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Meghan, a duquesa de Sussex, ligou pelo menos a duas senadoras republicadas a propósito da licença parental
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Meghan, a duquesa de Sussex, ligou pelo menos a duas senadoras republicadas a propósito da licença parental

© Ana Martingo /Observador

Meghan, a duquesa de Sussex, ligou pelo menos a duas senadoras republicadas a propósito da licença parental

© Ana Martingo /Observador

A "miúda inteligente" de quem o Congresso gosta e o "casamento trampolim para uma carreira política": Qual o real peso de Meghan, a lobista?

Uns criticam o uso do "título fora do contexto", outros já comparam o seu poder ao de Bill Gates. Um lobista, um académico e uma biógrafa real analisam a influência da duquesa "com uma agenda".

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A chamada do número não identificado levantou suspeitas, mas não o suficiente para que a republicana Shelley Moore Capito a ignorasse. “Olá, senadora? Sou a Meghan, a duquesa de Sussex”, foi o que para sua surpresa ouviu do outro lado da linha telefónica enquanto conduzia. Alegadamente sem nada que o fizesse prever, a mulher do príncipe Harry ligava-lhe para defender o direito dos norte-americanos à licença parental numa altura em que o tema era (e é) tópico quente na política norte-americana. Capito (senadora pela Virgínia Ocidental) não foi a única a receber o telefonema — da lista fez também parte Susan Collins (do Maine) — tanto que o Politico escrevia nos primeiros dias do mês que uma “grande celebridade” estava a fazer lobby junto de figuras de ambos os partidos, conservadores e democratas. Tratava-se nem mais nem menos do que da ex-atriz, e a mulher que esteve no centro da última maior crise da casa real britânica, Meghan Markle.

Se dúvidas houvesse, a própria confirmou-o recentemente durante uma cimeira organizada pelo The New York Times, não sem antes explicar que, tal como no passado, também agora estava a defender aquilo que acredita ser certo. Mas ao invés de se limitar a escrever uma carta, como aconteceu quando, ainda em criança, criticou a campanha de um detergente exclusivamente voltada para a audiência feminina, Meghan pegou no telefone e simplesmente ligou “para ver se conseguia ajudar”. Para ela foi uma coisa muito “lógica” e “óbvia” de se fazer, embora as chamadas não tivessem sido “planeadas”. “Arranjo o número de telefone, ligo e tenho uma conversa.” É esperado que Meghan faça ainda mais chamadas do género.

“Arranjo o número de telefone, ligo e tenho uma conversa.”
Meghan Markle, duquesa de Sussex

Mãe pela segunda vez há sensivelmente cinco meses, Meghan garantiu em entrevista que, para ela, aquela “não era uma questão política”, mas sim humanitária, ainda que reconheça que existe “um precedente” entre a família do marido, a família real, “de não ter qualquer envolvimento na política”. Do outro lado do Atlântico, as críticas entre fontes da realeza não se fizeram esperar, com a duquesa a ser acusada de usar o seu título “fora do contexto” para fazer lobby político, até porque a “família real não tem voz na política americana”. Porque uma coisa é fazer campanha sobre questões como “o ambiente e a saúde mental”, outra é “alinhar-se com políticas”. Nos EUA, o republicano Jason Smith que representa o Missouri comentava o seguinte à publicação TMZ: “Se ela quer ser um membro da realeza, ela tem de ser um membro da realeza — não pode ter as duas coisas”.

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Já antes a duquesa tinha entrado na dimensão política quando, a propósito das últimas eleições norte-americanas que deram a vitória a Joe Biden, apelou ao voto. Não o fez sozinha: a seu lado, sentado num banco de madeira, Harry também discursou pedindo aos eleitores para “rejeitarem o discurso de ódio, a desinformação e a negatividade online”, palavras que pareceram uma declaração de interesses: a rejeição de Donald Trump e o também apoio a Biden. Mas aí o envolvimento mais direto da coroa britânica na política não era inédito. Em 2003, por exemplo, a rainha Isabel II apelou ao voto dos galeses e já em 2014, por ocasião do referendo na Escócia, alertara os eleitores “para pensarem no seu futuro”. Mas tanto nas presidenciais norte-americanas como agora, ao fazer lobby, as ações da duquesa que tem somado polémicas criaram tensões e dividiram opiniões.

Prince Harry And Meghan Markle Visit Edinburgh

Meghan Markle está a "exercer o seu direito constitucional", salienta o lobista Craig Holman

Andrew Milligan - WPA Pool/Getty Images

Meghan tão poderosa como Bill Gates? Comparação é “bastante precisa”

Ligar diretamente para senadores para fazer lobby “não é completamente incomum, acontece”, esclarece ao Observador Craig Holman, ele próprio lobista profissional. Ainda assim, a duquesa está numa posição difícil de igualar dado o “estatuto internacional” — se Shelley Moore Capito conduzia, Susan Collins estava no ginásio quando o telefone tocou. Nem Holman conseguiria tanto, admite. “Pessoas como o Bill Gates e outros com esse estatuto podem fazer isso.” A comparação “bastante precisa” entre a duquesa e ex-atriz e o milionário filantropo traduz o peso de um título real e a possível eficácia de uma destas chamadas no Capitólio dos Estados Unidos. Afinal, “toda a gente sabe quem é Meghan Markle, no Congresso e fora dele”.

Kirsten Gillibrand, que passou a Meghan os contactos diretos das duas senadores republicanas, confirmou ao Politico: “Conversei com cada uma das senadoras e disse-lhes que ela entraria em contacto, porque ela completou apenas dois dos telefonemas. Ela vai ligar para mais alguns [contactos], então estou a avisá-los com antecedência”. A senadora democrata confirmou também que a duquesa quer fazer parte de um grupo de trabalho a propósito da licença parental. “Quer isso se concretize agora ou mais tarde, ela fará parte de um grupo de mulheres que, com sorte, trabalharão juntas” no tema. Ainda antes das chamadas telefónicas, Meghan assinou uma carta aberta endereçada ao Congresso onde recordou a infância humilde para defender o mesmo tema.

Meghan Markle recorda infância humilde para defender licença parental em carta aberta

Ainda assim, esclarece o especialista em lobby Craig Holman, não é possível qualificar Meghan Markle como lobista, embora ela tenha praticado a atividade que é legalmente regida pelo Lobbying Disclosure Act (que inclui regras como “passar 20% ou mais do tempo durante um período de três meses em atividades de lobby em nome de um empregador ou cliente individual”. “O que ela está a fazer é o que qualquer cidadão norte-americano pode fazer, embora ela tenha contactos internos. Mas qualquer cidadão pode contactar senadores, membros do Congresso, e pedir-lhes para fazer algo, para apoiar algo. Muitos fazem-no. Ela está a exercer o seu direito constitucional.” E podem os telefonemas de Meghan fazer alguma diferença? “Totalmente”, atira Holman, que suspeita que o tema da licença parental possa ganhar mais adesão ou espaço de debate.

"O que ela está a fazer é o que qualquer cidadão norte-americano pode fazer, embora ela tenha contactos internos. Mas qualquer cidadão pode contactar senadores, membros do Congresso, e pedir-lhes para fazer algo, para apoiar algo. Muitos fazem-no. Ela está a exercer o seu direito constitucional."
Craig Holman, lobista profissional

No Congresso norte-americano, escreve a The Atlantic, chegou a ser ponderado discutir um projeto-lei que permitisse uma licença parental de 12 semanas, mas o tempo de duração proposto acabou por cair para quatro semanas por “hesitações de uma parte dos democratas moderados” e por “uma resistência total dos republicanos”. Neste momento, não é sequer certo que os EUA venham a ter uma licença parental de quatro semanas.

James Thurber, professor universitário na American University e autor do livro “Congress and Diaspora Politics: The Influence of Ethnic and Foreign Lobbying”, assegura que a tática usada por Meghan é frequentemente usada, embora não seja particularmente eficaz. “O lobby de celebridades é comum. Não sabemos quantas chamadas são feitas por celebridades, mas a forma como se ganha estas coisas não é através de telefonemas.” Mas olhando para trás, nem ele nem Holman se recordam de alguma vez um membro de uma família real ter feito o que Meghan fez até porque, no caso da monarquia e governo britânicos, o habitual é este tipo de contactos serem feitos por intermediários, ou outros intervenientes. “Se Meghan Markle estiver a fazer isto sozinha, significa que tem um toque muito pessoal… No Congresso gostam dela, isso joga muito a seu favor”, atira Holman.

The Duke And Duchess Of Sussex Visit One World Observatory With NYC Mayor Bill De Blasio

"O lobby de celebridades é comum. Mas a forma como se ganha estas coisas não é através de telefonemas", diz James Thurber

Taylor Hill/WireImage

Casamento real? “Um trampolim fantástico para uma carreira política”

Nenhum dos especialistas em lobby consultados quer adivinhar se Meghan aspira ou não à construção de uma carreira na política, muito embora não seja de todo incomum assistir à ascensão de celebridades rumo ao espectro político nos Estados Unidos da América — o exemplo mais imediato é, sem tirar nem pôr, o do último presidente norte-americano, Donald Trump, lembra James Thurber. É também ele quem assinala que a duquesa já antes manifestou interesses políticos ainda antes do casamento com o príncipe Harry, em maio de 2018.

Mais sustentada é a opinião de Penny Junor, conhecida biógrafa dedicada aos assuntos e vida da família real britânica, que ao Observador descreve uma “miúda inteligente” e também “muito ambiciosa”, com “uma verdadeira agenda social e política”. “Se olharmos para as palestras que ela dava, ela é articulada… É difícil de olhar para o que aconteceu [casamento real] e não tirar conclusões de que isto foi um trampolim fantástico para uma carreira política.”

"Se olharmos para as palestras que ela dava, ela é articulada... É difícil de olhar para o que aconteceu [casamento real] e não tirar conclusões de que isto foi um trampolim fantástico para uma carreira política."
Penny Junor, biógrafa real

O facto de usar o título duquesa de Sussex nos telefonemas feitos a senadoras gerou controvérsia, sobretudo em solo britânico, mas Penny Junor especula que ela talvez não tenha outro nome oficial que possa usar, já que o apelido Markle diz respeito à vida de solteira. “Seria muito difícil para ela telefonar a um senador e dizer ‘Olá, sou a Meghan’. Sinto que isto não tem sido referido.” Talvez por isso, admite, não haja qualquer quebra de protocolo, mesmo tendo sido Meghan aparentemente tão informal. “Ela é uma pessoa normal agora, pode ligar a quem quiser. Não penso que isso seja surpreendente e não penso que tenha sido a coisa errada a fazer. O que penso que tenha sido surpreendente foi o facto de ela ter conseguido os telefones privados, coisa que acho que não conseguiria se não fosse a duquesa de Sussex.”

Questionada sobre o facto de os membros da família real britânica serem tradicionalmente neutros no que à política diz respeito, diz que é provável que algumas “sobrancelhas estejam a ser levantadas” entre a realeza. “É suposto serem politicamente neutros mas, por outro lado, isto é política americana e não britânica. Diria que são sobretudo os membros ativos que devem manter-se neutros. Dito isso, não penso que Harry seja intrinsecamente uma pessoa muito política. Penso que é a Meghan que é política. Tenho a sensação que o Harry possa estar a ser, de certa forma… alguém está a puxar os cordelinhos.”

“Este casal deixou a família real porque queria sair dos holofotes, porque a sua saúde mental estava a ser afetada… Eles queriam afastar-se de tudo isso. No entanto, parece que não fizeram nada senão receber publicidade desde que estão nos EUA”, analisa a biógrafa Penny Junor, que não deixa de fazer a seguinte especulação: “De todas as vezes que há uma outra proclamação deles ou um novo podcast ou é divulgado um novo livro… suspeito que a família real sustém a respiração a pensar no que vem a seguir”.

"De todas as vezes que há uma outra proclamação deles ou um novo podcast ou é divulgado um novo livro… suspeito que a família real sustém a respiração a pensar no que vem a seguir."
Penny Junor, biógrafa real

Neutralidade política e as 27 cartas do príncipe Carlos

Quando os Sussex apelaram ao voto em setembro de 2020, Harry esclarecia a dúvida: “Muitos de vocês podem não saber que nunca pude votar no Reino Unido em toda a minha vida”. À data, a publicação Vanity Fair escrevia que era pouco usual um membro da família real britânica falar sobre as eleições de um outro país, mas lembrava que o príncipe estava agora casado com uma norte-americana e já não era um membro ativo da realeza. A afirmação deste, no entanto, destapava uma trama maior: que os Windsor proíbem-se de votar, embora não exista uma lei britânica específica que o determine. Durante o longo reinado, uma das prioridades de Isabel II tem sido manter a neutralidade política e no mesmo caminho estão Carlos e William, ainda que o ativismo ambiental do primeiro já tenha suscitado críticas por se aproximar demasiado do espectro político. Ou seja, não é apenas Meghan Markle a gerar polémica.

Rainha pressionou secretamente ministros escoceses para obter isenção em lei climática

Em julho, documentos revelados pelo The Guardian mostravam também que os advogados de Isabel II pressionaram secretamente ministros escoceses a mudar um projeto de lei de forma a isentar as terras privadas da monarca de uma iniciativa verde que prevê a diminuição das emissões de carbono — a rainha é uma das maiores proprietárias de terras na Escócia, sendo que esta isenção implicaria que fosse também a única pessoa no país sobre a qual não recairia a exigência de facilitar a construção de condutas para aquecimento de edifícios através de energias renováveis. O mesmo jornal escrevia que os advogados da monarca fizeram uso de um “obscuro” procedimento parlamentar conhecido como “consentimento da rainha”, o qual permite a consulta antecipada da legislação.

Um porta-voz do Palácio de Buckingham afirmou à data que “a casa real pode ser consultada sobre os projetos de lei a fim de garantir a precisão técnica e a consistência da aplicação do projeto à coroa, um princípio jurídico complexo regido por estatuto e lei comum. Este processo não muda a natureza de qualquer projeto de lei”. Este não é, no entanto, o único exemplo de que a rainha poderá ter tirado partido destes privilégios.

Revelada troca de correspondência entre Príncipe Carlos e Tony Blair

Anos antes, o mesmo jornal ganhou acesso a 27 cartas assinadas pelo príncipe Carlos — ao fim de uma batalha legal com o governo britânico que durou 10 anos — que mostraram como o herdeiro ao trono fez petições junto de ministros sobre assuntos variados, desde a guerra do Iraque a terapias alternativas. O The Guardian escrevia, então, tratar-se de “lobby ao mais alto nível político”. Entre 2004 e 2005, Carlos trocou frequentemente correspondência com vários ministros onde opinava ainda sobre os setores das forças armadas, agricultura e arquitetura.

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