Quando um treinador diz alguma coisa, por muito localizado e temporal que seja, é praticamente impossível que a frase, a expressão ou o raciocínio não se transformem em bolas de neve. O que é dito num antevisão será comentado durante o jogo e questionado depois do jogo; o que é dito depois do jogo é questionado na antevisão do seguinte e assim sucessivamente. E nem Diego Simeone, que está no comando de um dos grandes emblemas europeus há uma década, escapa a essa verdade garantida.

Na antevisão do jogo em atraso cumprido a meio da semana, contra o Athl. Bilbao, o treinador argentino lembrou que “sem vontade não há talento” enquanto respondia a uma pergunta sobre João Félix — e sobre o facto de o jogador português ainda não ter conseguido justificar os 120 milhões de euros que o Atl. Madrid investiu no verão de 2019. A partida passou, Félix foi titular e saiu na segunda parte, os colchoneros venceram e aumentaram a vantagem na liderança da liga espanhola e Simeone tornou-se o treinador com mais vitórias na história do clube, com 309, superando o registo de Luis Aragonés. Ora, nada disso fez esquecer a frase da antevisão.

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“Se João Félix teve vontade? Expressei-me mal ou fui mal interpretado. Falei de vontade de uma forma geral e não individualizei ninguém. Defendo que a vontade é o que permite avançar na vida e sem vontade não dá”, atirou Simeone, resguardando-se da ideia de que tinha enviado um recado ao jogador português. Ora, independentemente da resposta do argentino, a verdade é que as declarações do treinador acabaram por ganhar novo mediatismo em Espanha depois de uma notícia que começou em Inglaterra: de acordo com o jornal Daily Mail, Félix é o preferido de Guardiola para substituir Agüero no Manchester City na próxima temporada.

Segundo a notícia, o avançado argentino não faz parte dos planos do treinador dos citizens para 2021/22 e está interessado numa mudança para o Barcelona — que acaba por estar relacionada com o plano de Joan Laporta, recentemente eleito presidente dos catalães, que pretende usar a contratação de Agüero, amigo próximo de Messi, para manter o capitão em Camp Nou. Assim, e com a certeza da qualidade dos produtos made in Seixal graças ao rendimento de Ederson, Rúben Dias, João Cancelo e Bernardo Silva, o Manchester City estará interessado em abordar a disponibilidade do português, que tem contrato com os colchoneros até ao verão de 2026 e está sob uma cláusula de rescisão de 350 milhões de euros.

Era neste contexto que o Atl. Madrid visitava este sábado o Getafe, já depois de o Real Madrid ter vencido o Elche e antes de o Barcelona defrontar o Huesca. Uma vitória, logo à partida, significava a manutenção dos seis pontos de vantagem para os catalães e Simeone apostava em Carrasco, Correa e Suárez para a procurar — deixando João Félix no banco. Num dérbi de Madrid, de forma natural, a única coisa constante ao longo de toda a primeira parte foi a intensidade com que cada duelo era disputado: apesar disso, o jogo chegou ao intervalo com um ritmo baixo e sem grandes oportunidades.

O Atl. Madrid tinha mais iniciativa e não permitia que o Getafe se aproximasse da baliza de Oblak, encostando a equipa de José Bordalás ao seu próprio meio-campo. Correa era o destaque dos colchoneros, com mudanças de velocidade que desequilibravam no corredor central, mas o conjunto de Simeone também não demonstrava inspiração suficiente para chegar ao golo. Carrasco teve a melhor ocasião da primeira parte, com um remate que o guarda-redes Soria defendeu depois de um passe em profundidade de Correa (7′), e o Getafe só assustou já à beira do intervalo, por intermédio de Carles Aleñá, o médio emprestado pelo Barcelona que estava a ser o melhor elemento dos azulones.

Ao intervalo, Simeone mexeu e lançou Félix para a saída de Saúl, o que significou que o jogador português foi pisar terrenos na zona do meio-campo, na meia esquerda, de forma a combinar com Carrasco e construir as movimentações ofensivas da equipa. A lógica do primeiro tempo manteve-se, com mais Atl. Madrid do que Getafe, e os colchoneros tiveram uma boa ocasião para marcar por intermédio de Marcos Llorente, que rematou para defesa de Soria (55′). João Félix fez golo, ao cabecear ao segundo poste depois de um cruzamento de Llorente, mas o lance foi anulado porque a bola saiu antes da assistência (62′).

Logo depois, Simeone voltou a mexer na equipa e lançou Renan Lodi, Lemar e Dembélé para os lugares de Carrasco, Correa e Mario Hermoso. A pouco mais de 20 minutos do apito final e depois de ser chamado pelo VAR, o árbitro da partida expulsou Nyom, lateral direito do Getafe, com vermelho direto depois de uma entrada muito dura sobre Lodi. A equipa de Bordalás, porém, não atirou a toalha ao chão e beneficiou nesta altura da melhor oportunidade para fazer golo, com um remate de longe de Aleñà que obrigou Oblak a uma defesa muito apertada (71′). Soria voltou a segurar o empate com uma enorme defesa, depois de Dembélé atirar na grande área na sequência de um ressalto (75′), e o jogo ia caminhado para o apito final sem que nenhuma equipa desfizesse o nulo.

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Simeone deixou João Félix no banco e só lançou o jogador português ao intervalo

Apesar de um claro forcing do Atl. Madrid nos últimos 10 minutos, principalmente por estar a jogar com mais um elemento, a equipa de Diego Simeone não conseguiu chegar ao golo e empatou com o Getafe na antecâmara da segunda mão dos oitavos de final da Liga dos Campeões, contra o Chelsea. João Félix não foi titular, entrou ao intervalo, marcou mas o golo não contou — e o Atl. Madrid perdeu distância para o Real Madrid e pode ver o Barcelona, até ao final da jornada, ficar a quatro pontos da liderança.