A polémica começou ao sétimo minuto de descontos da deslocação do West Ham ao Fulham. Tomáš Souček, médio checo dos visitantes, acertou com o cotovelo na cara de Mitrovic. O lance pareceu totalmente involuntário, com Souček a atingir o adversário depois de levantar o braço para se movimentar, mas o árbitro da partida teve outra opinião. Mike Dean, um dos mais experientes árbitros do futebol inglês, expulsou o jogador com cartão vermelho direto depois de ver as imagens do VAR, tornando-se no protagonista da história mais polémica do último fim de semana da Premier League.

Este, porém, foi apenas o primeiro capítulo da história. David Moyes, treinador do West Ham, reagiu ao episódio na flash interview, garantindo que estava “envergonhado” pela atuação do VAR e da equipa de arbitragem. “Os dois cavalheiros envolvidos, Mike Dean e Lee Mason [VAR], são muito melhores árbitros do que aquilo que mostraram e têm sido muito melhores árbitros. Fico impressionado com o facto de terem visto mais do que um acidente. O que é que posso dizer? É completamente acidental, sem maldade. Ele tenta afastá-lo e acerta-lhe acidentalmente”, disse o técnico. Depois, seguiu-se o próprio Tomáš Souček, que através das redes sociais disse que já tinha falado com Mitrovic e ambos tinham chegado à conclusão de que o choque tinha sido casual.

“Falei com o Aleksandar Mitrović durante e depois do jogo e ele disse-me que o nosso duelo foi justo, agradeço-lhe por isso. Infelizmente, o árbitro tinha uma opinião diferente. Qualquer pessoa que me conheça sabe que eu nunca teria a intenção de magoar outro jogador. Peço desculpa por este momento numa temporada que estava a ser ótima. Um momento bonito de fair play do Aleksandar”, escreveu o médio checo de 25 anos. O capítulo mais dramático de toda a história, porém, só apareceu depois.

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Esta segunda-feira, Mike Dean anunciou que não vai arbitrar qualquer jogo da próxima jornada da Premier League depois de ter sofrido, em conjunto com os familiares mais próximos, várias ameaças à integridade física através das redes sociais. O árbitro de 52 anos, que apita jogos da Premier League desde 2000, reportou as mensagens recebidas — que envolviam ameaças de morte — às autoridades e deve regressar ao ativo na jornada seguinte, falhando apenas um fim de semana de competição. O assunto já teve repercussão institucional, com o presidente da Premier League a pedir “intervenção proativa” na sequência das ameaças enviadas a Dean. “É indesculpável que o Mike Dean e a sua família tenham sido agredidos por meios online, incluindo com ameaças de morte, como resultado do seu trabalho enquanto árbitro da Premier League. O Mike e a sua família têm o nosso apoio quanto a reportar tudo isto à polícia. Tudo isto, mais uma vez, sublinha a necessidade de maior intervenção proativa por parte das empresas de redes sociais para parar o abuso online e identificar os agressores”, disse Richard Masters, numa declaração que complementa uma tomada de posição forte que o governo britânico teve recentemente.

Fulham v West Ham United - Premier League

Mike Dean expulsou Souček já durante o período de descontos do jogo entre o West Ham e o Fulham

Depois de Lauren James, jogadora do Manchester United, Alex Tuanzebe, também dos red devils, e Mark Little, do Bristol Rovers, terem recebido insultos racistas através das redes sociais depois de exibições menos conseguidas, o ministro britânico da Cultura e do Desporto abriu a porta à possibilidade de as liberdades destas plataformas serem limitadas no Reino Unido se nada fosse alterado. “Vamos mudar a lei para responsabilizar mais as empresas de redes sociais por aquilo que acontece nas suas plataformas. E elas podem começar por mostrar essa responsabilização a partir de hoje ao impedirem este abuso racista. Os jogadores não podem ser agredidos por fazerem o seu trabalho. Já chega”, afirmou Oliver Dowden.

Entretanto, também já depois da decisão de Mike Dean, a Federação inglesa acabou por anular o cartão vermelho mostrado a Souček, assim como o castigo de três jogos que o jogador teria de cumprir, na sequência de um recurso do West Ham. No Twitter, o checo congratulou-se pela decisão mas também deixou palavras de apoio ao árbitro. “Todas as decisões que são tomadas dentro de campo devem ficar dentro de campo. Não gosto de ouvir que alguma coisa interfere com a vida pessoal e envio o meu apoio ao Mike Dean e à sua família. Não há espaço para abuso de qualquer tipo. Faz parte do passado e agora estou concentrado no resto da temporada”, escreveu.

Na sequência do caso, Mark Clattenburg, um dos árbitros ingleses mais experientes — apitou, por exemplo, a final do Euro 2016 entre Portugal e França –, escreveu um texto de opinião no Daily Mail onde faz várias revelações sobre as ameaças que os árbitros sofrem depois de decisões mais polémicas. “Como árbitro, o abuso torna-se em rotina. Recebia cartas em casa. Alguns dos insultos eram maus e, sim, existiam ameaças. Denunciei tudo à polícia mas, devido ao anonimato, ninguém foi detido ou condenado. É doloroso. Dá medo. O pior de tudo é que as empresas de redes sociais estão a permitir que aconteça”, disse Clattenburg, deixando também a ideia de que plataformas como o Twitter poderiam fazer algo mais para impedir este tipo de situações. O árbitro de 45 anos revelou ainda uma história que envolve Michael Oliver, outro internacional inglês, depois de um jogo a contar para os quartos de final da Liga dos Campeões de 2017/18.

“Há um limite. Infelizmente, com as redes sociais, essa linha é cruzada com demasiada frequência. O Michael Oliver teve de tirar a família de casa depois do jogo em que a Juventus foi eliminada da Liga dos Campeões, com o Real Madrid, em 2018″, contou Mark Clattenburg.