O terramoto de magnitude 2,4 na escala de Richter registado esta madrugada junto à Torre de Moncorvo teve origem na mesma falha tectónica onde, em 1986, houve uma crise sísmica que durou quase um mês, recordou ao Observador o investigador independente José Ribeiro. O abalo foi registado na falha da Vilariça, uma estrutura com 250 quilómetros que vai desde Manteigas (distrito de Guarda) até Bragança. Essa falha não é muito ativa e os terramotos que provoca não são fortes. Apesar disso, é “bastante frequente” que se repitam no tempo, descreve José Ribeiro. Foi o que aconteceu há 32 anos nesse mesmo lugar. E é o que está a acontecer agora — embora não seja uma dessas crises.

O sismo que atingiu o norte do país às duas da manhã de Portugal Continental aconteceu a oito quilómetros da Torre de Moncorvo, perto de Vila Nova de Foz Côa e em cima da falha da Vilariça. Nesse troço da falha, “é bastante frequente uma repetição de sismos durante dias, semanas ou mesmo meses”, explica José Ribeiro, que faz investigação na área da sismologia com Ana Isabel Ribeiro, investigadora da Universidade do Porto, e Ana Paula Correia, docente na Escola Secundária Henrique Medina em Esposende.

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Sismo de 2,4 sentido em Torre de Moncorvo

Ora, quando vários sismos acontecem num intervalo de tempo curto e todos associados ao mesmo local da superfície terrestre podemos estar perante uma crise sísmica — como aconteceu nos Açores no início do ano. Segundo José Ribeiro, uma crise acontece quando há “uma sucessão de sismos no mesmo local durante um determinado intervalo de tempo”, mas esse é um conceito que “depende sempre da sismicidade considerada normal em cada zona”.

Foi o que aconteceu em 1986, quando os distritos de Viseu, Guarda, Vila Real, Bragança e o Grande Porto foram atingidos por uma série de sismos pouco intervalados entre si. Entre 26 de julho e 20 de agosto desse ano foram registados nove terramotos na mesma zona, cinco dos quais foram sentidos pela população e todos eles associados à falha da Vilariça. O maior aconteceu às 15h12 de 10 de agosto de 1986, começou na mesma região que o terramoto deste sábado e foi sentido no Porto, a 100 quilómetros dali. Não houve vítimas, mas causou “pequenos dados” junto ao epicentro.

Agora não estamos perante uma crise sísmica, mas a falha da Vilariça também está a provocar uma série de sismos que se repetem desde fevereiro do ano passado, mas que não representam perigo porque têm magnitude baixa. “O sismo desta noite também vem na sequência de vários outros, nenhum de magnitude superior a 3. Este é o sexto sismo sentido pelas pessoas desde essa altura, mas vários outros só foram registados pelos sismógrafos, conta o investigador. Esses abalos têm acontecido aos pares, por isso “não seria de espantar que houvesse outro hoje mesmo ou daqui a um ou dos dias”, afirma José Ribeiro.

Além do sismo que foi registado à 01h54 este sábado, dois aconteceram em julho deste ano (dia 13 às 20h43 e dia 16 às 00h09), outros dois foi registados em agosto de 2017 (ambos dia 3, um às 10h17 e outro às 15h57) e um em fevereiro de 2017 (dia 28 às 20h57). No mês de julho, no entanto, um fenómeno foi diferente: entre dia 13 e dia 18 foram registados seis pequenos abalos sísmicos — apesar de apenas dois terem sido sentidos pela população. Ainda assim, segundo o Instituto Português do Mar e da Atmosfera, os dados não indicam que estamos perante uma crise sísmica neste momento.

O que está por trás dos 300 sismos dos Açores esta madrugada

O país já assistiu a uma crise sísmica em fevereiro deste ano nos Açores, quando mais de 300 sismos foram registados na mesma falha tectónica que, em 1522, originou um terramoto catastrófico que destruiu quase toda a população de Vila Franca do Campo, alterou completamente a ocupação da ilha de São Miguel e originou um tsunami, explicou na altura ao Observador Miguel Miranda, presidente do Instituto Português do Mar e da Atmosfera.

Nos Açores, as crises sísmicas não são estranhas, sublinhou ele: “A atividade sísmica não é homogénea e não acontece em intervalos regulares de tempo. Muitas vezes agrupam-se no tempo e no espaço”, explicou. Foi isso que aconteceu nos Açores, um arquipélago tão habituado à elevada atividade sísmica que o mapa sísmico do IPMA nem sequer tem representados os terramotos de magnitude inferior a 2,0 na escala de Richter por lá.