Espanha joga esta sexta-feira contra a Suécia, na fase de grupos da Liga das Nações feminina. Ou seja, e de forma natural, esta quinta-feira era dia de conferência de imprensa de antevisão da partida — com a selecionadora, Montse Tomé, e com uma jogadora, tal como acontece em todas as seleções em qualquer parte do mundo. Mas Espanha, neste momento, não é uma seleção como todas as seleções em qualquer parte do mundo.

Nas redes sociais, a RFEF anunciou que as jogadoras escolhidas para marcar presença na conferência de imprensa eram Alexia Putellas e Irene Paredes, dois pesos-pesados da seleção campeã do mundo e também duas capitãs. E foi por isso que, quando Montse Tomé surgiu sozinha na sala de imprensa, os jornalistas presentes não reagiram a um certo agitar na cadeira — o corte era visível e estava personificado, com selecionadora e jogadoras a falarem de forma separada e individual na antevisão do jogo do dia seguinte.

Uma reunião até às 5h da manhã, um acordo com 21 jogadoras, as duas dissidentes: Mapi León e Patricia Guijarro mantêm renúncia a Espanha

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Vincando sempre a ideia de que estava na sala de imprensa para falar do encontro contra a Suécia e não de “temas extra-desportivos”, a treinadora espanhola não se alargou muito para lá do que já tinha dito na segunda-feira, quando convocou várias jogadoras que tinham renunciado. “Desde que cheguei a este cargo que sei que esta é uma situação excecional. Tentei focar-me na parte desportiva, pensar no que podia controlar. Formar a minha equipa, pensar na maneira como íamos planear os jogos contra a Suécia e a Suíça. Acontecem coisas que não controlo, que estão sob controlo de outras pessoas. Acho que existe uma falha de comunicação. Sempre quis proteger as jogadoras, estar ao lado delas, ao lado da Jenni [Hermoso], que passou mal, assim como as suas companheiras”, disse Montse Tomé.

“Partilhei muita coisa com a Jenni e empatizo com ela em tudo. Mas tenho de ser profissional e fazer uma convocatória. Escolhi aquelas que, para mim, são as melhores. A intenção sempre foi ajudá-las, entendê-las. Não sei se existiu falta de comunicação, falta de tempo… São coisas que estão para lá da parte desportiva”, acrescentou, garantindo que sente que tem a equipa ao seu lado e que tem “confiança” de que vai permanecer à frente da seleção.

Depois de responder às perguntas dos jornalistas, Montse Tomé saiu e entraram Alexia Putellas e Irene Paredes, prontas para fazer exatamente o mesmo. E Putellas deixou desde logo um aviso: a conferência de imprensa teria de ser curta, porque existia treino a seguir, mas as jogadoras estão disponíveis para falar de tudo logo a seguir ao duplo compromisso para a Liga das Nações.

As convocadas por obrigação, a mudança do local de estágio e a ameaça de boicote: o retrato da concentração da seleção feminina

“Há muito tempo que pedíamos que nos ouvissem, porque há muitas décadas que notávamos uma discriminação sistemática em relação ao futebol feminino. Tivemos de lutar muito para ser ouvidas. E isso causa um desgaste. Um desgaste que não queremos ter, porque aquilo que nos preocupa é o que acontece dentro de campo. Na fina do Mundial, que fez ontem um mês, aconteceram coisas imperdoáveis. Foi a gota que fez o copo transbordar, tal como aquilo que aconteceu depois da Assembleia-Geral [Luis Rubiales rejeitou demitir-se]. Tínhamos de decidir que a partir de agora era tolerância zero, por ela [Jenni Hermoso], por nós e para que isto não volte a acontecer na nossa sociedade”, explicou a jogadora do Barcelona, acrescentando que muitos pormenores ainda não chegaram à comunicação social.

“Foram acontecendo uma série de coisas e quando tivermos mais tempo vamos explicar tudo, dentro dos limites daquilo que podemos contar. Existem comunicados, existe um processo judicial a decorrer, existe uma vítima, que é a única pessoa que não provocou nada. Desde o início que lhe dissemos que íamos estar ao seu lado. Depois aparece a convocatória, na sequência de uma reunião que decorreu até de madrugada. Dormimos quatro horas em toda a semana”, indicou Alexia Putellas, que já conquistou a Bola de Ouro em duas ocasiões.

Mais à frente, confirmou que as jogadoras só corresponderam à convocatória para não sofrerem castigos ou sanções, garantiu que nunca pediram a destituição de Montse Tomé e explicou o que foi exigido à RFEF na tal reunião de segunda-feira. “Limitámo-nos a denunciar. Pedimos que a Federação de todos tenha tolerância zero em relação a pessoas que esconderam, aplaudiram ou incitaram um abuso. Foi isso, simplesmente. Quem vai investigar ou decidir o que muda é a própria Federação. Nós não temos nenhuma competência para despedir ou manter alguém. Só temos competência para jogar e marcar golos. O que a Jenni passou não pode ser tolerado”, concluiu.