Marco Silva não teve propriamente um início muito fácil no Everton, somando apenas uma vitória nos primeiros seis encontros na Premier League (na receção ao Southampton). O problema nem era propriamente a qualidade de jogo, que nunca chegou a ser criticada, mas sim a falta de resultados – se há clube que começa a ganhar alergia ao futebol romântico sem triunfos são os toffees, que têm vindo a investir para colocar a equipa mais próxima do primeiro lugar logo após os crónicos candidatos ao título. Com o tempo, as coisas foram mudando: Mina e Digne deram outra consistência à frente da baliza de Pickford, André Gomes subiu e muito de rendimento após lesão, Bernard tem ganho outro protagonismo no apoio a Richarlison. E as vitórias lá começaram a aparecer, cinco nos últimos sete jogos do Campeonato. A equipa estabilizou processos e subiu a pique.

Na antevisão do dérbi de Merseyside, Jürgen Klopp, treinador do Liverpool, destacou que, desde que chegou a Anfiel Road, “este é o melhor plantel do Everton”. “Há dois anos eles contrataram o Rooney e o Sigurdsson, mas agora têm velocidade, criatividade e organização. O Coleman está em boa forma, Mina é um jogador brilhante e o Digne é um Baines mais novo. E depois têm o titular da baliza de Inglaterra. É uma equipa em condições, que teria lugar em todas as ligas da Europa. As melhorias são evidentes”, referiu o técnico alemão, apostado em vencer para apagar a derrota frente ao PSG a meio da semana e poder continuar na sombra do líder Manchester City na Premier League. Mas o Everton tinha uma palavra a dizer no dérbi. No plano coletivo e individual – nos dois jogos anteriores em Inglaterra, Marco Silva ganhara um e empatara outro com Klopp.

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Esta semana, a imprensa inglesa quis aprofundar outros pontos que mudaram nos toffes com o treinador português que passara pelo Watford, nomeadamente as novas “regras”. E ainda foram algumas: sendo o primeiro a chegar a Finch Farm, onde a equipa tem o seu centro de treinos, não deixa ninguém ver os seus treinos e promove o espírito de grupo com jantares convívio onde, por exemplo, Mina e Digne tiveram de arriscar uma aventura (que, por quem lá esteve, não correu nada bem…) no karaoke. Ao mesmo tempo, as refeições passaram a ser feitas também em conjunto, havendo multas para o uso do telemóvel. Os segredos das melhorias em campo também estão muitas vezes relacionadas com o que se passa fora dele.

Apesar do natural favoritismo teórico do Liverpool, foi ao Everton que pertenceu a primeira grande oportunidade do jogo e logo aos quatro minutos, quando Digne bateu em arco um livre lateral na esquerda e Yerry Mina desviou de cabeça muito perto do poste. No entanto, os visitados foram conseguindo “empurrar” o rival para o seu meio-campo, sempre com Salah em foco no ataque, a tentar o remate ou a assistir, como aconteceu com Mané que desperdiçou uma chance clara aos 12′. Os comandados de Klopp iam conseguindo colocar o jogo onde queriam, tentando encontrar espaço para a velocidade e virtuosismo das unidades da frente. Em contrapartida, os toffees procuravam defender em bloco para sair rápido para o ataque e foi numa dessas investidas que Alisson fez a defesa da tarde/noite a cabeceamento de André Gomes na pequena área (20′), antes de um corte em cima da linha de golo por Gómez quando o ressalto de bola seguia para a baliza do brasileiro.

Até ao intervalo, Shaquiri, também ele isolado pelo inevitável Salah, permitiu a Pickford fazer a “mancha” quando estava isolado na área; no seguimento do canto, Theo Walcott explorou a profundidade nas costas da defesa dos reds, fintou Alisson mas um ligeiro toque na bola quando o internacional inglês se preparava para o toque final acabou por desfazer o lance. Apesar de ter menos posse e estar atrás em quase todos os parâmetros de jogo, o Everton conseguia equilibrar o encontro frente ao Liverpool tal como acontecera há três semanas em Stamford Bridge, com o Chelsea (0-0). Mas a segunda parte seria diferente.

Com uma outra dinâmica no último terço, subidas mais frequentes do lateral Arnold e maior capacidade de pressão em zonas mais altas, os comandados de Klopp foram somando oportunidades no primeiro quarto de hora após o intervalo, com Salah (48′) e Sané (53′ e 59′) a falharem por muito pouco o alvo em iniciativas que colocaram em sentido o Everton, então incapaz de esticar jogo como acontecera na metade inicial. Insistiu, insistiu e voltou a insistir mais um pouco, sempre sem resultados. Com o passar dos minutos e a entrada de Lookman para o lugar de Walcott, o encontro voltou a abrir e Bernard criou perigo (66′). Nem as substituições de Klopp, lançando Keita e Sturridge, surtiram efeito e era o Everton que começava a controlar melhor. Assim foi, até aos descontos. Aí, o mais do que improvável aconteceu e o Liverpool chegou ao triunfo.

Na última bola do jogo, os reds arriscaram o “chuveirinho” para a área contrária e, numa insistência, Van Dijk tentou um remate que saiu uma verdadeira rosca. Foi de tal forma que o próprio holandês, quando a bola caía na zona da baliza do Everton, já tinha virado as costas à jogada, chateado consigo mesmo pelo remate despropositado. Mal sabia ele que dali estava a nascer um passe para golo: Pickford, que podia apenas ter tocado a bola para canto, quis agarrar ao pé da trave, a bola voltou a saltitar na trave e Origi, que minutos antes na pequena área tinha acertado na trave, teve o prémio de ser o único a acreditar que seria possível aquele lance ainda dar alguma coisa, empurrando aos 90+6′ para a baliza deserta e dando a vitória ao Liverpool. Klopp invadiu o relvado nos festejos, Marco Silva não foi capaz de esconder a frustração, Pickford acabaria por fazer um sinal a pedir desculpa aos muitos adeptos dos toffees presentes. Mas o herói foi mesmo Origi, que ouviu de novo Anfield Road cantar o seu nome ao recolocar a equipa a apenas dois pontos do líder Manchester City.