A filha do antigo presidente de Angola Tchizé dos Santos acusou esta sexta-feira o atual chefe de Estado angolano de estar a tentar sobrepor-se à família, ao divulgar a morte de José Eduardo dos Santos e anunciar preparativos fúnebres.

Numa mensagem de voz enviada aos jornalistas, Tchizé dos Santos dirige-se diretamente ao atual Presidente da República e questiona: “O senhor é o quê ao meu pai? É filho mais velho? Quem lhe deu autorização, o desplante, para me estar a convidar para o funeral do meu próprio pai?”.

Com várias críticas ao chefe de Estado, Tchizé dos Santos censura especialmente a divulgação da morte do pai, dizendo: “Ainda não sabia que o meu pai tinha morrido e o senhor já tinha publicado a morte do meu pai, quem lhe deu mandato para divulgar sem eu ter conhecimento ainda? Quem lhe deu mandato para dizer quem deve ir ou não ao funeral?”, questionou a segunda filha mais velha, a seguir a Isabel dos Santos.

Em causa está um diferendo sobre onde deve ser realizado o funeral do antigo presidente angolano, enquanto os filhos querem que as cerimónias se realizem em Barcelona, o Governo angolano está a preparar as exéquias fúnebres, e já criou uma comissão composta por 11 ministros e a governadora de Luanda para organizar a cerimónia.

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“Quem vocês pensam que são? Mandam no corpo de José Eduardo dos Santos? O cadáver pertence-lhe, senhor João Lourenço?”, questionou Tchizé, na mensagem de voz a que a Lusa teve acesso, que concluiu: “Já não lhe chamo senhor Presidente, porque para mim deixou de o ser”.

A declaração de Tchizé dos Santos surge depois de a Lusa ter noticiado, citando a sua advogada em Espanha, que os filhos vão bloquear a trasladação do corpo de José Eduardo dos Santos para Angola, argumentando que não era esse o desejo do pai, e surge pouco depois de o Presidente de Angola ter confirmado a intenção de organizar um funeral no país, com a presença de todos.

“Tchizé e os irmãos querem que se respeite a vontade do pai, que é não ser enterrado em Angola, mas sim em Espanha, porque não quer que o atual Presidente da República utilize o seu enterro com fins políticos”, disse Carmen Varela à Lusa, acrescentando que, além disso, um enterro em Angola impossibilitaria o último adeus de vários familiares próximos, já que alguns dos filhos “não podem entrar em Angola e nem sequer têm passaporte angolano”.

A advogada que representa uma das filhas de José Eduardo dos Santos, que morreu esta sexta-feira depois de duas semanas internado numa clínica em Barcelona, confirmou que foi interposta uma providência cautelar no tribunal para que o corpo não seja trasladado para Angola e revelou que “a clínica Teknon disse-nos que o corpo não vai sair da clínica enquanto não houver ou uma ordem judicial ou um acordo entre todos os filhos”.

À saída de uma reunião de emergência do MPLA, partido do poder e do qual José Eduardo dos Santos foi presidente emérito, João Lourenço afirmou: “Se tivermos em conta as atuais circunstâncias, não vemos por que razão a família que está lá fora não [possa] acompanhar o seu ente querido, estamos a contar com a presença de todos sem exceção de ninguém”.

Depois da morte do ex-presidente angolano, esta sexta-feira, aos 79 anos, em Barcelona, Espanha, permanece a incerteza quanto ao lugar onde será feito o enterro.

Tchizé dos Santos, que vive há vários anos fora de Angola, perdeu o mandato de deputada do Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA) em 2019 e afirma correr risco de vida no seu país, enquanto a irmã mais velha, Isabel dos Santos, também a residir no exterior, enfrenta vários processos judiciais e diz ser vítima de perseguição.

Questionado sobre as acusações das filhas mais velhas do ex-presidente, João Lourenço disse que o foco neste momento é a organização das exéquias e que é obrigação do executivo realizar um funeral de Estado.

“Nenhuma autoridade do país tem competência para impedir que um cidadão angolano que esteja a viver no exterior possa regressar ao seu próprio país, não importa em que circunstância”, salientou o chefe do executivo angolano.

O chefe de Estado deixou ainda um apelo: “Para que encaremos este momento com a maior serenidade possível e que o povo siga, pela comunicação social, o programa das exéquias até que consigamos realizar o funeral de Estado a que ele tem direito e que é nossa obrigação enquanto executivo organizar”.