O antigo dirigente e candidato à liderança do PAN Nelson Silva defende que o partido deve alargar os temas que considera prioritários, porque nos últimos anos perdeu relevância, e propõe a eleição de dois porta-vozes.

Em entrevista à agência Lusa antes do IX Congresso do partido Pessoas-Animais-Natureza, que vai decorrer no sábado, em Matosinhos, distrito do Porto, o candidato à liderança disse querer um “partido cada vez mais democrático internamente”, com uma “nova lógica de funcionamento” que “abre o partido ao diálogo, abre o partido à transparência”.

“Temos uma medida inovadora, que é os dois porta-vozes”, disse, indicando que, com esta medida, “o partido um bocado alinhado à nova tendência dos partidos ecologistas europeus”.

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Na proposta de estatutos que Nelson Silva subscreve, é proposto que o PAN passe a ter dois porta-vozes, um homem e uma mulher, eleitos “até 45 dias após a realização do Congresso” em “listas de dois elementos cada, eleitas como um todo”, e que a Comissão Política Nacional por sufrágio universal e direto no Congresso.

Mesmo que estas alterações sejam aprovadas, ainda não se aplicam ao Congresso de sábado, onde será eleito um porta-voz. Além de Nelson Silva, recandidata-se a atual líder, Inês de Sousa Real.

O candidato a porta-voz, que conta com o apoio da corrente interna de opinião “Mais PAN, Agir para Renovar”, defendeu também “uma separação de poderes, por forma a que a Comissão Política Nacional não fique com demasiado poder centralizado nela própria”, e a criação do Conselho Nacional, do Conselho de Fiscalização Financeira e do Conselho Disciplinar.

De acordo com a proposta, o Conselho Nacional seria o órgão “responsável pelo desenvolvimento e execução da estratégia política do partido definida no Congresso” e pelo “escrutínio e fiscalização política das atividades dos órgãos nacionais e regionais”.

O candidato à liderança propõe ainda que, em vez de apenas delegados eleitos, todos os filiados com quotas pagas possam participar no congresso, com direito de voto.

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Sobre as linhas orientadoras da ação do partido, Nelson Silva referiu que, se for eleito, “o foco na causa animal o PAN nunca vai perder, o foco vai ser o mesmo”, mas defende que as prioridades devem ser alargadas.

“Temos pessoas muito válidas e muita experiência dentro da causa animal e dentro do direito animal, temos sim é que replicar esse foco a outras áreas, e isso é o que nós claramente defendemos. Não é diminuir o foco na causa animal, é sim ter propostas igualmente importantes e igualmente inovadoras para todas as outras áreas da vida do nosso país”, apontou.

O opositor de Inês de Sousa Real quer recuperar a “linha orientadora” seguida entre 2016 e 2021, na liderança de André Silva, sustentando que foi “essa disrupção e essa irreverência” que “trouxe mais avanços” ao partido.

“Ou seja, continuarmos a trabalhar naquela que era a nossa bandeira mãe, mas também ter realmente uma visão para, por exemplo, definir politicas económico-financeiras com base nas agendas verdes, tornar o país um pouco mais resiliente face aos impactos das alterações climáticas, apostar na descentralização das infraestruturas e dos serviços para termos um maior aproveitamento do interior do país, que está esquecido há décadas, e isso tudo faz parte da linha orientadora que o PAN sempre defendeu e que neste último ano e meio tem ficado um pouco de parte a nível de prioritização”, assinalou.

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Nelson Silva não quis antecipar o resultado do Congresso, ressalvando que “até ao lavar dos cestos é vindima”, mas disse ter perspectivas boas e que confia “na consciência individual de cada militante e que vão saber distinguir entre o que é um projeto que abre o partido à sociedade e um projeto que fecha o partido para 20 ou 30 pessoas que se mantenham no poder e controlem todas as decisões da vida partidária”.

Questionado se Inês de Sousa Real deve manter-se como deputada única do PAN na Assembleia da República caso perca a liderança, uma vez que o nome seguinte para assumir o mandato é precisamente Nelson Silva, o candidato defendeu que a decisão “é absolutamente pessoal” e que não vai exigir cargos.

“Vencendo o congresso, claramente vamos trabalhar muito próximos da representação parlamentar, por isso não vejo que exista nenhum tipo de obrigatoriedade ou algum tipo de incompatibilidade de Inês Sousa Real se manter no parlamento, se for essa a sua decisão. Caso não seja, nós depois avaliaremos no futuro”, afirmou.

No que toca ao mandato da atual direção e de Inês de Sousa Real como líder do PAN, Nelson Silva avalia como “um desastre completo”.

“Acho que perdemos a relevância, perdemos aquela chama que trazia as pessoas a interessarem-se um pouco pela nossa mensagem. E a nossa mensagem, que é forte, fica um bocado a nadar, um bocado perdida no meio do oceano de todas as outras ideias e não conseguimos quebrar essa barreira”, criticou.

E considerou que “o PAN acabou por se meter numa posição em que fica complicado fazer uma oposição mais dura a partir do momento em que partilha responsabilidade política a troco de migalhas”, nomeadamente no que toca ao Orçamento do Estado.

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Nelson Silva assumiu o mandato de deputado à Assembleia da República após a saída do anterior porta-voz, André Silva. Foi autarca pelo partido e membro da distrital de Lisboa, da Comissão Polícia Nacional (órgão alargado de direção) e da Comissão Permanente (órgão mais restrito e de direção política), tendo integrado a lista encabeçada por Inês de Sousa Real no último congresso.

No entanto, foi um dos dirigentes que se demitiu da Comissão Política Nacional em fevereiro do ano passado, alegando “asfixia democrática interna”.