estiveram em cima da mesa.

Outra vez o TC

O Governo vive, hoje, novamente dias difíceis perante um novo e provável chumbo do TC ao Orçamento do Estado deste ano. Tal como o Observador noticiou na segunda-feira, o TC inclina-se para declarar inconstitucionais três das quatro normas daquele documento, que se encontram no Palácio Ratton para apreciação – e que em termos de valor representa ainda mais dinheiro do que o chumbo de 2013.

A altura volta a ser delicada: depois do anúncio da saída limpa do programa de resgate, esse chumbo poderá implicar uma reabertura do processo de conclusão formal do resgate. Também na segunda-feira, em declarações ao Observador, Sousa Ribeiro fez questão de dizer que a decisão que em breve será tomada não está dependente do “timing das eleições europeias”. Numa conferência sobre direitos sociais, na Faculdade de Direito de Lisboa, realçou também que “homens em necessidade não são livres”, citando Roosevelt, e lembrando que o poder político nos últimos anos tem tentado sempre, alegando razões financeiras, limitar os direitos que a Constituição portuguesa consagra.

Cavaco Silva, que continua interessado em promover entendimentos pós-troika entre PSD e PS, poderá voltar a esse apelo depois das eleições europeias de domingo. É essa a expectativa do Governo, que já começou a insistir nos apelos de diálogo aos socialistas. Ao ponto de ter criado ‘ciúmes’ no próprio parceiro de coligação, o CDS – Passos chegou a admitir um acordo com os socialistas num próximo Governo.

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