Quando foram escolhidos para interpretar as personagens de Fred e George Weasley, os irrequietos e indomáveis irmãos gémeos de Ron Weasley, na adaptação para o cinema de Harry Potter, James e Oliver Phelps nunca pensaram que, quase 20 anos depois, ainda falariam sobre isso. Não que isso os incomode, muito pelo contrário — sentem-se felizes por poderem partilhar com os outros uma experiência que foi tão positiva e que ocupou tanto tempo das suas vidas.
Durante mais de dez anos, entrar em Hogwarts foi a normalidade e é dessa rotina que mais sentem falta. Porque, verdade seja dita, os irmãos nunca chegaram a abandonar totalmente o universo da saga criada por J.K. Rowling no início dos anos 90 — continuam a participar assiduamente em eventos e iniciativas com ela relacionados. É esse o caso da exposição internacional que inaugura este sábado no Parque das Nações, em Lisboa, e onde o Observador teve oportunidade de os entrevistar durante uma visita aos jornalistas, realizada esta quinta-feira. Harry Potter: A Exposição começou há dez anos em Chicago e chegou agora ao seu derradeiro destino, debaixo da Pala de Siza Vieira, junto ao Pavilhão de Portugal.
Aos 33 anos, e já sem o cabelo ruivo que caracteriza os Weasley, James e Oliver admitem que a única coisa dos tempos de Harry Potter de que não têm saudades é de passarem três horas a pintar as raízes. Ou pior — a colorir as sobrancelhas. Até porque, quando isso não é bem feito, desastres podem ocorrer, como naquela vez em que Oliver ficou sem sobrancelhas porque uma estagiária deixou a tinta durante demasiado tempo. “Durante mais ou menos uma semana, tiveram de desenhar diferentes sobrancelhas. Se estava chateado, desenhavam-nas assim”, contou ao Observador, admitindo que “foi uma lição para a vida”.
Varinhas, dragões e o Expresso de Hogwarts. A magia de “Harry Potter” chegou ao Parque das Nações
Vão ter de me ajudar: quem é que é o James e quem é que é o Oliver?
Oliver Phelps (OP): Ele é o James e eu sou o Oliver.
Quem é que decidiu quem é que ia fazer de Fred e quem é que ia fazer de George? Porque, obviamente, vocês são muito parecidos.
James Phelps (JP): Não sabemos. Durante o processo de audição, lemos os dois papéis. Antes de começar as gravações de um filme, faz-se uma coisa chamada “read-through”, em que todo o elenco lê o guião conjuntamente. Cinco minutos antes do início do “read-through” [de Harry Potter e a Pedra Filosofal], continuávamos sem saber quem é que ia ser quem. Vimos a diretora de castings, e perguntámos à Janet [Hirshenson, que trabalhou no primeiro filme]: “Então, quem é que é o Fred e quem é que é o George?”. Ela pensou que estávamos a brincar. “Muito engraçado, muito engraçado!” “Não, a sério, não sabemos quem é quem.” Ela percorreu a mesa, falou com a J.K. Rowling, com o David Heyman, o produtor, e o Chris Columbus, o realizador. Teve uma pequena conversa com eles, voltou e disse: “Bem, James, és o Fred. Oliver, és o George”. E foi assim que descobrimos. Ainda hoje não sabemos se disseram, “hm, ele pode ser ele e ele pode ser ele” ou se foi uma coisa planeada.
Costumavam brincar com isso nas gravações? Trocavam de papéis como o Fred e o George costumavam fazer?
OP: Não, nunca fomos assim tão corajosos, para ser sincero. Como se pode ver pela exposição, houve um grande cuidado com os detalhes, nos adereços e tudo isso. Houve tantas pessoas que trabalharam nisto e não queríamos ser responsáveis por terem de voltar e trabalhar até tarde porque tínhamos sido apanhados a trocar de papéis.
Portaram-se bem.
JP: Bem, até certo ponto.
O que é que isso quer dizer?
JP: Oh, bem, não trocámos de papéis, mas gostávamos de pregar partidas.
Que tipo de partidas?
JP: Coisas pequeninas. Todas as caravanas tinham televisões iguais. Certo dia, estávamos na caravana do Rupert [Grint, que fazia de Ron] e fi-lo acreditar que conseguia mudar o canal se batesse com os pés no chão e que podia alterar o volume se se aproximasse do ecrã. Coisas desse género para me manter entretido [risos].
Como é que surgiu a oportunidade de participarem nas audições? Já eram fãs da história?
OP: Sim, éramos fãs dos livros. Acho que o quarto livro [Harry Potter e o Cálice de Fogo] estava prestes a sair quando anunciaram que iam fazer uma audição aberta para todos os papéis. A minha mãe soube por uma amiga que estavam a fazer audições e perguntou-nos porque é que não íamos a uma audição para o Fred e o George. “Sim, ok, porque não?” [dissemos]. Então fomos e foi muito do género se correr bem, corre, se não correr, tudo bem. Felizmente, vimos a pessoa certa, a diretora de castings, a Janet, que o James referiu há pouco. Depois conhecemos o realizador algum tempo depois e recebemos o papel de Fred e George, tudo num espaço de seis semanas. Foi há muito tempo já, mas mudou-nos a vida.
Foi o primeiro filme onde entraram, não tinham nenhuma experiência de representação anterior. Como é que foi para vocês? Estamos a falar de uma mega produção.
JP: É engraçado, mas ainda não nos conseguimos aperceber de quão grande isto é. Acho que é porque estamos tão próximos. Conhecíamos todos os objetos da exposição antes de estarem dentro de caixas de vidro. No que diz respeito à aprendizagem, entrávamos num cenário e basicamente tínhamos todos os atores da realeza britânica ali. Sempre se mostraram muito disponíveis para nos ensinar se lhes pedíssemos, para partilhar o seu conhecimento. Como nos devíamos preparar para uma cena ou como nos devíamos sentar, onde nos devíamos colocar para que a câmara nos visse. Coisas pequenas como estas. Tivemos muita sorte por estarmos rodeados por estas pessoas e também [tivemos sorte com] a equipa técnica. Aqui é possível ver o trabalho minucioso que foi posto em todos os adereços, nos figurinos. Lembro-me de pensar que, num filme, as facas e os garfos deviam ser banais porque nunca os vemos. Mas, em Harry Potter, eles fizeram [facas e garfos para serem usados nas gravações]. Os pequenos detalhes fazem toda a diferença.
“Lembro-me de pensar que, num filme, as facas e os garfos deviam ser banais porque nunca os vemos. Mas, em Harry Potter, eles fizeram [facas e garfos para serem usados nas gravações]. Os pequenos detalhes fazem toda a diferença.”
Chegaram a conhecer a J.K. Rowling? Disseram há pouco que ela estava presente no dia do “read-through”.
OP: Estivemos com ela algumas vezes. Para ser sincero, é uma das melhores pessoas que podemos conhecer na vida. Sendo alguém que interpretou uma personagem que ela criou, ainda hoje fico muito nervoso, [a pensar se] estou a dizer a coisa certa. Foi muito boa para nós quando estivemos com ela. Não a vimos muitas vezes mas, em especial no último filme, ajudou-nos a preencher alguns espaços em branco sobre as personagens do Fred e George.
No último filme, o Fred morre.
JP: Sim, obrigado [risos].
Mas é muito triste! Como é que foi… Bem, morrer?
JP: Para mim, foi ok. Simplesmente dormi. De facto adormeci quando estávamos a filmar aquela cena. Consigo adormecer em qualquer lado e foi isso que aconteceu. O Oliver e o Rupert deixaram-me ali e foram almoçar [risos].
E, Oliver, como é que foi para ti ter de chorar a morte do teu irmão?
OP: Foi horrível, foi muito mau. Felizmente foi tudo a fingir, mas naquele dia não foi muito agradável.
Como é que olham para toda esta experiência? Tiveram de pintar o cabelo de ruivo durante mais de dez anos…
JP: As sobrancelhas. Tínhamos de pintar também as sobrancelhas.
OP: Toda a gente se esquece disso.
JP: Sim, e essa era a pior parte. Houve uma vez, que puseram a estagiária a fazer as sobrancelhas do Oliver. Era suposto [a tinta] ficar lá durante oito minutos. Ela deixou durante 12 e ele ficou sem sobrancelhas.
OP: Desapareceram.
JP: Foi muito engraçado, porque ele teve de trabalhar sem sobrancelhas.
Tiveram de as desenhar?
OP: Sim! Durante mais ou menos uma semana, tiveram de desenhar diferentes sobrancelhas. Se estava chateado, desenhavam-nas assim. Foi uma lição para a vida.
Têm saudades de ter o cabelo ruivo?
OP: Ahmm…
JP: Não!
OP: Não. Não tenho saudades do processo. Ter aquela cor de cabelo não me incomodava nada, mas todo o processo de ter de arranjar o cabelo, de ter de pintar as raízes de três em três semanas… Aprendemos estas coisas todas, sabe [risos]?
JP: Mas também aprendemos que, se repararmos que uma rapariga arranjou o cabelo, que pintou as raízes, devemos sempre elogiá-la, porque passou três horas naquilo! Sempre que pintava o cabelo, ficava à espera que me dissessem qualquer coisa.
Se houvesse a oportunidade, gostariam de voltar ao universo de Harry Potter?
OP: Acho que sim, porque é um bom ambiente, é algo com que crescemos. Acho que seria giro, porque as personagens eram tipos engraçados, não eram?
“Houve uma vez, que puseram a estagiária a fazer as sobrancelhas do Oliver. Era suposto [a tinta] ficar lá durante oito minutos. Ela deixou durante 12 e ele ficou sem sobrancelhas.”
Continuam muito envolvidos, como se vê pela vossa presença aqui.
JP: Sim, temos muita sorte. Temos esta coisa gira com as pessoas que dirigem a exposição. Gostamos muito de participar e de partilhar as nossas experiências, porque nos divertimos mesmo muito a fazer os filmes. Muitos dos membros do elenco permaneceram os mesmos ao longo dos filmes, o que foi extraordinário. Também gostamos de viajar e não só vemos a exposição, como podemos visitar as várias cidades onde ela passou. Além disso, existe um lugar secreto na exposição onde nos podemos colocar e ver as pessoas a olharem para certas coisas e isso tornou-se um bocadinho uma tradição, sobretudo nos dias de abertura. Conseguimos vê-las a abrir a boca porque estão a olhar para as coisas que cresceram a ver. Não é apenas uma exposição em que puseram coisas e depois anda-se por lá a vê-las. Dizem que é uma experiência imersiva.
Que nos faz sentir que estamos mesmo em Hogwarts e no mundo de Harry Potter.
JP: Exatamente.
OP: Tem os lugares e os cheiros.
JP: O cheiro das árvores da Floresta [Proibida]. Existe mesmo esse cheiro aqui. Não publicitam que está lá. São pequenas coisas que nos fazem sentir ainda mais envolvidos.
Olham para as gravações com saudade?
OP: De certa forma, porque era a normalidade para nós, era a nossa vida. Basicamente, era o que fazíamos. Temos saudades da rotina, desse lado. Mas com coisas como esta exposição, a tour ao estúdio, o Wizarding World na Universal Studios, é muito fácil cair nisso. O meu afilhado está muito virado para o Harry Potter. Tem seis anos e está sempre a perguntar, “tio Oliver, o que era isto?”. É muito giro explicar-lhe as coisas e ver que existe uma nova geração de fãs a surgir.
É uma das particularidades do Harry Potter — continua a ser muito popular, mesmo passados tantos anos.
JP: Sempre brincámos com isso, não foi? Quando começámos as filmagens, achávamos que estaríamos na casa dos 20 quando terminássemos e não nos 30 e ainda a falar disso. Temos muita sorte em ainda o podemos fazer.
Porque é que acham que isto acontece?
JP: Acho que são várias coisas. Primeiro, os livros e os filmes foram tão bem feitos, que são intemporais. Mesmo. Não interessa se a história se passou agora, há dez anos ou há 15 anos — são intemporais. Há sempre aquela batalha do bem contra o mal e é como uma plataforma para o mundo real. Se formos a Londres, podemos visitar muitos dos lugares que são mencionados. É uma coisa na qual a nossa imaginação pode correr livremente. Não fico surpreendido quando descubro que certas pessoas são grandes fãs do Harry Potter. Conheci jogadores de râguebi que são fãs ferrenhos, e nunca pensaríamos que o seriam. [Os fãs] podem ter quatro anos ou 94. É muito giro