O primeiro impulso foi pegar em bens essenciais e fugir de Khan Younis assim que a ordem de evacuação de Israel foi dada aos residentes na cidade esta segunda-feira. Ahmed al-Najjar, de 26 anos, e a sua família ainda percorreram alguns quilómetros em direção a Rafah, mas decidiram regressar a casa apesar das mãos dos ataques israelitas que são esperados na região nos próximos dias à medida que Israel se diz cada vez mais próximo de eliminar o Hamas e concluir a missão armada em Gaza.

“Não sabíamos para onde iríamos e não tínhamos dinheiro suficiente para comprar uma nova tenda. Tivemos de passar a noite na rua e isso aumentou o nosso stress. Esta manhã, decidimos voltar para casa. Não há mais nenhum sítio.”, disse al-Najjar, citado pela AFP. “O que quer que aconteça, acontece. Não temos nada a perder agora“.

Passaram poucas semanas desde que Khan Younis foi abandonada pelo exército israelita depois de intensos bombardeamentos terem deixado um rasto de destruição na cidade. As sucessivas ordens de evacuação provocaram um vaivém entre as duas cidades da Faixa de Gaza desde 7 de outubro. Agora, seja pela falta de combustível, de meio de transporte ou só mesmo devido à falta de esperança, vários residentes ou deslocados em Khan Younis decidem ficar e esperar para ver o que acontece a seguir.

A Organização das Nações Unidas (ONU) calcula que cerca de 250 mil pessoas tenham sido afetadas pela ordem militar israelita de segunda-feira para que os civis abandonem al-Qarara, Bani Suhaila e outras localidades perto de Khan Younis, a segunda maior cidade de Gaza. No total, desde o escalar do conflito israelo-palestiniano, somam-se 1.9 milhões de palestinianos deslocados devido à guerra em curso.

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Exército israelita continua a emitir ordens de evacuação para zonas que antes declarou como “seguras”

A ajuda humanitária não chega, as casas estão destruídas e, sempre que uma zona parece estar livre de perigo, surge nova ordem de evacuação. As principais dificuldades surgem perante a necessidade de evacuar hospitais, repletos de doentes com mobilidade reduzida e a necessitar de cuidados permanentes. Esta terça-feira, o Hospital de Khan Younis ficou praticamente vazio. Ao início da tarde, a OMS informava que só três pacientes ainda não tinham sido retirados das instalações.

Na rede social X (antigo Twitter), as Forças de Defesa de Israel fizeram questão de notar que a ordem de evacuação não se aplica aos pacientes e pessoal médico do Hospital Europeu de Khan Younis. Ainda assim, “o pessoal do hospital e os doentes decidiram evacuar por si próprios”, afirmou esta terça-feira Rik Peeperkorn, representante da OMS.

Para Luciano Zaccara, professor de política no Centro de Estudos do Golfo da Universidade do Qatar, a ordem de evacuação de Israel indica a sua incapacidade de atingir o objetivo de “eliminar o Hamas” e a sua intenção de esgotar a população palestiniana em Gaza.

Citado pela Aljazeera, o especialista não tem dúvidas de que Israel quer ganhar esta guerra “esgotando as pessoas“. Com as sucessivas ordens de evacuação “cria muito mais problemas e danos para os palestinianos que não podem ficar mais de um mês ou 15 dias num só lugar”.

Esta terça-feira, António Guterres reagiu à ordem de Israel para uma evacuação da cidade de Khan Younis e afirmou que mostra, “uma vez mais”, que “nenhum sítio é seguro em Gaza” para os civis palestinianos.

“É outra paragem neste movimento circular mortífero que a população de Gaza tem que enfrentar regularmente”, disse o secretário-geral das Nações Unidas, citado pela France24, numa declaração em que reiterou também os apelos para um cessar-fogo, que considera ser a única forma de preservar a integridade física da população.

A cronologia da “segurança” intermitente em Khan Younis

Khan Younis é a segunda maior cidade da Faixa de Gaza e foi um dos principais alvos do exército israelita após o Hamas ter atacado Israel, a 7 de outubro. A cidade no sul de Gaza foi, aliás, o primeiro local a ser bombardeado por Israel depois do fim do cessar fogo.

No dia 5 de dezembro de 2023, as forças israelitas cercaram Khan Younis , deslocando milhares de pessoas que procuram refúgio na cidade vizinha Rafah. Na altura Israel indicava que a operação na região ia durar até quatro semanas.

Khan Younis, um dos alvos do exército israelita e o local onde nasceram os principais inimigos de Israel

Pouco mais de dois meses depois, a 14 de fevereiro, Israel ordenou nova evacuação do Hospital Nasser, em Khan Younis, com atiradores a disparar contra quem quer que se deslocasse nos terrenos das instalações e nas proximidades.

No início de abril as tropas israelitas retiraram-se de Khan Younis para prepararem a invasão terrestre de Rafah, deixando os residentes a regressar a uma cidade em ruínas, solução adotada por centenas de milhares de deslocados. Durante o mês de maio, os campos de tendas em Khan Younis aumentaram depois de Israel ordenar a evacuação de 1.4 milhões de palestinianos em Rafah.

Pressão sobre o Hamas ou ofensiva em Rafah: o que significa a saída das tropas israelitas do sul de Gaza?

Os alarmes de que poderia estar próxima uma ameaça à “zona segura” de al-Mawasi, entre Rafah e Khan Younis, começaram a soar a 23 de junho, após um ataque israelita ter matado 25 pessoas. A confirmação surgiu esta segunda-feira, 1 de julho, com Israel a emitir uma ordem de evacuação para o leste de Khan Younis, dirigindo os residentes para uma “zona humanitária” não especificada.