Lado a lado, a partilhar uma pequena mesa castanha, Marcelo Rebelo de Sousa e António Costa falaram este sábado à noite, depois de uma semana de tensão e garantiram que tudo está bem entre os dois. A tensão “não abalou de forma alguma” a relação entre Presidente da República e primeiro-ministro, garantiu António Costa. Mesmo assim, aproveitou para voltar a dizer que cada um ocupa o lugar que lhe é devido: “O Presidente da República é eleito diretamente pelos cidadãos e, portanto, tem uma função política própria. O Governo responde politicamente à Assembleia da República e segue o seu programa”.

A partir da República Dominicana, onde Presidente da República e primeiro-ministro participam na 28.ª Cimeira Ibero-Americana, Costa sublinhou que Portugal não tem “nem um regime presidencialista, em que quem governa é o Presidente da República, nem um regime parlamentar, onde o Presidente da República não tem uma intervenção política”. “Temos um sistema sofisticado, é verdade, que tem funcionado bem ao longo dos anos”, acrescentou.

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E Marcelo de Rebelo de Sousa aproveitou para falar também deste “sistema sofisticado”, dizendo que outros países, com regimes presidencialistas ficam impressionados com “o facto de Portugal aparecer com uma posição conjunta até ao pormenor entre o Presidente e o primeiro-ministro“. E garantiu que António Costa “não dá nenhum sinal de estar cansado” — apesar de em entrevista à RTP este mês ter dito que o Governo da maioria socialista está “cansado” e  é “requentado”.  Agora diz mesmo que a “energia” de Costa neste momento “está à mostra. O primeiro-ministro, pessoalmente não dá nenhum sinal de estar cansado”.

Costa e Marcelo (e não só, já que os reparos também vieram do PS) trocaram vários recados ao longo da última semana, com o Presidente da República a lançar avisos sobre o pacote anunciado pelo Governo para a Habitação, mas Costa desvaloriza: “Não temos necessariamente de ter a mesma posição sobre o mesmo assunto”. E mesmo que admita por vezes não terem “posições coincidentes na política interna”, a “relação é boa”. “Em circunstância alguma qualquer tipo de divergência afetou as relações pessoais”, afirmou o primeiro-ministro.

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“Penso que nestes quase 50 anos de democracia não deverá ter havido algum momento em que a relações entre Governo e Presidente de República tenham sido tão fluidas, tão normais, com progressiva amizade“, acrescentou mesmo olhando sorridente para o Presidente da República sentado ao seu lado.

Quando questionado em concreto sobre uma das medidas mais polémicas do pacote da habitação apresentado pelo Governo, o arrendamento coercivo, Marcelo desviou-se dizendo que, quando saiu de Portugal rumo à República Dominicana, promulgou todas as leis, “nomeadamente a Agenda do Trabalho Digno“, referiu. E sublinhou que na decisão de promulgar “também pesou” o “consenso” parlamentar sobre o diploma, apontando que houve “um setor parlamentar muito restrito votou contra”. O Presidente da República tem defendido que também na habitação deve chegar a um consenso político-parlamentar.

Já Costa, quando foi confrontado sobre a polémica medida e se pode recuar, disse que a mesma está em discussão pública, “há largas centenas de contribuições, designadamente do Presidente da República — mas também outras, várias institucionais, pareceres escritos, da Associação Nacional de Municípios, da Associação Lisbonense de Proprietários, da Associação dos Inquilinos de Lisboa, de vários municípios”. E que no final o Governo vai “ponderar naturalmente tudo para assegurar aquilo que é fundamental, que é podermos ter o mais forte apoio às famílias.”