Pedro Nuno Santos já estava reunido com o Presidente Marcelo Rebelo de Sousa quando o debate sobre a compra de ações dos CTT pela Parpública começou no Plenário da Assembleia da República. O que não impediu André Ventura, líder do Chega (partido que tinha requerido a interpelação sobre esse caso), de perguntar pelo novo secretário geral do PS.

“Onde é que está Pedro Nuno Santos?”, atirou Ventura, em jeito de pergunta “onde está o Wally?”. Pedro Nuno Santos chegaria no final do debate, para se sentar na última fila, ainda a tempo de ouvir um outro deputado do Chega, Pedro Pinto, acusá-lo de não ter coragem de dar a cara. Também para trás já tinha ficado a crítica de não ter sido aprovada a audição a Fernando Medina, atual ministro das Finanças, sobre o mesmo tema. “Quantos mais casos haverá?”, questiona o Chega que acusa o Governo de tomar estas decisões pela calada. E foi de falta de transparência e de opacidade que a direita foi acusando o Governo do PS, apontando em particular a Pedro Nuno Santos, sobre quem recordaram as intervenções na TAP e o papel na autorização por mensagem de telemóvel da indemnização a Alexandra Reis, depois de num primeiro momento ter dito não ter dado esse aval.

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Chega e PSD foram particularmente críticos da intervenção do Governo com a compra de ações. As perguntas sucederam-se, sem respostas. A bancada do Governo estava, nesta interpelação, vazia. Nenhum elemento compareceu, nem mesmo a ministra dos Assuntos Parlamentares, Ana Catarina Mendes, nem o titular atual da pasta dos Correios, Mário Campolargo, ou algum elemento do Ministério das Finanças.

E assim o PS ficou a defender o Governo praticamente sozinho, com a esquerda — em particular Bloco de Esquerda e PCP — a preferir atacar o Chega pelo financiamento que recebe de um dos principais acionistas dos CTT, Manuel Champalimaud, e a criticar os CTT pelo que dizem ser uma queda na qualidade de serviço, a subida de preços, a retirada de direitos e salários aos trabalhadores. E ainda a questionarem as bancadas da direita sobre se 0,24% — o que a Parpública acabou por comprar dos CTT — é relevante para que os partidos pudessem aceitar negociar orçamentos com esses valores. O PCP chegou a assumir que sabia que o Estado estaria a comprar, em 2021, ações dos CTT; já o Bloco disse não ter conhecimento.

Governo de Costa queria mais, Parpública comprou 0,24% dos CTT. Uma operação só conhecida passados dois anos

A direita não tem dúvidas de que houve “negociata”.  “Serviu ou não para dar mão aos parceiros? Foi ou não uma forma barata para comprarem o apoio extrema esquerda? Quem faz bem ao ingrato compra caro, vende barato”, atirou Filipe Melo, do Chega. Também o PSD pediu ao PS para não tentar negar que a compra de ações não foi uma moeda de troca.

“O PS comporta-se como dono do Estado. A esquerda é cúmplice. Parecem uns santinhos preocupados com povo e depois desbaratam dinheiro do Estado”, disse Hugo Carneiro, do PSD, remetendo para o Tribunal de Contas a análise ao processo.

Foi do PSD que surgiram mais perguntas. Porque a UTAM não divulgou o seu parecer? Não terá havido utilização de informação privilegiada?

“Não terá sido esta uma decisão política, uma instrução direta de alguém?”, perguntou Hugo Carneiro, do PSD, querendo saber de quem. “O senhor primeiro-ministro, com desplante, tenta justificar a não divulgação pública para não perturbar a cotação”, mas porque “não divulgou depois desse momento? Já não ia influenciar cotações”. E deixou a suspeição: a cotação subiu. “Alguém teve informação privilegiada? Não sabemos”. A CMVM, questionada pelo Observador, recusou a dizer se tinha havido investigações aos movimentos das ações em bolsa.

“A tese do primeiro-ministro não é crível. Quem foram os mentores, o primeiro-ministro demissionário, Pedro Nuno Santos, e como terá ocorrido dentro do próprio governo, por whatsapp? Será que já não vimos este filme antes? O ator não será o mesmo?”. Pedro Nuno Santos, segundo Hugo Carneiro, “negou dar ordem, no dia seguinte já disse que sabia. O que mudou, porque falou antes do primeiro-ministro? Não estava para aturar mais as suas ações?”.

O Ministério das Infraestruturas, tutelado, em 2021, por Pedro Nuno Santos não teria de dar o seu aval à compra, questionou ainda o deputado social-democrata falando do então ministro das Finanças, João Leão, como o “carteiro útil de serviço”.

Ainda do PSD vieram as perguntas e as críticas pelo facto do contrato de concessão (o novo) por sete anos com os CTT ter sido feito sem concurso público e assinado já com um governo à espera de ser mudado (fevereiro de 2022). Paulo Moniz, do PSD, diz também que essa renegociação foi feita à socapa. “Quando o PS se arroga de defensor do interesse público não o faz, é defensor de si mesmo. O PS defende-se a si e aos seus”.

Parpública comprou ações dos CTT quando Estado negociava novo contrato de concessão e Pedro Nuno criticava privatização

O debate tinha o recente caso dos CTT no centro, mas acabou estendido à intervenção do Estado na TAP, na Efacec e até, pela voz do PS, da venda da ANA, a propósito da mais recente auditoria divulgada pelo Tribunal de Contas.

Privatização da ANA teve “inconsistências graves” e não salvaguardou o interesse público, diz Tribunal de Contas

Carlos Pereira, deputado socialista, não deixou dúvidas de que a compra de ações foi legal e que teve como objetivo defender o interesse público. Foi da bancada do PS que, pela voz de Fátima Correia Silva, chegou a premissa que Pedro Nuno já tinha deixado anteriormente, dizendo ao PSD que esperam do partido um pedido de desculpas pela privatização dos CTT, abaixo do valor, disse a socialista. O PSD não só não pediu desculpa como ainda recordou à bancada do PS que a privatização dos Correios foi inscrita no Programa de Estabilidade e Crescimento de 2010/13 do Governo de José Sócrates, mesmo antes da vinda da troika e da sua inscrição no memorando de entendimento. “Só o PS consegue fazer pior do que o PS”, atirou Carlos Guimarães Pinto, reformulando a frase de António Costa (no congresso do PS) de que só o PS consegue fazer melhor do que o PS. 

Pedro Nuno assume que sabia e concordou com compra de ações dos CTT. E atira-se ao PSD por “privatização desastrosa”