Depois de uma discussão dura e prolongada num plenário realizado há quase um mês, os 13 juízes do Tribunal Constitucional aceleraram o processo de pronunciamento sobre a Contribuição Extraordinária de Solidariedade (CES), uma norma do Orçamento Retificativo que a oposição à esquerda contestou pela sua formulação mais dura face à que já tinha sido analisada no TC em abril do ano passado.

Com a análise da medida muito adiantada, as últimas informações que correram na última semana na AR apontavam para que a decisão possa chegar já esta semana, possivelmente na quarta-feira, dia em que está marcado novo plenário dos juízes. Uma fonte ouvida pelo Observador admitiu que a equipa do Ratton está muito dividida, levando a uma decisão renhida (7-6). Mas indicando como provável que os juízes se pronunciem maioritariamente a favor da constitucionalidade da medida — uma informação que o Observador não conseguiu confirmar com outras fontes.

As férias dos juízes do TC começam a 15 de agosto (até 15 de setembro). Durante esse período, o tribunal funciona com dois turnos (seis dos juízes trabalham durante 15 dias e os outros sete na segunda parte do tempo em que podem tirar férias).

Certo é que, com esta decisão, o Governo fica com campo livre para fechar decisões acerca das contas orçamentais deste ano. Depois do chumbo de três normas do OE de 2014, nos últimos dias de maio, o Executivo ficou com um buraco que estima em 860 milhões de euros brutos (será menor em termos líquidos, tendo em conta os impostos que ficam no Estado). Mas Passos, Portas e Maria Luís Albuquerque preferiram aguardar pela decisão sobre a CES até aprovar novas medidas, alegando que só com o quadro completo poderiam tomar decisões sólidas.

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O maior risco que corria com esta espera era o de um atraso na decisão do Palácio Ratton, que chegou a ser dado como provável no TC, tendo em conta o anúncio de que estariam para chegar mais duas medidas do Governo em fiscalização preventiva (que têm sempre urgência e obrigam a deixar outras matérias para segundas núpcias). O Observador deu conta dessa hipótese há quatro semanas: se essas leis chegassem antes de uma decisão, a CES ficaria para setembro, tornando mais difícil que as medidas a tomar (se necessárias) tivessem efeito suficiente para que os objetivos do défice fossem atingidos.

Esta semana, o caso tornou-se mais premente, com os resultados da execução orçamental de junho a mostrarem que o risco de falhar esse objetivo subiu.

Sabendo dos rumores de que uma decisão estava por dias, Passos avisou na quinta-feira, mesmo estando em Timor-Leste, que sem novas medidas o objetivo de 4% de limite do défice não poderiam ser atingidos. E responsabilizou as decisões do TC pelos desvios identificados. Uma forma de pressionar os juízes a uma decisão favorável neste próximo acórdão.

Uma discussão quente no Ratton

Segundo apurou o Observador, a discussão sobre a CES motivou uma forte divisão entre duas correntes no TC. E levou mesmo a uma inversão do memorando inicial do presidente do tribunal, que apontava há um mês para o chumbo da medida. Numa reunião descrita como “muito quente”, também as fugas de informação foram tema de contestação interna.

As informações que foi possível recolher apontam agora para uma possível constitucionalidade da medida, mas por margem mínima. Tendência que terá de ser confirmada na reunião desta semana (“não há decisão até estar tudo decidido”, alerta uma fonte conhecedora dos processos internos, para explicar que não basta uma concordância com a tese global, é preciso também maioria para os argumentos invocados no projeto de acórdão).

Um bom exemplo dessa imprevisibilidade foi o que aconteceu quando a CES original foi a julgamento em abril de 2013. Muitos constitucionalistas e políticos admitiam um chumbo redondo da medida, mas esta foi (a par do aumento de impostos) a única a passar no crivo constitucional. A dúvida que sobrou foram os argumentos de transitoriedade que justificaram a sua admissibilidade aos olhos de 8 dos 13 juízes.

A verdade é que as últimas estimativas sobre o impacto de uma decisão negativa para o Governo foram fortemente revistas em baixa nos últimos tempos. Os especialistas da UTAO, por exemplo, refizeram as contas sobre o aumento da CES decidido em janeiro, para fazer face ao chumbo do corte nas pensões do setor público (decisão do TC de dezembro de 2013), calculando o impacto da medida em pouco mais de 70 milhões de euros — como noticiou o Jornal de Negócios.