O Ministério Publico pediu esta quinta-feira que o presidente da Câmara do Porto vá a julgamento no processo Selminho, reiterando que o autarca agiu em seu benefício e da família, em detrimento do município no negócio dos terrenos da Arrábida. Rui Moreira vai saber a decisão no dia 18 de maio, afirmando estar de “consciência tranquila” no processo onde é acusado.

A única parte que ganhou com isto foi a Selminho. A Câmara [do Porto] não ganhou nada. O Dr. Rui Moreira atuou em benefício seu e da empresa da sua família e fê-lo contra a lei”, sustentou o procurador Nuno Serdoura, no início do debate instrutório.

A defesa de Rui Moreira requereu a abertura de instrução, fase facultativa que visa decidir por um Juiz de Instrução Criminal (JIC) se o processo segue e em que moldes para julgamento.

Em dezembro do ano passado, o Ministério Público (MP) acusou o autarca independente de prevaricação, em concurso aparente com um crime de abuso de poder, incorrendo ainda na perda de mandato, por alegadamente favorecer uma sua imobiliária e da sua família (Selminho), já durante o seu mandato (tomou posse em 23 de outubro de 2013), em detrimento da autarquia.

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Isto, num conflito judicial que opunha há vários anos o município à empresa imobiliária, que pretendia construir num terreno na escarpa da Arrábida.

No início do debate instrutório, o magistrado do MP questionou a tese de que “advogado incompetente” – Pedro Neves de Sousa —, que à data representava a autarquia, tenha decidido tudo sozinho, nomeadamente quanto ao acordo com a Selminho, potencialmente prejudicial para o município.

Se nós olharmos para a defesa do Dr. Rui Moreira o acordo não tem pai, nem mãe. Há um mandante e um mandatário. O advogado Pedro Neves de Sousa, que é mais uma vez apelidado de incompetente, que nem sequer teve um processo disciplinar por ter apresentado a contestação fora de tempo. Agiu sozinho?”, questionou Nuno Serdoura, reiterando que a tese de que o advogado do município agiu sozinho não colhe.

Sublinhando que o acordo celebrado, em 2014, com a imobiliária da família do presidente da Câmara do Porto, favoreceu “zero” o município do Porto, o magistrado advogou ainda que anos antes a Selminho podia ter pedido a reparação de danos por retirada da capacidade construtiva dos terrenos na Arrábida, contudo só o fez após Rui Moreira ter assumido a liderança da Câmara do Porto.

Argumenta ainda Nuno Serdoura que não há nenhuma evidência, quer antes quer depois de o independente ter assumido a gestão da segunda maior câmara do país, que permita alterar o entendimento de que naqueles terrenos não era possível construir.

O magistrado advogou ainda que os metadados informáticos do acordo celebrado entre a Câmara do Porto mostram que o entendimento entre as partes foi fechado antes de Rui Moreira se declarar impedido e a vice-presidente de Guilhermina Rego assinar a procuração para substituição legal.

Acresce, indica o procurador, que segundo o depoimento do, à data, diretor do Departamento Jurídico do Contencioso, Miguel Queirós, dias depois de Moreira ter entrado em funções, o autarca pediu os processos físicos de todas as ações que estavam em contencioso, entre as quais a Selminho, pelo que, “querendo”, o independente teria tempo para se fazer substituir no processo.

Nuno Serdoura afirma que não era necessário ser especialista em direito administrativo para perceber que “o mais elementar bom senso” levaria de imediato a que se levantasse a questão do impedimento por conflito de interesses, desmontando a tese da defesa que alega que foi Azeredo Lopes, à data chefe de gabinete, que garantiu a Rui Moreira que não havia qualquer problema em emitir a procuração forense ao advogado Pedro Neves de Sousa para representar a autarquia.

O magistrado considera ainda que a vice-presidente Guilhermina Rego “foi confrontada com um ato consumado”, referindo-se ao acordo com a Selminho.

Por outro lado, o procurador questionou ainda por que razão, se não havia nada a esconder, não existem atas ou quaisquer documentos ou emails das reuniões mantidas desde 2016 entre a Câmara do Porto e a Selminho, e porque não constam “os termos da transação nos termos do acordo”.

Jornalistas autorizados a assistir a debate instrutório do caso Selminho após protesto

O Tribunal de Instrução Criminal (TIC) do Porto acabou por autorizar os jornalistas a assistir ao debate instrutório do caso Selminho, após protesto da comunicação social que foi inicialmente impedida de entrar por falta de capacidade da sala.

A informação de que os jornalistas não poderiam assistir à sessão foi prestada à comunicação social que se encontrava à porta do Tribunal de Instrução Criminal (TIC) do Porto por uma funcionária judicial, que comunicou que a sala marcada para o debate instrutório não tem capacidade para mais de oito pessoas, lotação que foi esgotada pelos intervenientes do processo.

O início da sessão pública, na qual o Ministério Público (MP) e a defesa de Rui Moreira vão apresentar os respetivos argumentos para levar ou não o autarca a julgamento, por alegadamente beneficiar a sua imobiliária e da família em detrimento do município, estava agendado para as 14h30, tendo-se iniciado sem que fosse garantida a presença dos jornalistas na sala.

Em protestos, os jornalistas exigiram a reposição da legalidade com acesso à sessão pública, tendo mais tarde o pedido sido deferido.

Uma vez que a sessão estava em curso, a Juiz de Instrução Criminal (JIC), Maria Antónia Ribeiro, suspendeu-a, após as alegações do Ministério Público, para que três dos cerca de 15 jornalistas pudessem ouvir a gravação da mesma, com os fundamentos do procurador Nuno Serdoura. Após a audição da gravação, um jornalista vai poder assistir ao resto do debate instrutório.

A defesa de Rui Moreira requereu a abertura de instrução, fase facultativa que visa decidir por um Juiz de Instrução Criminal (JIC) se o processo segue e em que moldes para julgamento. Após o debate instrutório, a JIC Maria Antónia Ribeiro irá agendar nova data para proferir a decisão instrutória: se leva ou não o presidente da CMP a julgamento.

Em dezembro do ano passado, o MP acusou o autarca independente de prevaricação, em concurso aparente com um crime de abuso de poder, incorrendo ainda na perda de mandato, por alegadamente favorecer uma sua imobiliária e da sua família (Selminho), já durante o seu mandato (tomou posse em 23 de outubro de 2013), em detrimento da autarquia.

Isto, num conflito judicial que opunha há vários anos o município à empresa imobiliária, que pretendia construir num terreno na escarpa da Arrábida.

No Requerimento de Abertura de Instrução (RAI), a defesa de Rui Moreira nega que o seu constituinte tenha cometido qualquer crime ou beneficiado a imobiliária, defendendo a nulidade da acusação, considerando-a “manifestamente infundada“.

No RAI, consultado pela Lusa no TIC do Porto, a defesa admite que o autarca teve uma atuação “menos avisada ou desatenta“, quando emitiu a procuração forense ao advogado Pedro Neves de Sousa para representar o município no litígio judicial, que corria termos no Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) do Porto, em que, segundo o MP, a Selminho, “empresa da família do autarca e dele próprio, demandava a CMP”.

Na resposta ao RAI, o procurador do MP Nuno Serdoura sustenta que não restam dúvidas quando à “atuação criminosa” do presidente da câmara do Porto, reiterando que beneficiou a imobiliária da família em prejuízo do município, lembrando que acusou Rui Moreira “por factos praticados no exercício de funções de autarca”.

Uma vez mais, atenta a factualidade descrita na acusação, não há dúvida de que ali vem narrado de que forma agiu o arguido Rui Moreira em benefício próprio e da sua família, e em prejuízo dos interesses da CMP que lhe cabia defender, não se podendo defender que os factos que lhe são imputados sejam […] penalmente irrelevantes”, lê-se no documento, junto aos autos.