Abril de 2015. A popularidade de Pablo Iglesias — e sobretudo o lugar do “seu” Podemos nas sondagens –, que surpreendentemente chegou ao “oitenta”, caía perigosamente para um “oito”. E logo com as eleições, as autonómicas primeiro e as municipais depois, à porta.

Era preciso agir. E trabalhar a imagem de Iglesias, que se desgastava de dia para dia, muito por culpa do próprio. A assessoria de comunicação do partido chegou-se à frente e fez circular, internamente, uma estrategia de comunicación del secretario general, que é como diz, um documento em que se apontavam os erros cometidos, mas, sobretudo, soluções — desde logo para o discurso do rosto mais visível do partido. A conclusão era só uma: “Não há a menor dúvida de que nos últimos meses a figura de Pablo sofreu um desgaste importante”, lia-se no documento a que o El País teve acesso.

O eleitorado começava a encontrar mais semelhanças do que diferenças entre os partidos do arco governativo e o Podemos. Era fundamental fazer a ver a esse eleitorado que “não somos políticos que se usam da política, fechados em calculismo e na diplomacia”, aponta o documento de 38 páginas. Como fazê-lo? Pablo Iglesias teria que “cair menos na soberba” e usar um discurso em público “menos de comício, mais narrativo e explicativo.”

Iglesias, mais do que os restantes membros do Podemos, era o mais visado nesta nova estratégia de comunicação. Falava-se no “esgotamento do seu discurso”, num certo “endeusamento” da sua figura e, sobretudo, na “arrogância” que este usava ao falar. “Faz hoje [abril de 2015] um ano que Pablo Iglesias era um homem normal, podia falar de gente normal. Mas não é mais. Nem voltará a ser. Ele não pode estar sempre a usar do discurso do povo quando ele não é mais do povo. É um político.”

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Curiosamente, a mesma estratégia que pedia um Pablo Iglesias mais político, também o queria longe do aparelho partidário. Por exemplo quando lhe sugeria que deixasse de surgir em público “envolto numa bolha”, rodeado pela sua equipa. É que essa “escolta”, mais do que passar uma ideia de união interna, passa a imagem de um político “inacessível e que foge da imprensa e das pessoas.”

O que também é criticado neste documento é a aproximação de Pablo Iglesias à Venezuela e a Nicolás Maduro. Nesse ano de 2015, o líder do Podemos declararia ter recebido o dobro do que declarou em 2014: cerca de 108 mil euros, dos quais, segundo o El País, 49 mil correspondem à venda de livros e à apresentação do programa La Tuerka (programa que Enrique Riobóo, proprietário da estação madrilena Canal 33, onde o programa é emitido, diz ser financiado pela Venezuela e pelo Irão).

É preciso desligar-se o Podemos da ideia de partido “pequeno, radical e defensivo.” É preciso que Pablo Iglesias volte a ser “um tipo da rua, humilde, inteligente, ambicioso, razoável, pedagógico e transversal.”

Para conseguir tudo isto, era urgente que Iglesias surgisse mais em público, sobretudo em eventos não-políticos. O documento interno do Podemos sugere por exemplo uma visita ao “festival Otoño de Madrid, ao festival de teatro de Mérida, ao museu do Prado, à final da Taça do Rei ou a um concerto e Leonard Cohen.” Mais: propõe tirar Iglesias das grandes cidades e colocá-lo em contacto com a natureza. Literalmente. Entre uma visita a Doñana, Arapuerca ou uma escalada ao cume de Teide, propunha-se a Iglesias (confesso ateu) que fizesse o Caminho de Santiago. Ou parte dele.