O deputado e dirigente do PCP, António Filipe, disse esta sexta-feira no programa Vichyssoise, da Rádio Observador, que os comunistas não vão recorrer a qualquer “processo de obstrução regimental” para travar a eutanásia, nem no Parlamento nem com o pedido de fiscalização sucessiva de constitucionalidade — para o qual não teriam deputados suficientes. O deputado que falou em nome da bancada comunista no debate da eutanásia na quinta-feira teme que em Portugal, apesar da lei ser “restritiva”, o processo possa ser utilizado abusivamente como acontece na Holanda e na Suíça: “Não ignoramos os países que deram este passo e não nos agrada. Dizem que o que está aqui proposto não é nada disso, mas na legislação holandesa também não é nada daquilo e não é isso que acontece”.

António Filipe diz que ninguém pode garantir que a chamada “rampa deslizante” não possa ser um problema no país: “Dizem que a lei é restritiva, mas quem nos demonstra que não acontece o mesmo em Portugal?”. Sobre o facto de ter sido elogiado à direita  pelo discurso que fez sobre a eutanásia António Filipe afirmou: “Não tenho problema com isso [com elogios].” O deputado comunista lembra que este “não é um debate de esquerda e direita”, lamentando a “acusação que foi feita há dois anos, por parte do Bloco de Esquerda, de estarmos ao lado de pessoas da direita e da Igreja”. E acrescentou: “Agora também podíamos retribuir e dizer que eles estão do lado da Iniciativa Liberal, ou de Rui Rio. Este não é um debate de esquerda e direita, nem pessoas que são ou que não são religiosas”.

Sobre o facto de André Silva ter lembrado que a União Soviética foi a primeira a aprovar a eutanásia, António Filipe disse que achou curiosa a “neo-conversão do PAN ao movimento comunista internacional” e lembrou que a “União Soviética deu esse passo e depois retrocedeu”. Para o deputado do PCP, esta foi “uma forma de atacar o PCP como qualquer outra”. A divisão entre PCP e PEV nesta matéria, segundo António Filipe “desmente uma tese muito propalada de que o PEV é uma extensão do PCP”.

Quanto à regionalização, António Filipe lamenta o facto de todos estarem de “acordo com a regionalização quando a veem ao longe, mas quando se aproxima, arranjam pretextos para não a aprovar”. O deputado comunista diz “da parte do PS e do PSD não tem havido vontade política”. O PCP, lembra, defendia um calendário, mas o PSD e PS continuam sem vontade política para avançar com o processo.

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António Filipe não teme que o PCP se torne irrelevante como aconteceu noutros países. O problemas dos partidos comunistas nesses países, acredita, aconteceu porque “eles próprios se descaracterizaram”, lembrando o erro do “Partido Comunista Italiano se ter passado a chamar-se outra coisa qualquer”. António Filipe admitiu ainda que a opção da eutanásia pode ter “custos eleitorais”, mas que o PCP não cede em “questões de princípio”.

Sobre a sucessão de Jerónimo, António Filipe não se alongou, dizendo apenas que o PCP, ao contrário de outros partidos, não tem “a visão futebolística de que, quando os resultados não são bons, muda-se de treinador.” E acrescentou: “Debateremos essa questão, como fazemos sempre, quando chegarmos ao congresso”. Coloca-se, no entanto, fora da sucessão, dizendo que ser líder do PCP não está nas suas “perspetivas de vida”.

Na fase do carne ou peixe, onde tem de escolher uma das opções de resposta, António Filipe disse que, entre as duas Coreias (a do Norte e do Sul), não queria viver em nenhuma, preferia “numa Coreia unificada, onde não houvesse muro“. Sobre se preferia ver o deputado João Almeida à frente do CDS ou do Belenenses, o comunista disse que preferia ver o centrista à frente do CDS “não por ter alguma coisa contra o novo líder”, mas porque assim “João Almeida teria menos tempo para ter a tentação de voltar a liderar o Belenenses”. Disse ainda que não lhe causaria particular desgosto se o seu neto recém-nascido, Gonçalo, fosse militante do PSD ou do Bloco de Esquerda: “Isso é ele que vai escolher. Se for de um desses dois, o que haverá é muitas discussões saudáveis, certamente”.