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O secretário-geral do Partido Socialista (PS), António Costa, reage após dircursar na conferência de dirigentes nacionais e locais do partido, no Convento de São Francisco, em Coimbra, 31 de agosto de 2020. PAULO NOVAIS/LUSA
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PAULO NOVAIS/LUSA

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Costa quer ficar para gerir crise. Com a esquerda e sem Rio, o "complacente" com Ventura

Moção de estratégia global de António Costa ao congresso do PS exclui o PSD de Rui Rio de qualquer diálogo por causa da "complacência" deste com "a extrema-direita". E tem planos para lá de 2023.

Um PS a dialogar à esquerda e a rejeitar quem é complacente com a “agenda antidemocrática e xenófoba”. É desta forma que António Costa se coloca para continuar a liderar o PS, na moção de estratégia global que vai levar ao Congresso de 10 e 11 de julho, afastando o PSD de Rui Rio de conversações com os socialistas. O documento acaba de ser entregue ao presidente do partido pelo secretário-geral do PS que se posiciona para conduzir os destinos do partido (e do país) durante a crise aberta pela pandemia — leve isso o tempo que levar. Para essa resposta, no documento puxa constantemente pelo “trampolim” que o Plano de Recuperação e Resiliência pode representar, com uma menção a uma pasta que é cara à esquerda — a revisão das leis do Trabalho.

A pandemia adiou o calendário normal do congresso, que deveria ter acontecido há um ano, e também alterou o quadro político, de tal forma que se olharmos para a conclusão da última moção de Costa no partido, a de 2018, saltam à vista as diferenças face à conclusão do atual texto. Há três anos o líder apresentava-se reflexivo quanto à preparação da geração que se seguia no partido, agora, António Costa toma as rédeas para assumir os comandos do PS e do país enquanto durar a crise.

A alteração de calendário faz com que a sua liderança, que renova nas eleições internas de junho, se estenda mesmo até 2023, ano de novas legislativas (se não houver antecipações). A preparação da geração seguinte teria maior enquadramento neste congresso, mas agora o tempo é de Costa e de determinar com quem está e com quem não estará, já que no Parlamento sobrevive em maioria relativa. A pandemia parece ter mudado o horizonte político que o socialista trazia na cabeça.

E é neste cenário que define já as fronteiras políticas do PS, com quem conta para se manter à frente do Governo. A moção que foi coordenada por Mariana Vieira da Silva (braço direito de António Costa na coordenação política do Governo) determina que “o PS defende que é no diálogo à esquerda que se assegura a estabilidade e as boas políticas de que o país precisa para recuperar e garantir o futuro, no respeito pelos princípios programáticos do PS e pelos compromissos internacionais do nosso país”.

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É o regresso, numa moção, ao discurso que esteve na fundação da “geringonça”, em 2015. A preferência do PS para reforçar a sua posição parlamentar está à esquerda, desde que isso não signifique ir contra o que consta no programa com que concorreu às legislativas de 2019 e voltar a cara a compromissos internacionais — aquela página sensível entre PS e a esquerda à sua esquerda e sobre a qual as duas partes concordaram em discordar há quase seis anos.

Esta jura de fidelidade à esquerda — não sendo nova nos argumentos socialistas — surge num momento em que o Bloco de Esquerda tem cavado a distância face ao PS — o que começou no último Orçamento do Estado, o primeiro de Costa a ter o voto contra do partido liderado por Catarina Martins, e continuou na Convenção bloquista do fim de semana passado. E também é a altura em que o PCP mantém a vigilância apertada sobre cada passo da execução orçamental, tendo em conta que salvou a aprovação da proposta que o Governo apresentou em outubro com a sua abstenção, mantendo a espada constantemente sobre a cabeça do Governo. O combate eleitoral autárquico tem tudo para adensar este clima e Costa quis deixar escrito, já de antemão, quem toma como parceiros nas negociações parlamentares.

Costa está para ficar. Pelo menos, enquanto durar a crise

ANTÓNIO COTRIM/LUSA

E também deixou claro quem não toma. Rui Rio está excluído porque dialoga com o Chega. É esta a tradução desta frase, que consta na conclusão desta moção: “No quadro político em que vivemos, o PS deve ainda continuar a liderar este processo de recuperação económica e social do país, assumindo-se como um partido que dialoga com todos os setores da sociedade que defendem o aprofundamento da democracia pluralista e rejeitam a complacência da direita democrática perante uma agenda antidemocrática e xenófoba“.

O texto surge no dia seguinte ao congresso das direitas, promovido pelo Movimento Europa e Liberdade, ter encerrado e de ter contado com a participação de Rui Rio e de André Ventura, o líder do Chega. A aliança firmada entre os dois para tomar os Açores ao PS, em outubro passado, está atravessada na garganta dos socialistas que não perdem oportunidade de atirar a Rui Rio essa aproximação à extrema-direita.

Ainda recentemente, numa entrevista ao DN e TSF, o líder do PS e primeiro-ministro afirmou que “mais perigoso do que o Chega é a contaminação do PSD pelas ideias” da extrema-direita. Na moção que leva ao congresso do seu partido volta à carga ao rejeitar dialogar com a tal “direita democrática”, o PSD de Rui Rio, que é complacente com a “agenda antidemocrática e xenófoba”, o Chega de André Ventura.

Quanto ao objetivo a que o partido do Governo assume para o que resta desta legislatura (a julgar pelos calendários normais) é “liderar a recuperação económica e social do país, vencendo a crise aberta pela pandemia”. Começando pela “erradicação da pandemia” e a conclusão do processo de vacinação, e pela recuperação da economia.

Costa faz muito do que é a moção girar à volta dos Plano de Recuperação e Resiliência e da bazuca europeia. "A recuperação não se pode limitar a regressar ao ponto onde estávamos em fevereiro de 2020. Nem tão pouco a onde estaríamos se a pandemia não nos tivesse atingido. Temos de ir mais além", lê-se no documento. "O PRR tem de representar um acelerador, um trampolim, para irmos mais além e mais rápido na convergência económica e social com a União Europeia"

Para isto conta com o Plano de Recuperação e Resiliência, cujo dinheiro está para chegar e que, depois de ter chamado de “bazuca” e de “vitamina”, chama agora de “trampolim”. A moção de Costa refere que “a recuperação não se pode limitar a regressar ao ponto onde estávamos em fevereiro de 2020. Nem tão pouco a onde estaríamos se a pandemia não nos tivesse atingido. Temos de ir mais além. O PRR tem de representar um acelerador, um trampolim, para irmos mais além e mais rápido na convergência económica e social com a União Europeia”.

PS absoluto nas autárquicas e regionalização no programa de 2023

E a execução destes objetivo faz com que Costa aponte para outro plano político de peso no horizonte próximo: as autárquicas (que ainda estão por marcar mas que serão entre 14 de setembro e 14 de outubro). A fasquia é absoluta: “O PS deve assumir o objetivo de assegurar nas próximas eleições a maioria das câmaras municipais, a maioria das juntas de freguesia, a maioria dos mandatos e a maioria dos votos.” A “ambição de vitória” do partido passa pela manutenção da liderança da Associação Nacional de Municípios e da Associação Nacional de Juntas de Freguesia. Sair com várias maiorias para passar um sinal de fortalecimento absoluto do partido que está em plena gestão de uma crise económica, depois da sanitária.

Além disso, refere ainda a moção do líder socialista, o mandato que aí vem é do da “consolidação do processo de descentralização para os Municípios e áreas Metropolitanas, ao mesmo tempo que prossegue o processo de alargamento das competências das CCDRs, agora legitimadas como representantes dos autarcas das Regiões”. Assim, Costa agenda para 2024 a avaliação deste processo e assume para essa altura a “concretização da regionalização nos termos constitucionais”.

A Constituição faz a regionalização depender de um referendo (em que os votos a favor sejam maioritários) e é essa proposta que António Costa quer que o PS venha a inscrever no seu programa eleitoral de 2023. É para lá do seu mandato atual, mas, nesta altura, os planos de Costa parecem mesmo passar por aí — aliás, já o tinha ameaçado, noutro contexto social mas a pretexto do mesmo tema.

Sem areia na engrenagem com Marcelo e sem sair do mantra do costume

O assunto é bicudo, sobretudo quando em Belém está um Presidente da República pouco dado a esta reforma concreta. Ainda assim, qualquer eventual diferendo pode estar ultrapassado. Depois de Marcelo Rebelo de Sousa já te demonstrado no passado algum desconforto face à pressa de António Costa na regionalização, nas últimas presidenciais já assumiu que “da parte do Presidente da República não há nem o poder nem a intenção de exercer o poder, criando obstáculo a que avance um referendo para a regionalização ou que avance uma revisão constitucional que altere o regime que existe, suprimindo [a exigência de] referendo”.

A relação entre os dois tem sido declarada como boa por ambas as partes e António Costa, na moção ao Congresso, aproveita para recordar que foi “a estreita cooperação institucional” entre órgãos de soberania que foi “absolutamente estruturante na forma como o país combateu a pandemia”. Permitiu, lembra o primeiro-ministro que sabe ter uma crise económica às costas, um “clima de paz social” num período de “indiscutível excecionalidade”.

O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa (D), conversa com o primeiro-ministro, António Costa, após a cerimónia de reinauguração das instalações do Supremo Tribunal de Justiça, em Lisboa, 13 de maio de 2021. MIGUEL A. LOPES/LUSA

Costa saúda a cooperação com Marcelo. É para continuar

MIGUEL A. LOPES/LUSA

É um desejo misturado com um aviso para o Presidente da República com quem António Costa coabita institucionalmente há quase cinco anos e cuja habilidade política conhece, bem como o apreço de Marcelo pela estabilidade governativa.

Se esta é uma linha que quer manter nos carris, há outra que também dali não sairá. A posição do PS em matéria de justiça — entenda-se: em matéria de caso Sócrates e o julgamento que vai seguir-se — continuará no mantra do costume. “Respeito pela separação de poderes face ao poder judicial”, fica escrito na moção que valerá para os próximos dois anos.

Rever leis laborais e confiar no PRR

Na parte mais programática da moção, Costa mostra confiança absoluta no “trampolim” que o dinheiro europeu que virá com o PRR — que quer aprovado até junho — poderá representar para a recuperação do país. As menções, a acompanhar os planos do PS (que aqui se confundem com os do Governo) são constantes. Começam logo quando o documento se foca na necessidade de erradicar a pandemia para se poder concentrar no futuro, mas também na necessidade de, a par disto, “preparar o nosso SNS para o futuro“: apostar nos cuidados primários, “completar” a rede de cuidados continuados integrados e de cuidados paliativos, desenvolver “respostas de proximidade” incluindo na saúde mental e reforçar os sistemas de informação são os objetivos. Tudo mencionando o investimento de mais de 1.300 milhões de euros previsto no PRR para estas áreas.

As menções continuam quando fala numa segunda prioridade, a de “assegurar a recuperação económica e social”: o PRR dedica mais de 4.900 milhões de euros “diretamente para a redução das vulnerabilidades sociais”, muitas delas expostas ou exacerbadas pela pandemia. Em resumo, prossegue o documento na parte das prioridades gerais, os objetivos que o PS tinha fixado para esta década — reduzir desigualdades e pobreza, progredir na agenda climática, investir na transição digital, responder ao desafio demográfico — ainda são válidos e tornaram-se até mais relevantes com a crise… e mais acessíveis com o dinheiro do PRR: “Pelo seu volume e natureza extraordinária, impõe-nos uma enorme responsabilidade. Temos de ir mais rápido e mais além na nossa ambição de convergência”. Ou seja, “o PRR é um acelerador, um trampolim do nosso desenvolvimento”.

Partidos de esquerda podem gostar da referência à pasta laboral, mas tudo depende da concretização

JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

O centro dessa recuperação, considera Costa, deve ser “o emprego”. É por isso que nesta moção se compromete a “combater todas as formas de instabilidade laboral” (combater abusos no trabalho temporário, falso trabalho independente e informalidade nas relações laborais”, garantindo que “o PS deve assumir a revisão da legislação laboral” para regular as novas formas de trabalho. Devem ainda ser concluídas as discussões na concertação social, incluindo sobre um acordo para a competitividade e rendimentos, “de forma a concretizar um caminho sustentado de aumento dos salários que vá além do salário mínimo”, particularmente para os jovens. Em teoria, um caminho que agradará à esquerda; na prática, e tendo em conta que o BE e PCP já criticaram as intenções do Governo por ficarem aquém do desejado pela esquerda — nomeadamente sem revogar as leis do tempo da troika –, logo se verá se há espaço para entendimento.

O foco nas políticas locais, à beira das autárquicas

Toda a segunda parte do documento se concentra na forma como a política local pode responder a estes desafios e executar as soluções propostas para o PS nestes eixos — uma “reflexão” particularmente importante em ano de autárquicas.

Desde logo, há a referência à governação local, com o objetivo de reforçar as CCDR e em 2024 fazer o tal balanço que levará a um “debate público nacional alargado” sobre a “concretização da regionalização”. Até porque “as situações de calamidade” terão deixado patentes as “lacunas de coordenação” dos serviços desconcentrados.

A moção aponta para o objetivo de promover um "debate alargado" em 2024 sobre a concretização da regionalização. Marcelo era contra, mas diz que não será obstáculo

A moção define depois, no tópico sobre alterações climáticas, que as autarquias socialistas devem criar unidades e pelouros específicos para seguir estas matérias; a nível mais prático, devem apostar em políticas como a construção de casas eficientes ou a promoção da instalação de painéis fotovoltaicos e solares. Isto em articulação com o incentivo do uso de bicicletas e o reforço de transportes públicos em territórios de baixa densidade. A moção defende ainda uma melhor gestão dos recursos hídricos e uma promoção de maiores espaços verdes, assim como da reciclagem logo na origem.

A rejeição de “visões xenófobas” e o Simplex local

O documento dedica-se depois ao desafio da demografia, de novo aplicado às políticas locais (e com um lembrete sobre os fundos do PRR para respostas sociais, 800 milhões): aqui, defende-se que a natalidade não será uma solução única e que se deverá por isso promover uma política de regresso de emigrantes e de acolhimento de imigrantes de forma regulada. O “investimento captado”, defende a moção, “promove oportunidades de emprego estável”, e deve ser acompanhada por uma fixação de profissionais dos serviços públicos nesses territórios. Nos territórios de baixa densidade há uma especial preocupação com uma prioridade que é geral: “apoiar e facilitar” o acesso dos jovens ao mercado de habitação, particularmente no arrendamento. Ainda neste tema, destaque para a “rede de creches e de pré-escolar” para permitir que os pais consigam fazer uma melhor conciliação entre a vida pessoal e profissional, embora sem adiantar se haverá medidas concretas nesta matéria, como a esquerda tem reclamado.

Quanto à imigração, a moção divide-se em dois pontos: a necessidade de promover migração “ordenada, segura e regular”, com “informação sobre direitos e deveres” e respostas como o ensino da língua portuguesa, a que se deve seguir a participação cívica e política. “Nas autarquias socialistas, os imigrantes serão sempre vistos como pessoas com direitos”, estabelece a moção. “É também aqui que o PS rejeita visões xenófobas e egoístas em relação aos imigrantes que procuram no nosso país uma vida melhor, como tantas vezes os portugueses fizeram no estrangeiro”.

O penúltimo ponto da moção é dedicado ao objetivo da transição digital — de novo, foco no “vasto conjunto de investimentos” que o PRR trará neste sentido. Nas autarquias, devem servir para aumentar a transparência das tomadas de decisão a nível local, familiarizar os estudantes com as ferramentas digitais — mas também os cidadãos mais velhos e os imigrantes, que podem usá-las para se integrarem com mais facilidade–, investir em polos de inovação e cidades inteligentes e num novo Simplex local, reduzindo “ao mínimo” licenças e processos burocráticos “que criem custos ou gastos desnecessários de tempo”.

O último ponto foca-se no combate às desigualdades (5 mil milhões do PRR para vulnerabilidades sociais) e na aposta em dinamizar as redes sociais locais, articular os cuidados de saúde (com respostas para os cuidadores informais, área em que tem havido queixas sobre os insuficientes ou atrasados apoios do Governo), e fomentar políticas locais pela igualdade de género. Em ano de autárquicas, Costa mostra aos autarcas as prioridades que podem ajudar a executar — e o dinheiro que será destinado a isso mesmo.

Texto atualizado às 19h36.

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