O Banco Central Europeu (BCE) decidiu manter as taxas de juro inalteradas esta quinta-feira, quando muitos analistas previam mais uma redução, mas vai autorizar rácios de capital mais baixos por parte dos bancos e dar “descontos” nas taxas de juro cobradas em operações de financiamento (à banca) a longo prazo, numa tentativa de estimular a concessão de crédito às pequenas e médias empresas. Além disso, numa mensagem direta para os mercados financeiros, o BCE aumentou as compras de dívida em 120 mil milhões de euros até ao final do ano.

As decisões, que estão a ser explicadas em detalhe em conferência de imprensa com Christine Lagarde, foram anunciadas esta quinta-feira, após a reunião periódica do banco central. Uma conferência de imprensa em que muitas das perguntas de jornalistas estão a ser lidas pela diretora de comunicação do BCE, por haver menos jornalistas presentes na sala.

É claro para todos que a economia da zona euro está perante um enorme choque“, afirmou Lagarde, defendendo que tudo irá depender de quão prolongada a pandemia será e, por outro lado, quão rapidamente a propagação irá ocorrer. Lagarde diz que os governos, pelas medidas orçamentais que estão a tomar, e as várias instituições envolvidas estão a demonstrar “empenho em agir já e de forma robusta e coordenada“.

Em particular, o BCE quer que os governos têm de avançar já com “garantias de crédito, que são essenciais para complementar e reforçar a política monetária decidida hoje”. Um dos comentários que ficaram mais na retina, porém, foi quando Christine Lagarde foi questionada pelos jornalistas sobre a diferença que existe entre as taxas de juro de países como a Alemanha, por um lado, e Itália e Portugal – que têm sido penalizadas pela aversão ao risco nos mercados. “Não estamos cá para reduzir diferenciais de taxas de juro”, afirmou Lagarde.

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Lagarde diz que não quer “ficar na história com um whatever it takes 2.0″ [uma alusão à histórica expressão de Draghi, seu antecessor, que disse que o BCE faria “tudo o que for necessário” para inverter a crise financeira, em 2012]. A presidente do BCE garante que existe no Conselho “uma disponibilidade total e unânime em utilizar os instrumentos que estão à disposição” do banco central mas deixou claro que é preciso os governos atuarem de forma audaz para combater as consequências desta pandemia.

Ainda assim, a francesa recuperou uma parte do discurso de Draghi quando pediu à audiência: “Confiem em mim“, garantindo que o BCE irá usar todos os instrumentos que tem à sua disposição. No seu histórico discurso de 26 de julho de 2012, Mario Draghi tinha dito que o BCE “fará tudo o que fosse necessário” para preservar a união monetária, acrescentando: “E confiem em mim, isso será suficiente”.

A opção por não baixar as taxas de juro, que contrasta com o que foi decidido pela Reserva Federal dos EUA e o Banco de Inglaterra, explica-se pelo facto de, ao contrário dos outros, o BCE já ter as taxas de juro em níveis negativos. Sendo essa situação um fator que penaliza o setor financeiro, o Conselho do BCE não terá querido contribuir para aumentar a incerteza no setor financeiro que viria com juros ainda mais negativos, que penalizam a rentabilidade das instituições financeiras e as tornam mais retraídas.

Em contraponto, Christine Lagarde e os outros membros do conselho optaram por enviar um sinal importante com o reforço das compras de dívida, que é um tipo de medida que os mercados financeiros tendem a valorizar, e com o lançamento de novas operações de financiamento de longo prazo (e a juros baixos) para dar aos bancos ampla liquidez para poder estar disponível para emprestar à economia.

Embora o Conselho do BCE não esteja a verificar constrangimentos significativos nos mercados monetários, estas operações vão representar uma rede de segurança eficaz, em caso de necessidade”, pode ler-se no comunicado.

Nessas operações de financiamento à banca, o BCE estabelece que serão aplicadas “condições consideravelmente mais favoráveis” nos novos empréstimos de longo prazo à banca que vão ser lançados em junho. No período entre junho de 2020 e junho de 2021 os bancos vão beneficiar de descontos nas taxas de juro.

Num comunicado paralelo, elaborado pela área do BCE que gere a supervisão financeira, o banco central também anunciou uma série de medidas que atenuam os requisitos de capital para os bancos da zona euro. “O coronavírus está a mostrar ser um choque significativo para as nossas economias. Os bancos precisam de estar numa situação que lhes permita continuar a financiar as famílias e empresas que estão a viver dificuldades temporárias“, diz o comunicado assinado por Andrea Enria, líder do Conselho de Supervisão do BCE.

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