As declarações de Marcelo Rebelo de Sousa sobre o número de abusos sexuais em Portugal — onde disse que haver 400 casos reportados pela Comissão Independente não ser “particularmente elevado” — estão a provocar críticas, da esquerda à direita do espetro político português.

Um dos últimos a questionar as palavras de Marcelo Rebelo de Sousa foi Miguel Pinto Luz. No Twitter, o vice-presidente do PSD e número dois da Câmara de Cascais disse estar “chocado” e “envergonhado” com as conclusões da Comissão Independente e censura as declarações do Presidente da República.

“O Presidente da República deve um pedido de desculpas ao país e às vítimas pelas declarações infelizes”, escreveu Carlos Guimarães Pinto no Twitter. Aos olhos do deputado liberal, as palavras do Presidente da República são “inaceitáveis“, sugerindo que “nem vale a pena discutir se o número está subestimado porque muitas queixas ficam por fazer”. “Mesmo que não estivesse, as declarações são inaceitáveis.”

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Pedro Filipe Soares, líder parlamentar do Bloco de Esquerda, considera que as declarações em causa são um “insulto” para as mais de 400 pessoas em causa. “O Presidente da República já pediu desculpa às vítimas de abusos sexuais na Igreja e às suas famílias pelas miseráveis declarações de hoje e por não ter estado à altura do cargo que ocupa?”, questionou o deputado bloquista.

No Twitter, o bloquista foi ainda mais longe: “É este o Presidente de uma República laica e de um Estado de Direito? Lamentável Fosse um caso apenas e já era preocupante.”

André Ventura instou o Presidente da República e o país a “pedir desculpa às vítimas” e a “não menorizar o seu sofrimento”. “Que declarações tão infelizes de Marcelo Rebelo de Sousa! Uma vítima de abusos sexuais, mesmo que fosse só uma, já seria muito grave”, realçou o líder do Chega no Twitter.

Também Joana Mortágua, deputada do Bloco de Esquerda, reagiu na rede social, frisando que o Presidente da República “devia estar na primeira linha de condenação aos crimes perpetrados por titulares da Igreja” e “na primeira linha da exigência de um pedido de desculpas às vítimas” e que, devido às declarações, “deve ele próprio um pedido de desculpas“.

Rui Rocha destaca dois momentos “absolutamente lamentáveis” nos mandatos de Marcelo Revelo de Sousa: “O 1.º ocorreu na na noite da tragédia de Pedrogão quando afirmou que ‘se fez tudo o que podia ter feito’ e o 2.º foi hoje.” Para o deputado da IL, “o ponto comum a ambos é uma total falta de respeito pelas vítimas”.

Numa só palavra, Isabel Moreira, deputada do PS, descreveu a afirmação de Marcelo Rebelo de Sousa como “inaceitável”.

Inês Sousa Real juntou-se às críticas a Marcelo Rebelo de Sousa, dizendo que é “incompreensível a desvalorização dos abusos sexuais de menores na igreja por parte do Presidente da República e inaceitável o contacto que fez ao bispo José Ornelas sobre a denúncia”. “Um caso que fosse era grave, muito grave e repudiável, quanto mais 400″, escreveu no Twitter.

Rui Tavares considera ser “essencial reconhecer, corrigir e pedir desculpas aos nossos concidadãos que foram vítimas destes abusos”. “Senhor Presidente, imagine todo o sofrimento e coragem que foi preciso para que 400 pessoas partilhassem as histórias de abusos que guardaram durante anos. As suas declarações podem ter por consequência minimizar esse sofrimento e desencorajar quem ainda procura forças para falar”, alertou o deputado do Livre.

Na página oficial do partido no Twitter, a Iniciativa Liberal “lamentou profundamente o comportamento” do Presidente da República no caso dos abusos sexuais. “O Presidente mostra estar mais preocupado em ilibar e relativizar a gravidade do comportamento de vários elementos da Igreja Católica do que com as vítimas dos atos hediondos. Marcelo Rebelo de Sousa deve um pedido de desculpas às vítimas e ao país”, pode ler-se na publicação partilhada após as declarações do chefe de Estado.

O Livre lamentou as afirmações do Presidente da República, que diz ter “desvalorizado” as denúncias de abusos sexuais de menores. “O que se esperava neste momento do mais alto representante do Estado era empatia com o seu sofrimento e coragem. Exige-se um pedido de desculpas às vítimas.”

Esta quinta-feira, Marcelo Rebelo de Sousa admitiu não ter ficado surpreendido com o número de queixas que chegaram à Comissão Independente que investiga os abusos sexuais, nomeadamente por não haver um “limite de tempo para as queixas”.

“Haver 400 casos não me parece particularmente elevado porque noutros países com horizontes [temporais de investigação] mais pequenos houve milhares de casos”, referiu o Presidente da República, frisando que estamos perante um “universo de milhões” que contactaram com a instituição ao longo de sete, oito ou nove décadas.

Ouça aqui o episódio do podcast “A História do Dia” sobre o trabalho da Comissão Independente.

Abusos na Igreja. Podem ser mais de 1500 vítimas?

Nesse seguimento, o chefe de Estado realçou que “nunca se é manchado quando se pretende apurar a verdade”, pelo facto de a “democracia ganhar sempre com exercício da verdade” e por ser possível tirar consequências: “Obriga as instituições a reverem-se. Todas as instituições que tenham comportamentos que se venham a provar criminosos estão obrigadas a fazer uma revisão de vida.”

Marcelo: “Haver 400 casos de abusos não me parece particularmente elevado”