Então e o que é o almoço? “Lombo de porco assado com salada e arroz branco”, responde prontamente um dos empregados de mesa. Está oficialmente aberta a época da refeição-comício, com bombos à porta e ranchos folclóricos, ambos convidados pelo presidente da terra — invariavelmente um socialista dos quatro costados — em troca de um lugar à mesa do partido e, volta e meia, ainda o alento de uma obra importante anunciada dias antes para a região. Vai ser mais ou menos assim nos próximos dias, pelo menos quando houver líder do partido em campo. E hoje houve, em Mangualde, terra 70% socialista (a contar pelas últimas autárquicas) onde António Costa foi dar o empurrão inicial ao seu cabeça de lista às Europeias Pedro Marques? Não. A Frans Timmermans, o candidato que o PS apoia à Comissão.

O candidato socialista foi esquecido pelo líder do partido no discurso do arranque da campanha oficial para o PS. Nem uma referência na intervenção inicial onde coube sobretudo o pedido para que se consiga “uma força progressista maioritária” no Parlamento Europeu. “De Tsipras a Macron vamos conseguir construir uma grande frente progressista na Europa”, clamou Costa do palco onde antes dele discursou o candidato que o PS apoia à presidência da Comissão Europeia, Frans Timmermans.

No final da intervenção o holandês chamou Costa ao palco, ambos deram as mãos perante o aplauso da sala com mais de duas mil pessoas, mas só mesmo eles os dois — Timmermans também não tinha feito qualquer referência a Pedro Marques. Costa respondeu-lhe quase na mesma moeda, e no fim do seu discurso tentou fazer pegar na mesma sala o grito “Frans, Frans, Frans” (mesmo que não tenha pegado). Atrás do líder socialista e do candidato à Comissão estava o cabeça de lista do partido, Pedro Marques.

Costa foi a Mangualde sobretudo para posicionar o partido no contexto europeu: “O partido que nasceu na clandestinidade e na luta contra a ditadura” mas que não diz que “é tudo mau na Europa. Estamos agradecidos por tudo o que têm feito por Portugal” porque “mostramos que na Europa não estamos de braços cruzados”. Costa lembrou também a “capacidade de fazer amigos” dos portugueses — e a sua em particular, recordando a “geringonça” que construiu em 2015.

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António Costa, Pedro Marques e Frans Timmerman à chegada ao almoço comício em Mangualde ANDRÉ DIAS NOBRE / OBSERVADOR

António Costa, Pedro Marques e Frans Timmermans à chegada ao almoço comício em Mangualde
ANDRÉ DIAS NOBRE / OBSERVADOR

“Quando há três anos diziam que não conseguíamos construir uma solução política estável em Portugal, provámos que conseguimos. Conseguimos em Portugal e vamos conseguir na Europa construir uma grande frente progressista e ainda vamos ver Frans Timmermans como presidente da Comissão”, afirmou defendendo como objetivo derrotar Manfred Weber, o candidato à Comissão apoiado pelo  PSD e CDS. “Nunca perdoaremos quem por cima do jugo da austeridade nos quis castigar. Não vamos permitir que Weber seja presidente da Comissão”, atirou.

Aqui em sintonia com o seu cabeça de lista que tinha falado antes a lembrar o momento em que Weber defendeu “sanções em força máxima” para Portugal. Pedro Marques centrou sobretudo o seu ataque a Paulo Rangel, o “deputado fake, que fez um relatório e em dez anos não lhe conhecemos nenhum trabalho relevante para Portugal, uma medida que tenha melhorado a vida dos portugueses”. Depois também pediu “força para estas eleições e para o PS”, mas o aplauso que se seguiu a este apelo foi tudo menos enérgico.

E o candidato nem se pode queixar do aquecimento deste almoço-comício. É certo que, por aquela altura, já passava das duas da tarde e os estômagos continuavam vazios, mas antes dele tinha falado Jorge Coelho, o “mangualdense” e para sempre “homem da máquina socialista” a quem nunca sobram décibeis na escala de intensidade sonora. Num discurso consegue a proeza de se ligar do coração às gentes da terra, ao autarca da terra, ao candidato do PS às Europeias, à secretária-geral adjunta e, claro ao “amigo” líder socialista. Lembra-se de Pedro Marques “desde o tempo em que se candidatava pelo Montijo” ele era o cabeça de lista pelo PS em Setúbal “também ao lado da Ana Catarina Mendes, a secretária-geral adjunta”.

Depois outra proeza: pôr benfiquistas e sportinguistas num fim de campeonato a aplaudirem em conjunto. Num ataque a Paulo Rangel e ao seu argumento de que a lista do PS é pior do que a do PSD, Coelho falou nos seus dois netos benfiquistas que o tentam convencer a mudar de clube: “Ó avô o porque é que és do Sporting? O Sporting não presta. Parece isto, a minha equipa é melhor que a tua, a minha lista é que é boa, a tua não presta. Um conceito completamente infantil, ridículo e impróprio de alguém que é cabeça de lista de um grande partido como é o PSD”. Cada vez que referia o nome de um dos clubes a sala reagia e Coelho lá pediu um aplauso conjunto e conseguiu.

Campanha de Pedro Marques, do PS, para as eleições Europeias: Jorge Coelho fala no almoço comício em Mangualde ANDRÉ DIAS NOBRE / OBSERVADOR

O mangualdense, Jorge Coelho, a aquecer o palco do primeiro comício da campanha oficial do PS ANDRÉ DIAS NOBRE / OBSERVADOR

“A direita tem de ser punida”, pediu Coelho que considera que PSD e CDS têm de “levar uma resposta dos portugueses para que não se metam neste tipo de ação política que põe em causa o futuro do país”, disse referindo-se em concreto à questão dos professores. Aqui, o elogio principal foi para António Costa e na gestão que fez deste dossiê, ameaçando demitir-se. “É preciso ter coragem para isto! Temos um primeiro-ministro à altura da nossa história e do nosso futuro”.

Já os maiores elogios ao candidato socialista nas eleições que se disputam nesta volta, as Europeias, vieram do diretor de campanha de Pedro Marques e presidente da Câmara Municipal de Mangualde. João Azevedo é o homem que Jorge Coelho se lembra de se ter queixado de não ter conseguido “sete a zero” no número de mandatos conquistados na câmara, nas últimas autárquicas. Ao microfone disputou decibéis com o histórico socialista e elogiou o seu candidato pela requalificação do IP3: “Uma realidade de facto que só foi possível porque temos o primeiro-ministro que aqui está e o ex-ministro das obras públicas Pedro Marques. Quiseram esta solução, conseguiram resolver o problema para a região”, declarou o autarca João Azevedo. A obra de requalificação foi, no entanto, anunciada há quatro dias no Parlamento pelo deputado socialista Pedro Coimbra.

Pedro Marques, António Costa e Frans Timmermans a ouvirem os ranchos folclóricos à chegada ANDRÉ DIAS NOBRE / OBSERVADOR

Jorge Coelho passou quase ao diretor de campanha de Pedro Marques a sua faixa de “homem da máquina”, chamando-lhe “máquina de combate político”. De facto, na iniciativa com que o PS arrancou com a sua campanha oficial, João Azevedo conseguiu tudo o que um catálogo de primeiro-almoço-de-campanha-eleitoral traria se existisse.

“Foi o presidente da Câmara que nos convidou. Há aqui gente que não é do PS, não fazemos diferenças”, diz um membro do Rancho de Fagilde que, pouco depois, com os outros dois ranchos que receberam António Costa à entrada do armazém, entraram na sala para almoçar. Um almoço-comício que foi uma prova de força, reclamou António Costa lembrando o distrito de outros tempos políticos: “Aos que diziam que Viseu era o cavaquistão, é aqui em Viseu que mostramos a força e energia do PS”.