A Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT) instaurou 124 autos de notícia nas inspeções feitas à PT/Meo, tendo recolhido, designadamente, “evidências da existência de situações de assédio” aos trabalhadores.

Segundo os resultados das ações inspetivas levadas a cabo pela ACT na PT/Meo, entre janeiro e julho deste ano, a que a Lusa teve acesso, “o valor mínimo total da moldura da coima associado às infrações objeto de auto de notícia é de 1.574.861,75 euros” e o valor máximo é de 4.844.974,25 euros.

No decorrer das inspeções, foi “sinalizada a existência de comportamentos repetidos, indesejados e humilhantes com potencial para causar danos na integridade moral da pessoa visada” e foram recolhidas “evidências da existência de situações de assédio”, tendo sido instaurados processos de contraordenação.

A ACT afirma também ter constatado “factualidade que deu origem a processos de contraordenação relativamente a violação de disposições constantes de Instrumentos de Regulamentação Coletiva de Trabalho; falta de pagamento pontual de retribuições; reintegração de trabalhador após despedimento ilícito; vigilância da saúde no trabalho; mobilidade funcional; compensação e descontos na retribuição; registo de pessoal; mapa de horário de trabalho”.

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Relativamente à transmissão dos contratos de trabalho da PT/Meo para outras empresas, a ACT refere que “analisou, caso a caso, a posição de todos os trabalhadores abrangidos, não tendo reunido matéria de facto, no período em referência, que permita sustentar, em termos contraordenacionais, a não transmissão da posição do empregador nos contratos de trabalho dos trabalhadores abrangidos”.

A ACT refere, a este propósito, que, “em caso de transmissão de estabelecimento, os trabalhadores devem ser informados e consultados, pela empresa transmitente e pela empresa adquirente, sobre data e motivos da transmissão; consequências jurídicas, económicas e sociais para os trabalhadores; medidas projetas em relação a estes”.

A ACT constatou, contudo, que “as empresas adquirentes não deram cumprimento integral a estas obrigações previstas […] no Código do Trabalho, pelo que foram objeto de competente procedimento contraordenacional, cujo valor mínimo e máximo total da moldura da coima associada às infrações é de 4.080,00 euros e 6.528,00 euros, respetivamente”.

A autoridade refere, ainda, que a “apreciação da questão de saber se, no caso, a transmissão de estabelecimento, com os circunstancialismos em que foi efetuada, ofende preceitos legais imperativos ou evidencia que tenha havido uma ‘manobra de fraude à lei’ – e desde logo às regras que regulam o despedimento – é competência judicial”.

Assim, “a considerar-se, em sede judicial, a inaplicabilidade do instituto da transmissão de estabelecimento […] é ao tribunal judicial que compete declarar e determinar as consequências jurídicas, designadamente, na esfera profissional, dos trabalhadores abrangidos”, cabendo ao trabalhador “o respetivo impulso processual”.

As preocupações com a situação laboral da operadora de telecomunicações passam pelas cerca de 1.400 rescisões contratuais em dois anos, pelos cerca de 300 trabalhadores que ficaram sem funções, a que se junta a mudança de mais de 150 funcionários para empresas do grupo da multinacional de comunicações e conteúdos Altice, que detém a PT Portugal, recorrendo à figura de transmissão de estabelecimento.

Bloco de Esquerda: Portugal não pode ser “uma República das bananas”

Perante as conclusões do relatório da ACT, o Bloco de Esquerda veio pedir ao Governo que retire as devidas consequências e aja em consonância. Para os bloquistas, de resto, o relatório confirma que a empresa atua no país “como se Portugal fosse um faroeste laboral”.

“Confirma-se com este relatório que a Altice está a atuar na PT como se Portugal fosse um faroeste laboral. Ora Portugal tem regras e o que a ACT veio dizer é que existe uma legislação laboral que não está a ser cumprida pela Altice e portanto o Governo deve retirar as devidas consequências e agir em consonância”, afirmou o deputado do Bloco de Esquerda José Soeiro, em declarações aos jornalistas à margem da rentrée política bloquista, o Fórum Socialismo 2017.

Para além das contraordenações, na opinião do BE, “é preciso garantir que a Altice reverte as decisões que tomou, que corrige aquilo que fez”, sendo preciso “uma ação que seja capaz de salvar a empresa deste desmantelamento”. “O Governo também está em posse desta informação para poder atuar”, sublinhou.

A questão da “transmissão de estabelecimento” fica por resolver porque “tem uma dimensão legal que tem que ser dirimida nos tribunais”, para além de uma “dimensão política”.

“O Bloco de Esquerda já apresentou um projeto para blindar a lei a utilizações fraudulentas e para reforçar os direitos dos trabalhadores. Entendemos que o parlamento, assim que reabram os trabalhos parlamentares, deve voltar a este tema”, defendeu ainda.

Na opinião de José Soeiro, este relatório da ACT é “muito importante” e “confirma que a Altice desde que tomou conta da PT tem utilizado uma política de terra queimada contra os trabalhadores”.

Em declarações aos jornalistas, à margem da visita ao Pavilhão de Feiras e Exposições de Penafiel, e desafiado a comentar o relatório da ACT, Pedro Passos Coelho sublinhou a importância desta ação inspetiva e lançou-se a António Costa, que em pleno debate quinzenal, na Assembleia da República, tecera duras críticas à empresa agora detida pela Altice. Para o líder social-democrata “essa não era a forma adequada de atuar” e que o assunto deve estar reservado para as autoridades que têm competências nessa matéria.

O relatório confirma assim, segundo o deputado do Bloco de Esquerda, “perseguição, humilhação, assédio moral, esvaziamento de funções, falta de retribuição e todo o tipo de chantagens”. “O que a ACT propõe são contraordenações pesadas que poderão ir até aos 4,8 milhões de euros”, destacou, considerando por isso que “a empresa tem que entender que não está acima da lei e que Portugal não é uma República das Bananas”, afirmou o deputado bloquista.