O Banco de Portugal reviu em baixa a previsão de crescimento económico para o próximo ano. A anterior projeção apontava para um crescimento de 1,5% em 2024, tal como prevê o Governo no Orçamento do Estado, mas o Banco de Portugal passou a estimar que o crescimento irá ficar-se pelos 1,2% – e há risco de que seja ainda menos do que isso. Maior do que o previsto pelo Governo será, porém, o excedente orçamental deste ano de 2023: 1,1% do PIB (previa-se, em junho, um défice de 0,1% e Governo prevê superávite de 0,8%).

As novas previsões estão no Boletim Económico divulgado esta sexta-feira pelo Banco de Portugal – apresentadas em conferência de imprensa pelo governador Mário Centeno. No comunicado lê-se que “a economia portuguesa estagnou nos trimestres recentes e as perspetivas a curto prazo são incertas, predominando os riscos em baixa“, uma forma de dizer que é mais provável que a economia cresça menos do que os 1,2% previsto do que cresça mais.

“A recuperação da atividade será gradual ao longo do próximo ano, beneficiando da aceleração da procura externa, do efeito da descida da inflação no rendimento das famílias e do impulso dos fundos europeus no investimento”, escreve o supervisor financeiro no comunicado.

Na conferência de imprensa, Mário Centeno diz que esta previsão de crescimento económico é “exigente”. “No cenário-base não há nenhum desenvolvimento recessivo, há uma forte desaceleração no final de 2023 e, de acordo com alguns sinais, no início de 2024”, afirmou o governador do Banco de Portugal, explicando que tem muito a ver com a descida da procura externa.

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“Instabilidade política não rima com crescimento económico”

“Os riscos de origem interna estão associados a um cenário de incerteza na condução da política económica e a eventuais atrasos na execução dos fundos europeus”, diz o Banco de Portugal, com Mário Centeno a repetir que “instabilidade política não rima com crescimento económico”.

Centeno, num curto comentário às eleições de 10 de março, diz que não deve haver demasiada “ansiedade” e “as instituições estão a funcionar”. As eleições “vão promover um processo de transição governativa que o país já assistiu muitas vezes no passado e vai saber dar-lhe boa resposta”, defende Centeno, lembrando que “uma das grandes conquistas das democracias foi apresentar-se com soluções estáveis de governo e que isso se traduza num aumento da credibilidade do País e da sua capacidade de crescer”.

Relativamente à taxa de inflação, esta “deverá prosseguir a trajetória descendente, reduzindo-se de 5,3% em 2023 para 2,9% em 2024 e para 2% até ao final do horizonte de projeção”, que é de 2026. “Esta diminuição reflete os efeitos desfasados da redução de custos de produção e das decisões de política monetária do Banco Central Europeu”, nota o Banco de Portugal.

E, nas contas públicas, os “principais indicadores orçamentais devem manter uma evolução favorável no horizonte de projeção”. O Banco de Portugal estima que o excedente orçamental atingirá 1,1% do PIB em 2023, “sobretudo devido ao fim das medidas relacionadas com a pandemia”. Para 2024 prevê-se uma diminuição do excedente, para 0,1% do PIB, “resultando do abrandamento da atividade económica e de uma política expansionista, assumindo as novas medidas adotadas uma natureza mais permanente”.

A manutenção de excedentes orçamentais é necessária para a redução da dinâmica da dívida pública a que temos assistido“, diz Mário Centeno, em conferência de imprensa em Lisboa. O rácio da dívida pública deve atingir um valor próximo de 100% do PIB no final de 2023, continuando a reduzir-se até 2026, antecipa o Banco de Portugal.

Mas devia ter sido este excedente sido usado noutras despesas? “É um exercício complexo e alvitrar sobre essa matéria não cabe neste exercício“, diz Mário Centeno, antigo ministro das Finanças.

“Guardemos algum respeito face a aumentos da receita que podem não ter uma característica permanente muito forte. Não devemos neste contexto assumir responsabilidades que sendo elas permanentes possam vir a causar desvios nos momentos seguintes”, remata Mário Centeno.

Crescimento acima da média europeia à boleia de investimento e exportações

O crescimento económico de 1,2%, a confirmar-se, será ainda assim uma expansão económica acima da média europeia – ainda nesta quinta-feira o Banco Central Europeu (BCE) apontou para um crescimento de 0,8% na zona euro em 2024. Porém, é uma desaceleração clara quando comparada com o crescimento de 2,1% estimado para este ano de 2013.

Comissão Europeia já tinha previsto desaceleração da economia

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No Orçamento do Estado para 2024, o Ministério das Finanças aponta para uma desaceleração do crescimento do PIB dos 2,2% registados em 2023 para 1,5% em 2024. Entre as principais instituições económicas nacionais e internacionais, o Banco de Portugal (BdP) e o Fundo Monetário Internacional (FMI) também preveem uma expansão do PIB de 1,5% em 2024, com o Conselho das Finanças Públicas (CFP) a apontar para 1,6%. Por seu lado, a Comissão Europeia espera um crescimento de 1,3%% e a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) de 1,2%.

O Banco de Portugal prevê que a economia beneficie em 2024 do “dinamismo do investimento e das exportações“. A formação bruta de capital fixo (investimento) deverá acelerar para 2,4% em 2024, expandindo-se em 5,2% e 4,1% nos dois anos seguintes, respetivamente. Já as exportações “deverão crescer a um ritmo mais contido do que em anos anteriores (3,4%, em média, em 2023-26), devido ao menor dinamismo da procura externa”, diz o Banco de Portugal, acrescentando que se projetam “ganhos adicionais de quota de mercado das exportações neste período”.

Já o consumo privado e o consumo público devem continuar a perder peso no Produto Interno Bruto (PIB). “O consumo privado deverá crescer de forma moderada, 1% em 2023-24 e, a partir daí, em torno de 1,6%, num contexto de ganhos do rendimento disponível real”, diz o Banco de Portugal.

A fraqueza da atividade reflete o impacto da subida das taxas de juro e o abrandamento da procura externa, a par da dissipação do impulso associado à retoma pós-pandémica do turismo e à recuperação do choque sobre os termos de troca. As perspetivas são condicionadas pela incerteza dos novos focos de tensões geopolíticas e da situação política nacional. No entanto, subsistem fatores de resiliência no mercado de trabalho, no estímulo dos fundos europeus e na competitividade de alguns setores-chave”, diz o Banco de Portugal.

O Banco de Portugal destaca que “o mercado de trabalho continua a apresentar uma situação favorável, apesar da quase estabilização do emprego, esperando-se um aumento dos salários reais”. Prevê-se aumentos do emprego de 0,8% em 2023, 0,1% em 2024 e 0,3% em 2025-26, com a “taxa de desemprego a apresentar um valor médio de 7,2% em 2024-26, próximo da estimativa de taxa de desemprego tendencial”.

Começamos a ver os primeiros sinais de uma desaceleração visível do mercado de trabalho“, disse Mário Centeno, considerando que é “natural” neste ponto do ciclo e pedindo que se dê prioridade ao aumento da produtuvidade.

A expectativa do Banco de Portugal, porém, é que no ano seguinte (2025) a economia portuguesa volte a acelerar para um crescimento de 2,2% em 2025 (seguido de 2% em 2026). “Em 2025 e 2026, o crescimento beneficiará da dissipação gradual do impacto da subida das taxas de juro”, diz o Banco de Portugal.