Uma medida controversa. O PCP está a pressionar o Governo socialista a avançar com o aumento extraordinário de todas as pensões em dez euros em 2017, o que representaria, como assumiram os comunistas ao DN, uma despesa na ordem dos 400 milhões de euros. A proposta, no entanto, não é unânime: entre os especialistas ouvidos pelo Observador, há quem alerte para a falta de equidade da medida e para o impacto perigoso nas contas públicas. Eugénio Rosa, ex-deputado comunista e economista da CGTP, contrapõe e fala numa questão de justiça.

Esta discussão faz-se mesmo entre os partidos mais à esquerda do PS. Os bloquistas também querem um aumento de dez euros, mas só para as pensões mais baixas. “Nós não tratamos pensões altas da mesma forma como tratamos pensões mais baixas. É uma questão de justiça e achamos do ponto de vista das pensões até aos 600 e poucos euros que precisam de ter um aumento real e 10 euros parece-nos um valor adequado”, clarificou Catarina Martins, quando confrontada com a proposta comunista.

As declarações de Catarina Martins não caíram bem junto do lado comunista. O site Abril Abril, próximo do PCP, dá mesmo destaque à consonância de posições entre Bloco de Esquerda, PSD e CDS “na prioridade absoluta dada às pensões mais baixas”. A frase “Bloco contra aumento de pensões acima dos 628 euros” serve de título ao artigo.

Para Jerónimo, de resto, a ideia de atualizar as reformas mais baixas é “curta e bastante limitada”. “Há que valorizar pensões, reformas de 600, 800 euros… Os saldos atuais da Segurança Social permitem uma visão mais aberta sobre essa proposta”, defendeu o líder comunista em entrevista ao DN/TSF.

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O debate estende-se também às centrais sindicais. Carlos Silva, da UGT, em declarações à TSF, defendeu a atualização de todas as pensões, mas deixou claro que tem de haver “proporcionalidade”. Depois, “a partir de um determinado teto podemos negociar em sede de Concertação Social, se o Governo estiver interessado, para perceber qual é o impacto nas contas no Orçamento da Segurança Social”, salvaguardou o dirigente sindical. Já Arménio Carlos, da CGTP, subscreveu na íntegra a proposta do líder comunista e afastou qualquer tipo de injustiça na medida.

Pedro Adão e Silva, ex-dirigente nacional do PS e ex-assessor governamental na área da Segurança Social, discorda da proposta defendida por Jerónimo de Sousa. “Não concordo com subidas indiferenciadas das pensões”, assume, em declarações ao Observador.

Para o coautor do livro Os Mitos do Estado Social Português, uma atualização dessa natureza traduzir-se-ia no reforço de desigualdades dentro do próprio sistema. Um aumento de dez euros teria um impacto consideravelmente diferente em reformados com pensões mais baixas e em reformados com pensões mais altas.

Além disso, para Pedro Adão e Silva, o argumento invocado por Jerónimo de Sousa — de que os saldos atuais da Segurança Social permitem acomodar uma proposta desta natureza — limita a discussão. Até porque, para esse saldo da Segurança Social, contribuem também as transferências do Orçamento do Estado.

Esse é um argumento repetido por outros especialistas ouvidos pelo Observador, sobretudo entre as bancadas mais à direita do Parlamento. Em abril de 2016, referindo-se aos dados de 2015, o Conselho das Finanças Públicas deixava o alerta: as receitas próprias da Segurança Social ainda não chegam para suportar as despesas. As transferências do Orçamento do Estado, analisava a mesma entidade, permitiram o resultado positivo atingido em 2015 — sobraram mais de mil milhões de euros –, mas destes, quase 900 milhões foram conseguidos canalizando, de forma extraordinária, outras receitas para este setor.

Depois há outros dois fatores que devem ser tidos em conta: o Governo não pode hipotecar o futuro da Segurança Social através de um aumento generalizado das pensões que não acompanha a evolução dos níveis de produtividade do país e da inflação, salvaguarda uma fonte dos partidos mais à direita. É um erro estratégico.

Eugénio Rosa, economista da CGTP e autor do livro Como Garantir a Sustentabilidade da Segurança Social e da CGA, tenta desmontar estes argumentos. “Até agosto, e de acordo com a execução orçamental, a Segurança Social apresentou um excedente de 1028 milhões de euros. 398 milhões, retirando a transferência do Orçamento do Estado”, sublinha, em declarações ao Observador. Para o ex-deputado comunista, tal representa uma “situação de recuperação” que deve ser assinalada.

Mais, observa o economista: “As receitas da Segurança Social estão a crescer” e “a previsão de um certo crescimento exponencial de pensionistas não está a verificar-se”. Não ao ritmo que chegou a ser teorizado, pelo menos.

Além disso, continua, à “exceção das pensões mínimas do 1º escalão”, as restantes pensões “não tiveram qualquer aumento desde 2010”. Esta proposta agora defendida pelo PCP permitiria “distribuir igualmente um valor que não é muito elevado” e repor alguma justiça. Uma atualização desta natureza, sublinha Eugénio Rosa, significaria “um aumento médio de 2,7% e beneficiava todos os 2,9 milhões de reformados”, sobretudo “os escalões mais baixos, que são a maioria”.

Sobre a sustentabilidade da Segurança Social, Eugénio Rosa coloca a discussão ao contrário: “O problema do envelhecimento da população só se vai colocar a médio longo prazo”. As principais batalhas, insiste, passam por combater a destruição de emprego, primeiro, e alterar as fontes de financiamento da Segurança Social, “muito apoiadas na contribuição dos salários”. Como? Por exemplo, através da “alteração do cálculo das contribuições patronais”, obrigando “as grandes empresas a contribuírem mais para a Segurança Social”.

Na entrevista que deu ao DN/TSF, Jerónimo de Sousa garantiu que Vieira da Silva, ministro da Segurança Social, estava a “considerar a proposta”. Mas António Costa, até ver, só admitiu um “aumento justo” das pensões. O debate está lançado.