Foi um dos heróis que mudou a história da música popular, a bordo dos A Tribe Called Quest, gente que transformou o hip hop e a forma como a música urbana chegou até nós desde o início dos anos 90. Phife Dawg, o melhor balanço possível para a atitude de Q-Tip, o outro MC que formava uma dupla imparável, morreu esta terça-feira aos 45 anos.

Dono de uma atitude imparável e de uma capacidade rara enquanto rapper, Phife Dawg nasceu em 1970 em Queens, Nova Iorque. Quase vizinho de Q-Tip, a amizade de ambos era um dos motores fundamentais para a dinâmica dos A Tribe Called Quest. Entre 1985 e 1998 editaram cinco álbuns e criaram uma unidade criativa marcante e irrepetível. O primeiro disco só o lançaram em 1990, “People’s Instinctive Travels and the Paths of Rhythm”, o mesmo que no ano passado cumpriu 25 anos de história.

Também no ano passado, e a propósito dessa mesma efeméride, a New York Magazine pedia a Phife Dawg que escolhesse as cinco melhores canções dos A Tribe Called Quest. Uma das selecionadas foi “Check The Rhime”, do clássico “The Low End Theory”, de 1991. Dizia Phife Dawg que este era um dos melhores exemplos da dinâmica que o juntava a Q-Tip, uma das características fundamentais para tornar a música dos A Tribe Called Quest única.

Mas essa mesma cumplicidade foi a mesma que acabou por gerar alguns confrontos entre egos, como os que surgiram exatamente entre os dois MCs. Ambos com carreiras em nome próprio construídas após o fim do grupo, ambas alimentadas (em parte) pelas divergências que motivaram essa separação. Em 2000, Phif Dawg lançou o único álbum a solo que gravou, “Ventilation: Da LP”, que teve em “Ben Dova” um dos seus singles de maior projeção:

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https://www.youtube.com/watch?v=bf6jjuCulMI

O documentário “Beats, Rhymes & Life” foi lançado em 2011 e é ainda um dos melhores documentos para compreender de onde vieram os A Tribe Called Quest (que pouco depois de terem o primeiro álbum pronto se tornavam um trio, após a saída de Jarobi White) e até onde chegaram, o que fizeram depois da separação do grupo e como a reunião, ou melhor, as diferentes reuniões se tornaram inevitáveis (e, em certa medida, insustentáveis a longo prazo). Como é que construíram uma linguagem tão revolucionária — com base no uso de samples e no recurso à história da música negra americana como até aí ainda não tinha sido concretizado com tamanha dimensão no percurso do hip hop. Com gente como os Jungle Brothers ou os De La Soul, os A Tribe Called Quest formaram o movimento Native Tongues, que seguia estes princípios criativos e lhes dava uma noção de afrocentrismo, fundamental na música, nas letras e na postura.

Phife Dawg era, inevitavelmente, um dos protagonistas do filme. E era também um dos responsáveis pelas esporádicas reuniões do grupo, entre 2006 e 2015, para concertos e eventuais colaborações. Entre o início grupo e as últimas atuações ao vivo, a ideia era sempre a mesma, e quase sempre defendida por Dawg: fazer hip hop como mais ninguém fazia, construir um caminho único e fugir a repetições.

Ainda há poucos meses, numa entrevista que deu à Rolling Stone, Phife Dawg dizia: “Estou bem, mas tenho dias bons e dias maus. Mas estou mais ou menos numa boa situação, por isso não me posso queixar.” Há já vários anos que o músico — de nome verdadeiro Malik Taylor — lidava com complicações relacionadas com a diabetes. Em 2008 fez um transplante renal mas os problemas de saúde, permanentes, dificultaram sempre a continuidade de uma vida artística regular e produtiva, pelo menos tão produtiva como o músico desejava. Entre os planos que tinha para o futuro mais próximo, Malik “Phife Dawg” Taylor trabalhava num EP com o título “Give Thanks” e num novo álbum de temas originais, “Muttymorphosis”, que apresentou como a sua “história de vida” e que queria lançar até ao final deste ano.