El Español, o novo projeto jornalístico de Pedro J. Ramírez, fundador e antigo diretor do El Mundo,  conseguiu reunir 3.606.600 euros em crowdfunding e 5595 investidores em menos de dois meses. O jornal digital, que até agora existia apenas em blogue, arranca no outono deste ano.

A fase de angariação na internet começou na noite de 10 de janeiro e não durou dois meses, tendo terminado à meia-noite deste último domingo. O montante reunido ultrapassou, logo no dia 14 de fevereiro, o recorde mundial de crowdfunding para projetos jornalísticos, que era de 1.38 milhões de euros. Os 5595 investidores serão acionistas da empresa e terão as mesmas condições que os fundadores, pode ler-se numa nota explicativa no blogue do El Español.

“Graças ao enorme apoio recebido, a nossa redação não estará vazia. Vamos enchê-la de boas histórias”, escreve-se na mesma publicação.

Quando saiu do El Mundo, Pedro J. Ramírez acordou com a Unidad Editorial, empresa que detém o jornal, que não poderia fundar outro meio de comunicação até 2016, recebendo uma compensação económica até à altura da sua reforma. Em novembro de 2014, foi feito um novo acordo com a Unidad Editorial, que libertou Ramírez da proibição de criar um novo meio, em troca da renúncia à compensação monetária.

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“O maior jornalista europeu”

No início de fevereiro de 2014, Pedro J. Ramírez, um dos mais conceituados jornalistas espanhóis (o Guardian chama-lhe o “maior jornalista espanhol e europeu” dos últimos 25 anos), foi afastado do El Mundo, jornal conservador que fundou em 1989 e que dirigiu durante 25 anos. Na altura, Ramírez afirmou ao New York Times que a sua saída se devia a pressões políticas do Governo de Mariano Rajoy, na sequência da investigação de casos de corrupção, um deles envolvendo o chefe do Executivo espanhol.

“É uma demonstração de força por parte de um Governo que quer enviar uma mensagem, não apenas ao El Mundo, mas a todo o setor dos meios de comunicação, para que quem atue de uma forma que o Governo veja como inconveniente saiba que pagará as consequências”, disse Ramírez ao prestigiado jornal norte-americano. “Aquilo que está a acontecer no Governo de Rajoy é particularmente grave porque trata-se de usar uma época de clara fraqueza económica para forçar os meios de comunicação a serem dóceis, servis e a praticarem autocensura”, acrescentou.

Em agosto de 2013, Rajoy acusou o El Mundo de manipular informação no caso das acusações de corrupção feitas por Luis Bárcenas, antigo tesoureiro do Partido Popular, contra o PP e o próprio Rajoy, acusando-o de receber pagamentos ilegais de magnatas da construção civil. O jornal conservador apoiou a candidatura do líder do PP em três eleições legislativas. Pedro J. Ramírez disse ao New York Times que tinha “uma boa relação com Rajoy até este ter chegado ao poder”.

A carreira jornalística de Pedro J. Ramírez começou nos anos 70, durante a transição democrática em Espanha. A criação do El Mundo, em 1989, deu a Ramírez uma reputação de jornalista de investigação independente. Antes do caso Bárcenas, que envolve o PP, o jornalista descobriu o envolvimento do governo socialista de Felipe González no financiamento dos Grupos Antiterroristas de Libertação (GAL) que praticaram o chamado “terrorismo de Estado”, levando a cabo ações armadas contra o grupo terrorista do país Basco, ETA. Os GAL foram responsáveis por 28 homicídios entre 1983 e 1987.

Em 1997, Ramírez (casado com a estilista espanhola Agatha Ruiz de la Prada) apareceu num vídeo sexual cuja divulgação pública levou à instauração de um processo que determinou que o vídeo tinha sido colocado em circulação para prejudicar a imagem do jornalista e do seu jornal, como lembra o New York Times. Um dos condenados foi o assistente pessoal do antigo primeiro-ministro espanhol Felipe González.

Aquando da sua saída do El Mundo, Ramírez foi questionado sobre o valor da indemnização. Respondeu, por telefone, ao New York Times: “Teria sido feliz se tivesse morrido como diretor do El Mundo sem receber qualquer indemnização”.