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Na Arábia Saudita não há só Ronaldos e na 3.ª Divisão também se vive bem: "Se marcares golo e ganharmos, damos-te 1.820 euros"

Jogadores do terceiro escalão do futebol saudita destacam profissionalismo do campeonato. Salários não são iguais ao de Ronaldo, mas estão ao nível do melhores clubes da Primeira Liga em Portugal.

De partilha em partilha, faz-se nas redes sociais um processo de recrutamento de jogadores de futebol para a a Arábia Saudita. Os interessados em preencher as vagas disponíveis para todos os setores do campo devem enviar o currículo e um vídeo para o anunciante. Os selecionados, diz a publicação, candidatam-se a um salário mensal entre os 2.750€ e os 3.770€. “Isso não é a realidade”, conta ao Observador Rafa Miranda, português formado no Varzim e no Rio Ave que esta temporada alinhou no Al-Najma, clube do terceiro escalão do futebol saudita. “Esses valores são muito inferiores aos que se praticam”, garante.

Nem todos os jogadores na Arábia Saudita têm contratos de 200 milhões de euros por ano como é privilégio de alguns. A contratação de nomes como Cristiano Ronaldo ou Karim Benzema também trouxe problemas aos clubes dos escalões inferiores. Rafa Miranda tem feito papel de consultor ao receber chamadas de colegas portugueses desiludidos com as propostas que lhe chegam vindas do país. “Em relação ao Ronaldo e aos 200 milhões e essas coisas todas, isso também veio complicar muito a vida aos clubes sauditas. Agora, os jogadores querem ir para lá e acham que todos podem ganhar valores idênticos ou próximos aos do Ronaldo. Isso não é a realidade. Isso são casos extraordinários. Os atletas não têm muita noção disso. Quando percebem o orçamento das equipas e as ofertas que recebem, ficam um bocadinho de pé atrás, porque não tinham noção que nem todos os clubes podem pagar valores exorbitantes”.

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Como sénior, em Portugal, Rafa Miranda representou o Vilaverdense

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O Fundo Estatal de investimento saudita tem feito uma aposta no futebol desde a base até ao topo. Além de o Estado ter comprado os quatro principais clubes da Primeira Divisão, o Al-Ittihad, o Al Ahli, o Al Nassr e o Al Hilal, o governo também adquiriu dois clubes da Segunda, da Terceira e da Quarta Divisão. Desta forma, explica Rafa Miranda – que passou antes por países como Roménia, Omã e Rep. Checa –, os clubes são uma cópia uns dos outros. “Em termos de infraestruturas, é quase um perfil padronizado. Quase todas as infraestruturas dos clubes são muito idênticas. Foi tudo feito pelo Estado. Cada clube tem a sua zona. Depois, é um local fechado, onde há o campo principal, os campos anexos para treino, um pavilhão multidesportivo e uma piscina. Todos os clubes têm estas infraestruturas”. Ao mesmo tempo, também a formação começa a ganhar peso nos plantéis.

Thales Lima deixou a Primeira Divisão da Líbia – onde regressou entretanto – para rumar à Arábia Saudita, ao Wej SC, equipa também ela do terceiro escalão do futebol saudita e onde o brasileiro esteve seis meses. “Têm tudo, do departamento médico para cuidar das lesões ao o campo de treinos que é bom. O material de trabalho é muito bom. A equipa técnica, que normalmente é estrangeira, é boa”, explica o jogador, recordando a chegada à Arábia Saudita. “Às vezes, as pessoas pensam que por ser uma Terceira Divisão da Arábia não tem tantos recursos, mas é muito profissional. Dão todo o apoio aos jogadores. Quem é estrangeiro pode levar a família e disponibilizam um carro. Fiquei surpreendido quando cheguei lá, porque estava na Primeira Divisão da Líbia e não tinha nada disso. Fui para a Terceira Divisão da Arábia à espera mais ou menos da mesma coisa”.

"Os jogadores querem ir para a Arábia Saudita e acham que todos podem ganhar valores idênticos ou próximos aos do Ronaldo. Isso não é a realidade".
Rafa Miranda

A narrativa começa a mudar. “Sempre foi um sonho jogar na Arábia Saudita”, diz Thales. Antes, assinar contrato com uma equipa da Liga dos Campeões era um requisito necessário para um jogador terminar a carreira em pleno. Agora, os futebolistas encontram outros caminhos para a realização pessoal. Em termos económicos, compensa jogar no país do Médio Oriente, mesmo que se trate da Terceira Divisão. “De longe, a melhor condição de vida que tive foi na Arábia Saudita. O clube onde mais consegui ter retorno financeiro foi o Wej SC. Quando assinas o contrato, tens um bónus de assinatura. Eles são muito corretos em relação a isso”, continua. “Dão prémios extra para jogadores estrangeiros, dão bónus por golos. ‘Se marcares golo hoje e ganharmos, damos-te 1.820 euros’. É assim que funciona na Arábia Saudita”.

Thales considera que o desenvolvimento do futebol saudita vai melhorar a competitividade dos escalões inferiores. “Jogadores que normalmente não têm um nível tão alto no seu país e que procuram jogar em países como a Arábia Saudita, vai ser mais difícil. Clubes das divisões inferiores vão procurar contratar jogadores com um status um pouco maior. Assim, o nível vai crescer”. No entanto, há aspetos em que, inclusivamente, as divisões inferiores da Arábia Saudita já ultrapassam o topo do futebol português. “Continuam a pagar bem em comparação com as ligas portuguesas”, revela Rafa Miranda. “Os salários rondam valores que em Portugal só conseguem ser pagos por clubes de Primeira Liga e nem todos”.

Ainda assim, há aspetos bastante diferentes em relação ao futebol nacional. “Os sauditas interrompem jogos para ouvirem a oração. O horário é mais ou menos às 16h20. Eles têm a oração falada que sai para a cidade inteira. Eles param tudo o que estão a fazer para escutarem a oração, inclusivamente os jogos”, recorda Thales. “Fomos jogar um jogo amigável contra o Al Wehda, da Primeira Divisão [equipa do lusodescendente Gerson Rodrigues]. Era na cidade deles, que é em Meca. Quando começou a oração, interromperam o jogo por mais ou menos dez minutos. Na Primeira Divisão não pára, mas nas divisões inferiores se o jogo estiver a decorrer no horário da oração, interrompem”.

O futebol saudita tem quatro níveis. A Terceira Divisão é designada por Second Division. A prova é constituída por dois grupos, sorteados aleatoriamente, e não seguindo a lógica da proximidade geográfica como acontece em Portugal. Para realizar um jogo pode ser preciso apanhar dois voos e ainda fazer duas horas de autocarro numa logística exigente. O Al-Najma de Rafa Miranda sagrou-se campeão e foi promovido.

O investimento da Arábia Saudita no futebol tem um objetivo bem delineado que passa pela organização do Mundial. O pensado era que isso acontecesse em 2030, mas o país deixou a ideia cair por terra, visto que abandonou a corrida ao Mundial desse ano — onde Portugal, em conjunto com Espanha e Marrocos, continua envolvido. A contratação de jogadores de topo e consequente desenvolvimento das ligas internas visava funcionar como um holofote que apontasse para o Médio Oriente. O investimento estrutural do Estado saudita, contemplado na Visão 2030, o plano de desenvolvimento económico do país, serve também esse propósito. Mesmo que, para já, a ideia do Mundial tenha ficado na gaveta, os milhões despendidos podem vir a ter retorno mais tarde.

O exemplo do golfe, a Visão 2030 e a mudança de paradigma com Rúben Neves. O que é que a Arábia Saudita quer do futebol?

O Mundial-2034 passa a ser um alvo e, quem sabe, a Arábia Saudita até já tenha condições para uma organização a solo nessa altura. “A Arábia Saudita está com grande vigor e estamos em processo de coordenação com as demais confederações e a FIFA para sediar o Mundial em 2030 ou 2034, de acordo com todos, para que, uma vez enviada a candidatura, tenhamos a confiança em pelo menos 90%”, explica o presidente da Confederação Asiática de Futebol, Salman bem Ibrahim al-Khalifa, em declarações que abrem o leque de hipóteses para que o país possa ficar responsável por uma grande competição.

A Arábia Saudita já garantiu a Taça da Ásia em 2027 e está a tentar a organizar a Taça Asiática feminina em 2026. O presidente do comité de marketing da Confederação Asiática de Futebol, Hafez Al-Medlej, garante que o desenvolvimento do futebol da Arábia Saudita não é uma experiência passageira como aconteceu na China. “O futebol lá não é popular. Na Arábia temos um projeto de Estado que não se vai limitar às quatro grandes equipas, mas sim a todas, porque a paixão dos sauditas por futebol não tem limites”.

Arábia Saudita continua a ser caminho para as estrelas (mais do que se pensava)

Os clubes que são controlados pelo Fundo Estatal de investimento saudita têm estado particularmente ativos no mercado e já adicionaram aos seus quadros nomes de relevo. Poucos dias depois de ter estado em Lisboa a representar o Senegal num particular contra o Brasil e ter sido abraçado e requisitado para autógrafos e fotografias por parte dos jornalistas do país africano após a conferência de imprensa ter terminado como se de um autêntico herói nacional se tratasse, Kalidou Koulibaly viajou para a Arábia Saudita. Os rumores que ligavam o central ao Al Hilal acabaram por confirmar-se numa transferência em que o clube saudita pagou cerca de 25 milhões de euros ao Chelsea pelo jogador.

“Não posso negar. Com este dinheiro poderei ajudar toda a minha família a viver bem, desde os meus pais aos meus primos”, explicou Kalidou Koulibaly em relação ao salário avultado. “Também poderei investir mais nas atividades da minha associação no Senegal. Já começámos a construir uma clínica pediátrica na aldeia onde os meus pais nasceram e casaram. Tenho muitos projetos para ajudar os jovens”.

“Não posso negar, com este dinheiro posso ajudar a minha família.” Koulibaly reconhece que os milhões fizeram diferença na ida para a Arábia

Quem também deixou a Liga Inglesa e rumou ao Al Hilal foi Rúben Neves. O médio português despediu-se do Wolverhampton a troco de 55 milhões de euros, assinando um contrato válido até 2026. No adeus a Inglaterra, o médio recordou o clube que abandonou enquanto capitão. “Wolves, seis temporadas, 253 jogos, vencedores do Championship, cinco anos de futebol na Premier League, uma meia-final da FA Cup, uma aventura europeia e algumas grandes vitórias e milhares de memórias que durarão para sempre. Que jornada inacreditável”, recordou.

Ao Al Ahli chegou outro jogador proveniente da Premier League. Édouard Mendy deixou o Chelsea, após uma temporada de pouca utilização em Inglaterra, num negócio que pode atingir os 20 milhões de euros.

O Al Ittihad garantiu a contratação de outro antigo jogador do Chelsea. N’Golo Kanté é reforço da equipa campeã saudita. O francês juntou-se ao compatriota Karim Benzema que assumiu que a mudança para a Arábia Saudita foi influenciada pela religião.”Sou muçulmano, vou para um país ideal para mim e para a minha família. Meca fica muito perto. Sou crente, é algo muito importante para mim. Estou no meu lugar, vou sentir-me melhor”. Jeddah, a cidade, onde se encontra sediado o Al Ittihad, vai receber o Mundial de Clubes 2023.

Quanto à equipa de Cristiano Ronaldo, o treinador português Luís Castro está prestes a trocar um possível título no Brasil ao serviço do Botafogo pelo Al Nassr. Hakim Ziyech tinha tudo acordado para rumar a Riade, mas chumbou nos exames médicos devido a um problemas no joelho. Também as negociações que levariam Marcelo Brozovic para o Al Nassr caíram à última da hora

 
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