Apaixonado, imperfeito, banzado, magro, revolucionário, com ideias malucas, político, independente, curioso, otimista, com força, afetuoso, modesto, humilde, simples, com experiência, com história política e frontal. Nenhum destes adjetivos saiu da cabeça da autora deste artigo. Foram todos ditos pelo candidato Marcelo Rebelo de Sousa para se auto-descrever. Marcelo, o homem que se materializa à frente dos apoiantes, saído das ondas da televisão, faz uma espécie de show itinerante, com poucos recursos e muito desenrascanço, improviso ou talvez não e confiança nas capacidades do candidato. Ele e só ele. Resta saber se os votos se multiplicam.

Poderia chamar-se “um candidato e três viaturas” pelas estradas de Portugal, onde os assessores são uma espécie de canivetes-suíços faz-tudo e é neles que fecha a entourage de Marcelo. Acredita que se basta a si próprio, sem a ajuda do partido, dispensa a intervenção de Passos Coelho – “Não é bom para ninguém” que intervenha, disse – e carrega nos abraços e beijinhos – nos “afetos” como faz questão de repetir – para ser eleito à primeira.

A campanha do homem “imperfeito”, que se quer mostrar perfeito para o cargo, corre à velocidade da personagem, com muitos imprevistos previstos, apesar de o candidato dizer que se trata de uma campanha “sem mobilizações, sem qualquer tipo de organização”. Mas houve e num só dia, há dois para lhe mostrar que as coincidências trabalham-se.

Marcelo foi a Valpaços fora da agenda oficial, mas chegou lá e tinha dezenas de pessoas à espera na Casa do Vinho, um microfone e palco prontos para o homem que acredita estar “a um passo de ser o próximo Presidente da República”. Imprevisto? Nem por isso. Os apoiantes já sabiam há dias da iniciativa, por eventos do Facebook e até por mensagens do PSD da terra. Mas o dia não acabou sem mais surpresas, na agenda ditada pelo mau tempo que fez subir o Tua a níveis tão altos como há mais de dez anos. O imprevisível imprevisto foi anunciado pelo próprio Marcelo no início do discurso do comício em Mirandela, que estava a meio gás. Dito e feito; com direito a casaco da proteção civil, bombeiros junto à margem do rio e muito aparato para uma inundação de um parte do parque de estacionamento. Marcelo saiu, as câmaras de tv também… e os bombeiros também não ficaram lá.

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É assim a campanha do candidato da comunicação que quer ser “melhor Presidente” do que comentador. Marcelo sabe usar os meios que tem (o da comunicação e do relacionamento com as pessoas) e faz questão de dizer que os recursos (logística) são poucos. E por isso, no discurso, salta primeiro o que ele quer que se veja, depois, e não menos importante, as diferenças para os outros candidatos. Tudo porque Marcelo Rebelo de Sousa, o candidato, quer ser institucional, quer ser um Presidente para “unir” e “não pôr uma parte do país contra a outra”, mas as eleições são uma competição política e o professor quer vencer. E é nesta parte do guião que entram as críticas aos outros candidatos, sobretudo a Sampaio da Nóvoa.

“Portugal precisa de um Presidente que represente mesmo todos os portugueses. (…) Que cumpra mais do que uma missão política, é uma missão institucional. Não é de partido, de um grupo, de uma fação. Não é que não tenha uma história e uma biografia, uma origem, mas como Presidente deve ser mesmo Presidente de todos os portugueses. Não há um país novo e um país velho. Um tempo novo e um tempo velho. Um só tempo que é o tempo de Portugal”.

A história política de Marcelo é um trunfo que empunha como contraponto aos adversários. Foi o “autarca”, foi o membro de “associações de pais, IPSS’s, escolas, misericórdias, instituições políticas”, foi o homem que fez “consensos de regime” em momentos “cruciais como era a adesão ao euro”. Foi o comentador que agora quer que a campanha seja um espelho daquilo que o Presidente Marcelo fará se for eleito. O homem a ouvir as histórias do povo.

Por isso, em vez dos roteiros de Cavaco Silva, este social-democrata prefere as ações dos presidentes socialistas Mário Soares e Jorge Sampaio: as presidências abertas. “Chama-se presidências abertas ou outras formas mais rápidas, menos pesadas e com mais contacto, mas é mais importante o contacto espiritual, afetivo”, diz. Mais do que o contacto físico, porque esse não é mais importante e também cansa.

Diálogo num lar:

Idosa – As pernas já não respondem.

Candidato – As minhas às vezes também estão cansadas.

Idosa – E a cabeça…

Candidato – Da cabeça até agora… é que é o meu ganha pão. Se não estivesse bom da cabeça…

A avaliar pelo ritmo da campanha, está também bom das pernas. Marcelo vai à farmácia. Pergunta pelas novidades. Vai à feira em Boticas e come de tudo. Lembra que a “canela é afrodisíaco” e que a “noz é anti-cancerígena”. Vai a lares, a instituições e a centros juvenis. Passa por pastelarias e serve as pessoas. Vai a lares e canta os parabéns. Alinha em despiques…

É o que quer fazer por cinco anos de mandato. Não mais. Depois logo se vê. É que Marcelo assume que há imperfeições em todos os telhados.

“Quando eu era miúdo diziam-me: há uns que são perfeitos, depois há os imperfeitos. Somos todos imperfeitos”, dizia a um grupo de jovens com deficiência mental.

As imperfeições disfarçadas pela maquilhagem da televisão é o que Marcelo quer continuar a camuflar até às eleições. O candidato ex-comentador sabe que a televisão lhe deu o poder de chegar às pessoas como qualquer ator de telenovela, mas não é certo que a realidade não traga desilusão… além da física.

Eleitora – Ai, o professor. Gosto tanto de vê-lo na televisão…

Candidato – Sou mais gordo ou mais magro?

Eleitora – Mais magro.

Candidato – Já me disseram isso hoje. ‘Tem de comer. Tem de engordar’. Mas hoje vamos comer.

As sondagens das eleições ainda não são conhecidas, mas há já uma que Marcelo sabe que ganha a 100%: a televisão engorda e para os admiradores, está mais magro. E para não os preocupar, o candidato come. Pica aqui e ali, seja doce, como diz ser para os seus opositores, seja salgado, porque isto “a vida não está fácil”.