É só um “primeiro passo”, com várias “etapas” ainda para ultrapassar, mas, à direita, a proposta da Comissão Europeia para ajudar os estados-membros a fazer face à crise, é vista com bons olhos: “ambiciosa”, diz o PSD; e “solidária”, diz o CDS. É à esquerda, contudo, que mais se torce o nariz, com o Bloco de Esquerda a dizer que o excesso de condições com que a proposta foi apresentada é “um tiro no pé” de toda a proposta. E o PCP a dizer que é “limitada”.

Em causa está o programa hoje apresentado por Ursula von der Leyen no Parlamento Europeu, que, em números redondos, se traduz num pacote total de 750 mil milhões de euros, divididos entre 500 mil milhões em subvenções (tal como Merkel e Macron tinham proposto) e 250 mil milhões em empréstimos em condições favoráveis, a injetar nos Estados-membros como apoio para a resposta à crise.

Ponto por ponto. Com que linhas se cose a “bazuca” da UE contra a crise económica

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Para a eurodeputada do Bloco de Esquerda Marisa Matias, contudo, a proposta fica “muito aquém dos montantes que necessitaríamos para responder à crise pandémica”, em primeiro lugar, tendo depois outros problemas. O problema principal, disse numa mensagem em vídeo divulgada aos jornalistas, é o excesso de “condicionalidade” a que a chamada “bazuca” veio associada, e que faz com que o que parece ser verdade hoje pode não ser amanhã, uma vez que está tudo ainda depende de várias condições.

“Trata-se de um fundo de recuperação subfinanciado e sobrecondicionado”, disse, sublinhando que já se viu no que dá a condicionalidade. “Foi isso que nos levou a desinvestir nos serviços públicos no passado”, disse, vaticinando que essa condicionalidade é “um tiro no pé”. “Não podemos aceitar uma proposta que nos vai fazer pagar mais tarde um preço mais caro. A Comissão Europeia precisava de ter apresentado uma proposta robusta com financiamento adequado, de outra forma estamos a caminhar para um futuro que já conhecemos, por ser igual ao passado”, acrescentou.

Jerónimo diz que Portugal precisa “de criar anticorpos em relação às políticas neoliberais” e que resposta da UE à crise é “limitada”

Também José Gusmão, eurodeputado bloquista, critica a proposta da Comissão, dizendo mesmo que os tais 500 mil milhões que parecem ser a fundo perdido não são mais do que um mero “adiantamento sobre orçamentos futuros”.

Também o PCP torceu o nariz à proposta apresentada, com Jerónimo de Sousa a dizer que é “limitada” e a manifestar-se contra as “condicionantes e imposições” no acesso dos Estados-membros a essas verbas. Numa sessão pública sobre “Soberania e desenvolvimento, opções para um Portugal com futuro”, transmitida a partir da sede do PCP através das redes sociais, Jerónimo de Sousa criticou o “caráter limitado dos montantes” previstos pela Comissão e criticou, sobretudo, as condições aplicadas.

“A questão de fundo que se coloca é a de saber quais as condicionantes e imposições que estarão associadas a estas verbas e se as mesmas continuarão amarradas aos critérios da União Europeia empurrando o país para uma espiral de endividamento, ou se vão ser canalizadas para aquilo que faz falta ao país”, disse.

CDS aplaude “resposta solidária”, PSD congratula proposta “ambiciosa”. Mas esperam para ver

À direita, a proposta do eixo “franco-alemão” foi vista com melhores olhos. Falando aos jornalistas no Parlamento, o líder parlamentar do CDS, Telmo Correia, lembrou que se trata apenas de um “primeiro passo”, mas um bom primeiro passo: uma prova de que a Europa quer ter “uma resposta solidária”.

Lembrando que, a Portugal, calhará de acordo com este plano algo como 26 mil milhões de euros, dos quais 15 mil milhões a fundo perdido e o resto em empréstimos, embora note que o número ainda “não é rigoroso”, Telmo Correia aplaudiu o “passo positivo” que “abre sinais para a lógica de mutualização da dívida”, mas deixou claro que ainda é preciso perceber várias coisas.

Primeiro, esta trata-se apenas da proposta da Comissão, tendo ainda de ser aprovada — por unanimidade — pelo Conselho Europeu. Depois, é preciso “saber se este montante é ou não suficiente”; depois, saber “de forma detalhada como vai ser feita a distribuição pelos países”; depois ainda saber como esta verba se conjuga com o quadro plurianual de fundos comunitários que também ainda tem de ser atribuído. E, por fim, saber como é que, a nível nacional, Portugal tenciona usar e distribuir as verbas “significativas” que virão de Bruxelas.

Essas mesmas questão e dúvidas são partilhadas pelo PSD que, pela voz de Isabel Meirelles, começou por elogiar o “plano interessante e ambicioso” de Bruxelas. Mas 2embora seja uma boa notícia no início, pode não ser no fim”, afirmou, sublinhando que era preciso ultrapassar ainda várias etapas, sendo a primeira delas a difícil unanimidade no Conselho Europeu, uma vez que há pelo menos quatro países que se têm mostrado “reticentes” a aceitar o plano.

“E mesmo que este plano seja aprovado por unanimidade no Conselho Europeu, ainda vai ter que ser aprovado em alguns parlamentos nacionais, portanto não é ainda certo que isto seja passível de ser conseguido”, notou a deputada social-democrata, que também alertou para o facto de o bolo que vier para Portugal ter de ser “muito bem investido”, ao contrário do que tem acontecido, já que, no seu entender, “Portugal tem feito muito desperdício enorme dos fundos comunitários ao longo do tempo”.