Numa coisa estes dois adversários presidenciais concordam: Ventura não quer ser o Presidente de todos os portugueses. Pode parecer inusitado, quando um dos candidatos em debate é precisamente André Ventura e quando se trata de uma frase-chavão para qualquer candidato presidencial nos últimos anos. Mas perante a afirmação de Tiago Mayan Gonçalves, o líder do Chega não fez mais do que anuir. Com indisfarçável orgulho. “Não vou ser o Presidente de todos os portugueses. Não vou ser dos portugueses pedófilos e dos que vivem à conta do sistema”.

O debate entre Tiago Mayan Gonçalves, apoiado pelo Iniciativa Liberal, e André Ventura, líder do Chega, colocava frente a frente os dois rostos da direita, além de Marcelo Rebelo de Sousa, nesta corrida presidencial, mas nem por isso as valências ou diferenças face ao atual Presidente esteve no centro desta disputa. Foi antes um debate em que ambos os adversários tentaram marcar o espaço um do outro. Da parte do candidato do IL, partido que tem um deputado no Parlamento (tal como o Chega), Mayan Gonçalves quis desmantelar a ideia de Ventura como alguém fora do sistema. Enquanto Ventura, afastava o partido liberal do lado direito do espectro político português. “É um travesti de direita”

Começou logo tenso, com esta troca de argumentos sobre o que é afinal ser “presidente de todos os portugueses”, com Mayan a cavalgar episódios como aquele em que Ventura “mandou uma deputada negra para a sua terra”, querendo “cavalgar o medo” e “confinar uma minoria”. Do lado de lá da mesa de debate da RTP 1,  André Ventura já se abespinhava e ia soltando palavras como “mentira” e também aquele que seria a sua principal arma neste debate: acusar Mayan de não estar à direita.

“É isso que é ser de direita? Apoiar a Joacine Katar Moreira e as minorias?”. Esta foi apenas uma das frases que usou para provocar o adversário — o que fazia no seu tempo ou no tempo de Mayan, sem cerimónias –, mas também houve várias vezes em que se mostrou “espantando” por uma ideia concreta vir de alguém do IL em vez de Marisa Matias e de Ana Gomes ou até aquela tirada do “Bloco invertido” que atirou ao seu adversário na questão da TAP.

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No final do debate Mayan já nem olhava nos olhos o adversário. Esperava pela sua vez para falar, atacava Ventura, mas nem ficava a assistir à reação, desviava o olhar para a moderadora ou para a câmara. Para a esquerda ou para a direita, mas nunca em frente. Aliás, fez questão de deixar neste debate toda a separação entre o partido que o apoia e André Ventura, que afastou mesmo de qualquer coligação à direita que a IL possa vir a integrar no futuro. “Ainda bem”, atirava Ventura, mas sem mais argumentos.

“Somos radicalmente diferentes”, afirmou em relação ao líder do Chega, que o ia provocando a cada frase, atirando-lhe de volta que os seus apoiantes lhe chamam “bloquista e os do BE, fascista”. Sobre a visão liberal, Mayan Gonçalves disse que não quer eliminar o Estado, mas dá o exemplo de outros Estados europeus que diz que funcionam melhor, defendendo, por exemplo, “o sistema de saúde da Alemanha e o sistema fiscal da Irlanda”.

Também se atirou a Ventura na TAP, acusando-o de “querer ser acionista da TAP” e perguntando: “É isto que é ser liberal?”. E ainda colando ao adversário a vontade de “fechar a torneira a 15 milhões de RSI em vez de de quatro mil milhões da TAP”. “Está a comparar a TAP com os ciganos? A TAP com os ciganos?”, atirava Ventura sobre o tema em que se sente mais confortável. E ainda acabou com Mayan a dizer-lhe que afinal era um candidato do sistema, depois de Ventura ter falado de coligações como PSD: “Aquilo dos tachos que está nos seus cartazes é o que está a fazer”.

Conseguiu irritar Ventura com a referência ao Novo Banco quando lhe disse que “devia era estar preocupado com o calote que o amigo Luís Filipe Vieira deixou no Novo Banco”. “Deixe lá o futebol”, disse o líder do Chega, que fez carreira como comentador desportivo na televisão durante anos. Chutou o assunto para canto, disse-lhe que propôs um inquérito ao BES no Parlamento e voltou ao seu tema-conforto: ciganos. Não saiu sem prometer combate a quem se manifestar contra ele e Marine Le Pen e também que está para ficar no Chega: “Ainda sou novo, não estou a pensar sair tão depressa”.