“Na segunda-feira de manhã, foi aí que aconteceu tudo”. Antes de ser presa preventivamente, Rosa Grilo optou por não se remeter ao silêncio a que tinha direito e respondeu ao interrogatório da juíza de instrução Andreira Valadas. Durante várias horas, a viúva relatou ao pormenor a sua versão dos factos: o marido, o triatleta Luís Grilo, teria sido assassinado por três homens, na própria casa e à sua frente.

Rosa Grilo está presa preventivamente desde 29 de setembro e, desde aí, tem vindo a divulgar — por cartas enviadas a meios de comunicação ou entrevistas na hora da visita — essa mesma versão. Mas o Correio da Manhã teve acesso às declarações de Rosa Grilo no interior do Tribunal de Vila Franca de Xira — que terá sido uma das primeiras vezes, senão a primeira, que a suspeita contou a história do homicídio do marido.

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A viúva recorda que por volta das 8h00 daquela segunda-feira, 16 de julho, alguém lhe bateu à porta de casa, onde estava com o marido, Luís Grilo. “Até pensei que fosse o padeiro. Ele costuma-me deixar o pão de manhã”, explicou à juíza, conforme se ouve na gravação da CMTV, acrescentando: “Quando fui abrir a porta, empurram-me a porta e entram três fulanos. Entretanto, assim que entraram, taparam-me a boca”. Por aquela altura, segundo ela, o triatleta ainda estaria deitado e não terá ouvido a porta. “Onde é que ele está?”, ter-lhe-ão então perguntado.

E quando fui abrir a porta… Empurram-me a porta e entram três fulanos. Entretanto, assim que entraram, taparam-me a boca. Luís estava ainda deitado, acho que ele nem ouviu sequer a porta. E os fulanos entraram, taparam-me a boca e agarraram-me assim o cabelo”, relatou à juíza.

Questionada pela juíza de instrução Andreira Valadas, Rosa Grilo descreveu os três homens que terão entrado em casa: um “branco” e “dois indivíduos, um mais mais negro e outro mais clarinho”. O “branco”, como descreve nas gravações divulgadas pelo Correio da Manhã, era “mais ou menos” da sua altura e teria “cinquenta e muitos anos”. Os outros dois “eram bem mais constituídos e mais altos” e “deviam estar aí na casa dos vinte e tal, trinta” anos. “Havia um assim mais escuro que tinha o cabelo tipicamente africano assim curtinho e tinha assim uma barbicha”, detalha mesmo a suspeita, que dá aliás muitos pormenores em todo o interrogatório agora divulgado.

Entretanto, entretanto, o Luís ouviu a agitação e desceu. Pronto… Entretanto, a partir daí, foi tudo muito confuso porque eles passaram a agarrá-lo, a bater-lhe e a baterem em mim. E ele… O senhor, o branco, o que era branco, começou a agredir o Luís, mandou-o para o chão, começou a dar-lhe pontapés nas costelas“, conta Rosa.

“Onde é que estão as minhas coisas? Onde é que está aquilo que tu me deves?”, terão perguntado os homens. Luís Grilo terá permanecido em silêncio. “Ó Luís, fala! Diz-lhe!”, terá pedido a mulher. Mas o triatleta terá permanecido em silêncio, levando Rosa a tomar uma atitude:

— Eu sei onde é que estão! — diz a viúva que disse aos assaltantes.

— Não, não digas! — ter-lhe-á pedido o triatleta.

— Eu sei onde estão — terá insistido Rosa ao ver o marido a ser agredido.

— Então vens connosco e vais-nos dizer onde está — terá respondido um dos três homens.

Rosa, ainda “de pijama”, como relata nas gravações divulgadas pelo Correio da Manhã, terá ido com “os dois rapazes de cor” à casa da sua avós, em Benavila — perto do local onde o corpo do triatleta viria a ser encontrado no final de agosto. O terceiro elemento terá ficado com Luís, na vivenda do casal.

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A viúva terá entrado no carro dos “três fulanos”, que pensa que seria “um Volvo porque o carro era assim daqueles longos tipo monovolume”. Rosa Grilo vai fazendo pausas  — e explicando: “Estava a tentar lembrar-me” — enquanto relata à juíza de instrução Andreia Valadas todos os pormenores da sua versão: que os “vidros de trás do carro eram escuros” e que “os da frente não eram”; que o carro “estava estacionado” em frente ao “portãozinho” da casa; que entrou para “o banco de trás”; que foi a maior parte do tempo “deitada no banco traseiro”; que o “senhor mais escuro” foi a conduzir e, até, que “as portas estavam trancadas” — justificação que dá à juíza quando esta pergunta porque é que não tentou sair do carro. “Sei porque experimentei”, sublinha.

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Rosa Grilo conta ainda que, quando chegaram à casa da avó em Benavila, terá indicado aos dois homens o roupeiro onde tinha posto “o saquinho daqueles diamantes que ele [Luís Grilo] tinha trazido já há muitos anos, dentro de uma coisinha daquelas de cheiro”. Mas os diamantes não estariam lá, segundo diz nas gravações divulgadas pelo Correio da Manhã, e, por isso, foi agredida pelos dois homens.

Não sei se porventura alguém terá mexido ou terá caído para outro lado ou se o Luís terá tirado para o outro lado. Mas eu não encontrei onde estava. No sítio onde estava não encontrei. Entretanto, demos volta a tudo, eles reviraram tudo”, conta Rosa.

A viúva detalha que terá levado a sua mala consigo porque inicialmente não sabia das chaves da casa de Benavila. Os homens ter-lhe-ão dito para levar a mala pois as chaves estariam lá dentro. Na mala, estaria também o telemóvel do marido, que acabou por transportar sem planear fazê-lo. “Levei, levei. Levei-o na mala”, diz, quando questionada pela juíza de instrução.

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A juíza pergunta-lhe depois que horas eram quando voltou à casa onde estava o marido. Rosa explica que perdeu a noção do tempo mas deviam ser umas 16h00 ou 17h00 horas — “ainda era de dia ” — quando Luís terá sido atingido com o primeiro tiro. Antes, os três homens terão remexido a casa em busca dos diamantes. Nesse momento, segundo Rosa, os homens terão perguntado pelo “miúdo”, o filho do casal, Renato. “E eu feita burra disse que o miúdo vinha mais tarde com a avó“, conta, acrescentando que os homens terão dito: “Então, vamos esperar”. 

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Com medo que fizessem alguma coisa ao filho, Luís terá dito que os diamantes estavam “lá em baixo no armário da garagem” — “onde estava a arma”, acrescenta Rosa. A arma, como a viúva explicou numa entrevista à SIC, será a de António Félix Joaquim — também ele em prisão preventiva por suspeitas de ter sido o coautor da morte de Luís Grilo — com quem tinha uma “amizade colorida”, desde 2016, embora o conhecesse desde que eram crianças. Rosa diz que andava assustada com ameaças que o marido andava a receber e admite que, por isso, roubou a arma da casa de António Félix Joaquim, sem que este soubesse. Nas gravações do interrogatório, até agora divulgadas pela CMTV, Rosa não dá mais pormenores sobre a arma.

Mas a viúva conta ao pormenor o assassinato do marido, segundo a sua versão. Primeiro o momento em que foi atingido com o primeiro tiro: “O Luís ficou ainda a respirar durante algum tempo”, recorda, sendo interrompida pela juíza Andreia Valadas:

— Então e nenhum vizinho ouviu nenhum disparo?

— Não sei, não sei.

— Mas um tiro é uma coisa que se ouve.

— Mas não foi só um… Eles deram dois tiros.

Rosa Grilo explica então que o marido terá sido atingido com um primeiro tiro na cabeça que ainda o deixou a respirar. “Caiu para cima de mim”, diz a viúva, acrescentando:

Ficou ali durante bastante tempo. Entretanto, o outro parece que ainda ficou mais danado, agarrou-o e deu-lhe outro tiro assim aqui de lado”, conta Rosa, já se lhe notando a voz trémula.

Questionada, a viúva explica, admitindo que não tem certeza, que o marido terá sido atingido “por cima da orelha”. “Claro que eu entretanto entrei em pânico”, conta nas gravações a que o Correio da Manhã teve acesso.

Rosa Grilo e António Joaquim foram detidos no dia 29 de setembro, por suspeitas de serem os autores do homicídio de Luís Grilo. De acordo com a investigação da PJ, o triatleta terá sido morto a 15 de julho. No dia seguinte, a mulher deu conta do desaparecimento às autoridades, alegando que a vítima tinha saído para fazer um treino de bicicleta e não tinha regressado a casa. O corpo acabou por ser encontrado já no final de agosto, com sinais de grande violência, a mais de 100 quilómetros da aldeia onde o casal vivia.