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A direita à procura do MEL

Rio quer mostrar ser alternativa. Rodrigues dos Santos tenta provar ser útil. Cotrim quer crescer para lá do ruído. E Ventura fazer do ruído a força. Objetivos e riscos dos líderes da direita no MEL.

A grande família não socialista vai estar reunida nos próximos dois dias para mais uma convenção do Movimento Europa e Liberdade (MEL). Este ano, com uma novidade: pela primeira vez, naquela que será a terceira edição do certame, os quatros líderes da direita vão marcar presença no evento.

Existe, por isso, a expectativa de perceber como é que os quatro — Rui Rio, Francisco Rodrigues dos Santos, André Ventura e João Cotrim Figueiredo — vão aproveitar o momento para se posicionarem politicamente. Se é certo que há um objetivo que os une a todos — derrotar António Costa e o PS — o caminho que definiram para lá chegar difere (e muito).

Com todas as sondagens a darem o bloco das direitas a milhas de distância do bloco das esquerdas, servirá o terceiro encontro do MEL para relançar a direita? Ou, por outro lado, vai tornar ainda mais evidentes as fraturas entre PSD, CDS, IL e Chega? O encontro e, sobretudo, os ecos deste congresso podem traduzir-se em ganhos mas também em prejuízos para os quatros líderes da direita. São essas contas que se vão fazer no final.

Rui Rio

FILIPE AMORIM/OBSERVADOR

Ganhos

O líder do PSD participa pela primeira vez no encontro do MEL e é sobre ele, naturalmente, que recairão todas as atenções. Rui Rio chega aqui na antecâmara de umas eleições autárquicas que assumiu como decisivas para o partido (e para a sua continuidade à frente do PSD), com uma larga parte do aparelho partidário descrente nas hipóteses reais de regressar ao poder e sob críticas internas e externas à estratégia que assumiu para lidar com o fenómeno André Ventura.

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Este congresso representa, por isso, uma oportunidade para Rui Rio: afirmar o PSD como único partido capaz de liderar a oposição a António Costa e afinar a estratégia de apelo ao voto útil na direita — um discurso que o presidente social-democrata já vem ensaiando e que, sabe o Observador, se tornará mais recorrente nas próximas semanas e meses.

Se conseguir provar por a+b que sem um PSD forte nas urnas não há alternativa ao PS e que a dispersão de votos pelos outros partidos à direita são um seguro de vida de António Costa, Rui Rio pode conseguir reafirmar a preponderância dos sociais-democratas no tabuleiro político português e esvaziar os restantes partidos.

Mais: tem uma oportunidade importante para evidenciar que só o PSD tem dimensão e um programa sólido, transversal e coerente para governar o país, capaz de falar para o eleitorado do centro moderado (onde se ganham eleições) que não se revê na proposta liberal da IL, na agenda radical do Chega ou na linha mais conservadora do CDS.

Riscos

Rui Rio aceitou mais uma vez aparecer ao lado de André Ventura na fotografia. Depois do acordo alcançado nos Açores, o líder social-democrata tem sido acusado pelos críticos internos e pelos adversários à esquerda de estar ativamente a “normalizar a extrema-direita” como parte de uma estratégia para regressar ao poder sem olhar a meios. O facto de ter dito ‘sim’ ao convite da organização do MEL voltou a servir de arma de arremesso político.

António Costa, por exemplo, acusou o líder social-democrata de se estar a deixar “contaminar” pelas ideias do Chega, referindo-se não só ao acordo com o Chega mas também à escolha de candidatos autárquicos como Suzana Garcia. Catarina Martins, na convenção do Bloco de Esquerda deste fim de semana, dedicou largos minutos da sua intervenção final para agitar o fantasma do regresso da extrema-direita e para acusar Rio de andar ao colo com André Ventura.

Mesmo internamente, a participação no congresso do MEL tem causado algum mal-estar — ainda que Paulo Mota Pinto, presidente da Mesa do Congresso, já tenha representado oficialmente o partido na edição anterior. Em entrevista ao Público e à Rádio Renascença, o vice-presidente David Justino sugeriu que não teria “interesse” em participar nesta iniciativa e disse mesmo que o congresso estava a contribuir para a “normalização do Chega” e a reconhecê-lo “como uma força política importante“.

O líder do PSD tem-se esforçado, entrevista após entrevista, intervenção após intervenção, a explicar que, se um dia chegar ao poder e precisar do Chega para uma maioria parlamentar, nunca abdicará de determinados princípios para responder à agenda de Ventura. Mas a narrativa dos adversários políticos continua a ganhar terreno.

A participação nesta ‘Aula Magna da Direita” traz esse risco acrescido: se Rio não conseguir evidenciar as linhas vermelhas do PSD face ao Chega, e falhar em explicar a alternativa que o PSD propõe para o país, não só perde sentido o apelo ao voto útil na direita como pode afastar uma parte do eleitorado do centro moderado, que se tenderá a mobilizar contra toda e qualquer hipótese de ver Ventura influenciar o poder.

Francisco Rodrigues dos Santos

DIOGO VENTURA/OBSERVADOR

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Francisco Rodrigues dos Santos está com óbvias dificuldades em descolar nas sondagens e em seduzir uma parte do CDS que nunca aceitou a sua vitória em 2020. Com uma concorrência séria à direita pela primeira vez na história do partido, os democratas-cristãos estão ensanduichados entre um PSD que se quer afirmar ao centro, uma força política abertamente liberal (a IL) e uma direita radical (o Chega) que também consegue absorver uma parte do eleitorado mais conservador.

Este congresso pode ser, por isso, uma oportunidade para que Rodrigues dos Santos se afirme como o único partido verdadeiramente capaz de ser parceiro de governação dos sociais-democratas. Ao contrário da IL e do Chega, o CDS tem experiência governativa, quadros preparados para tal e uma transversalidade programática e de temas que os outros ainda não têm ou não querem ter.

Se conseguir ser bem sucedido, Rodrigues dos Santos pode aproveitar este congresso como uma oportunidade para clarificar a proposta política do CDS e para reafirmar a influência na definição de qualquer maioria de direita que venha a existir, impondo-se como necessário ao PSD e apontando as insuficiências da IL e do Chega. 

Riscos

Há muito habituado a ser uma casa comum onde convivem as doutrinas liberal, conservadora e democrata-cristã, o CDS é, naturalmente, o partido mais afetado pela fragmentação das direitas. A era-Portas e, depois, a era-Cristas, que acentuou a tentação de tornar o CDS num catch-all party, aumentaram a crise de identidade do partido, que hoje, com alternativas vincadamente conservadoras e liberais no mercado, tem dificuldades em explicar ao eleitorado o que é e para que serve.

Quando avançou para a liderança, Francisco Rodrigues dos Santos prometeu devolver o partido às origens e renovar a agenda dos valores do CDS. Mas o contexto político em que surgiu (entrada das duas novidades à direita, IL e Chega), o contexto social (uma pandemia que dominou a agenda pública e mediática),  o contexto partidário (os principais quadros do partido ficaram do outro lado da barricada) e o contexto interno (dificuldades de afirmação, falta de uma equipa experiente e crises atrás de crises) atiraram o CDS para mínimos históricos nas sondagens.

Todos estes fatores ajudaram a criar a perceção de que o CDS corre o sério risco de extinção. Rodrigues dos Santos colou-se a Rio nas autárquicas para conseguir manter influência local; a existência de uma coligação alargada nas legislativas é uma possibilidade teórica. Mas para continuar a ser considerado para uma coligação de poder tem de conseguir cumprir o grande objetivo: manter-se relevante.

Se os partidos à sua direita crescerem, em particular o Chega, a dura realidade da aritmética vai acabar por chegar: de que vale um partido com cinco, quatro, três ou menos deputados ao lado de um partido com oito ou nove? Valerá muito pouco.

André Ventura

JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

Ganhos

O grande ganho de causa de André Ventura já foi conseguido e o congresso do MEL ainda não começou: ser o centro de todas as discussões. A participação do líder do Chega — nem sequer é a primeira vez; em 2020 já tinha marcado presença no congresso do MEL — provocou um psicodrama à esquerda e à direita, que atingiu Rio, Rodrigues dos Santos, Cotrim e até Sérgio Sousa Pinto, do PS.

Tornando-se o centro da discussão política, condicionando todo o debate em torno de atuais e futuras maiorias à direita, o Chega ganha uma relevância que o deputado único que elegeu em 2019 não lhe confere no papel. Mas as sondagens e os testes das urnas nos Açores e nas presidenciais provaram que o crescimento do Chega é e tem de ser um fator a considerar.

Ventura entra neste congresso com essa vantagem teórica: se Rui Rio ainda alimenta esperanças de chegar a primeiro-ministro, sabe que, muito provavelmente, terá de lidar e negociar com o Chega. E vai, muito provavelmente, vender caro esse bilhete no carrossel: em setembro de 2020, Ventura dizia que nunca faria parte de um Governo com o PSD; em dezembro, exigia quatro pastas ministeriais; em fevereiro de 2021, pedia seis Ministérios; em maio, já exigia ser vice-primeiro-ministro.

O líder do Chega sabe que se continuar conseguir marcar mediática e politicamente, pode conseguir secar o apelo ao voto útil do PSD e as tentativas de afirmação de CDS e IL. Não hesitará em fazê-lo.

Riscos

O risco é o de que esta estratégia de tensão permanente se esgote. Apesar do bom resultados nos Açores, as presidenciais já trouxeram um sabor agridoce: Ventura teve 500 mil votos e foi segundo em 11 dos 18 distritos de Portugal Continental; mas ficou atrás de Ana Gomes e foi obrigado a demitir-se, quando chegou a dizer que seria um sinal de incompetência se tivesse menos votos do que a socialista. O fator “rejeição de Ventura” resultou.

Daí para cá, parece ter estabilizado nas sondagens (sempre na casa dos 7 e 8%, sempre oscilando entre o terceiro e o quarto lugar) e continua a manter-se confortavelmente no topo dos líderes que mais rejeição merece nos estudos de opinião, o que podem ser sinais de dores de crescimento do partido.

Depois, há outro fator: grande parte da força do Chega reside nos votos daqueles que se sentem descontentes com as respostas dadas pelos partidos tradicionais e dos que se divorciaram do sistema. Os ziguezagues de Ventura sobre o papel que o Chega pode ocupar em qualquer futura solução de poder e a experiência dos Açores — com poucos meses de existência, Ventura já ameaçou romper a coligação com o PSD e viu o partido implodir localmente  –, pode afastar parte do eleitorado que acredita que o Chega representa algo de diferente. É essa possível perceção que Ventura vai tentar travar.

João Cotrim Figueiredo

FRANCISCO ROMÃO PEREIRA/OBSERVADOR

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O grande objetivo de João Cotrim Figueiredo é tentar sobressair no meio de uma direita que em muitos momentos parece quase autofágica. PSD e CDS virados para dentro, a enfrentar os problemas internos e a lidar com as respetivas crises de identidade, e Chega cada vez mais embrenhado em polémicas dentro e fora do partido, podem funcionar como tónico.

Nessa linha, a Iniciativa Liberal tem apostado deliberadamente num crescimento sustentado. O partido sabe que não pode (ou não deve) entrar em todas as batalhas, sob pena de esgotar a mensagem e a imagem. O objetivo é crescer sem cometer erros e sem hipotecar os créditos conseguidos nas legislativas de 2019 e nas presidenciais de 2021.

Aos olhos da Iniciativa Liberal, o PSD está exaurido, o CDS está esgotado e o Chega condenou-se a ser um balão que aumenta e diminui com base em polémicas esteréis. Por outras palavras: os liberais acreditam ter uma agenda clara e um programa político facilmente identificável, o que lhes dá uma vantagem face aos adversários à direita.

Se conseguir provar isso mesmo — que a Iniciativa Liberal é uma solução e não parte ou reflexo dos problemas que a direita enfrenta –, Cotrim Figueiredo pode aproveitar este congresso do MEL para alargar a sua base de apoio. De resto, tem um conforto face a PSD e ao CDS: parecem impermeáveis ao fenómeno Chega, uma vez que alguém que seja eleitor ou militante da IL dificilmente se sentirá seduzido pelo Chega.

Riscos

Mas o ruído é mesmo o maior adversário da Iniciativa Liberal. Se a discussão sobre o futuro da direita se transformar num debate sobre o voto útil no PSD, o crescimento do Chega, a extinção do CDS e a arimética que pode ou não dominar a lógica de futuras alianças políticas, sobra muito pouco espaço para discutir ideologia, caminhos e soluções políticas diferenciadoras.

De resto, essa tensão tem sido evidente: para incompreensão de muitos à direita, a IL pôs-se de fora da grande coligação de Moedas em Lisboa para afirmar o seu próprio programa, mesmo assumindo o risco de ajudar a perpetuar o PS no poder; nos Açores, apesar de só ter aceitado assinar um acordo com o PSD e não com CDS e Chega, acabou a aparecer na mesma fotografia e por ser atingida pelas críticas dos que nunca perdoaram aquela aliança nos Açores — mesmo que o contrário significasse a perpetuação do PS no poder.

Mesmo a participação neste congresso já motivou um embaraço a Cotrim Figueiredo: Maria Castello Branco, jovem quadro do partido, decidiu cancelar a sua participação por não se sentir confortável com a presença de André Ventura no certame. Cotrim, no entanto, manteve-se como um dos oradores principais.

O líder da IL tentará que a oportunidade — mostrar a diferença entre o partido e os adversários à direita — supere o risco de ser percecionado como mais um membro de uma casa que muitos, à esquerda e à direita, consideram mal frequentada. Resta saber se o conseguirá fazer.

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