O relatório que investigou a gestão que o governo do Brasil fez durante a pandemia conclui que Jair Bolsonaro deixou, propositadamente, que brasileiros morressem vítimas do novo coronavírus, numa tentativa falhada de atingir a imunidade de grupo, levando à recomendação de que o presidente seja acusado de homicídio.

O jornal The New York Times teve acesso a partes deste relatório antes da sua divulgação, agendada para esta semana, e destaca ainda que a comissão de senadores brasileiros responsável pela investigação se prepara para recomendar acusações de homicídio em massa contra Bolsonaro.

Esta comissão parlamentar de inquérito, constituída em abril passado pelo Supremo Tribunal Federal, com objetivo de avaliar a gestão que o governo brasileiro fez da pandemia, argumenta que o Presidente brasileiro deixou intencionalmente a Covid-19 “rasgar o país e matar centenas de milhares numa tentativa falhada de alcançar a imunidade de grupo e recuperar a maior economia da América Latina”, segundo o jornal norte-americano.

O painel também recomenda acusações de crime para outras 69 pessoas, entre as quais três filhos de Bolsonaro e vários oficiais do governo, atuais e antigos.

Covid-19. Juiz manda Senado investigar gestão do governo brasileiro na pandemia

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Este painel de senadores é composto por 11 membros, sete dos quais são opositores de Bolsonaro e um dos quatro membros que é a favor é um dos seus filhos, que também está na lista de pessoas a acusar.

O relatório tem cerca de 1200 páginas e culpa as políticas de Bolsonaro pela morte de mais de 300 mil brasileiros, metade do total de mortos registados, e incentiva as autoridades brasileiras a prenderem o Presidente, conclui o jornal norte-americano, de acordo com excertos do relatório e entrevistas com dois dos senadores do painel.

Alguns dos elementos apontados pelo relatório como escolhas que levaram ao homicídio em massa de brasileiros são o facto de Bolsonaro ter incentivado ajuntamentos; desincentivado o uso de máscara; o seu ceticismo em relação às vacinas e o facto de se revoltar contra todos os que o criticavam. Tudo isto numa altura em que os outros países apostavam em confinamentos.

Há ainda a acrescentar o facto de o presidente ter incentivado o uso de fármacos desaprovadas pelos reguladores internacionais, como a hidroxicloroquina, a sua administração ter causado atrasos na distribuição de vacinas e o facto de preferir pagar a mais por uma vacina não aprovada e proveniente da Índia, num negócio que acabou por ser cancelado.

O relatório também acusa Bolsonaro de genocídio contra grupos indígenas da Amazónia, “onde o vírus dizimou populações durante meses depois dos hospitais ficarem sem oxigénio”, além de recomendar mais nove acusações, entre elas falsificação de documentos e crimes contra a humanidade.

O senador centrista e redator principal do relatório, Renan Calheiros, disse ao The New York Times que “muitas destas mortes eram evitáveis”. E acrescentou: “Estou pessoalmente convencido de que ele é o responsável pela escalada do massacre.” O jornal falou também com um analista político independente que discorda das alegações de homicídio e afirma que os sete senadores que se opõem ao presidente controlam todo o comité.

A apresentação do relatório está prevista para esta quarta-feira e a sua votação para uma semana depois. O jornal norte-americano teve acesso a um rascunho final e alerta que alguns pormenores podem ainda ser alterados. Se o relatório for aprovado, o procurador geral do Brasil tem 30 dias para decidir se segue com as acusações.

O gabinete do Presidente Bolsonaro não respondeu aos pedidos de esclarecimento do New York Times e criticou o relatório, acusando-o de ter motivações políticas