O presidente do Millennium BCP recebeu em Lisboa, nos últimos meses de 2019, uma delegação de representantes do fundo Carlyle Group, uma das maiores gestoras de investimentos do mundo. De acordo com a informação obtida pelo Observador, os investidores nova-iorquinos quiseram falar com o BCP sobre o Novo Banco e sobre como poderiam participar numa eventual consolidação entre as duas instituições – um encontro que não foi comunicado ao Banco de Portugal.

Uma fusão entre o BCP e o Novo Banco – ou outro tipo de operação que resulte na junção dos dois bancos – tem sido apontada como um dos cenários mais prováveis para o futuro do herdeiro do BES, que já regressou aos lucros e está à espera que a Comissão Europeia confirme formalmente que foi concluído com sucesso o plano de reestruturação do banco.

A partir desse momento, a perceção que existe no setor é que irá acelerar o processo de venda do Novo Banco, por parte do acionista maioritário Lone Star. Uma das razões para a saída precoce de António Ramalho, aliás, terá sido a de que o próprio não quereria estar na liderança executiva do banco nessa próxima fase, a da venda da instituição.

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O fundo Carlyle é um private equity multinacional que gere cerca de 325 mil milhões de dólares em ativos, já fez vários investimentos em Portugal nos últimos anos – embora em outros setores que não a banca/finança. Entre os mais recentes estão a compra do Penha Longa Resort (em parceria com a Explorer Investments) e o investimento na portuguesa Logoplaste, empresa da qual foi acionista maioritário entre 2016 e 2021.

Banco de Portugal não foi informado da reunião

Em cima da mesa poderia estar uma eventual compra pelo Carlyle de uma posição no BCP – uma participação existente ou através de aumento de capital para comprar o banco que foi criado após a resolução do BES – ou, em alternativa, uma compra do Novo Banco pelo Carlyle com vista a, depois, avaliar uma fusão entre os dois bancos.

De acordo com a informação obtida, após essa reunião, no final de 2019, não houve desenvolvimentos concretos, o que também poderá ter acontecido devido ao facto de a pandemia de Covid-19 ter surgido logo a seguir, no início de 2020, introduzindo uma enorme dose de incerteza na economia mundial.

Embora, segundo apurou o Observador, o Banco de Portugal não tenha sido informado desses contactos entre os investidores nova-iorquinos e o Millennium BCP, ficou claro que o Carlyle tem no seu radar o tema da possível consolidação no setor bancário português.

O Observador não conseguiu confirmar se os mesmos representantes do fundo Carlyle também estiveram reunidos, na altura, com responsáveis ligados ao Lone Star – encontros que, a acontecer, faria sentido que fossem feitos em Nova Iorque, não em Lisboa.

BCP “recebe regularmente investidores, por sua iniciativa”

Sem comentar “eventuais contactos com investidores em concreto”, fonte oficial do BCP confirmou que o banco “recebe regularmente investidores, fundos e bancos de investimento os quais abordam por sua iniciativa múltiplos aspetos que na respetiva opinião podem ser relevantes para o banco”.

Mais, acrescenta fonte oficial, “ao longo dos últimos anos o tema do eventual interesse do BCP em operações de consolidação no mercado nacional foi por diversas vezes objeto de contactos por essas entidades, sendo que o BCP, conforme o CEO do banco, Miguel Maya, já salientou e enfatizou, não está a considerar qualquer operação de aquisição de bancos, quer em Portugal quer no estrangeiro”.

Por outro lado, o BCP lembra que Miguel Maya “também já transmitiu que é obrigação de uma gestão executiva diligente analisar eventuais oportunidades que possam surgir no mercado e que possam criar valor, sendo que, reitera-se, o crescimento perspetivado para o BCP assenta exclusivamente na via orgânica e não contempla qualquer aquisição”.

Também foram enviadas perguntas para fonte oficial do Carlyle Group, que não respondeu até ao momento às questões do Observador sobre se mantém interesse em olhar para uma eventual fusão entre o Novo Banco e o Millennium BCP.

Numa eventual fusão entre o Novo Banco e o Millennium BCP, possibilidade da qual se fala praticamente desde a resolução do BES, o possível envolvimento de um fundo norte-americano levantaria sempre, também, questões geopolíticas – isto porque o Millennium BCP tem como principal acionista a chinesa Fosun, com 29,95% do capital.

Os angolanos da Sonangol têm mais 19,49% do capital do banco, um acionista que em comparação com 2019 estará em condições financeiras mais favoráveis dada a escalada dos preços do petróleo nos últimos meses. Porém, o BCP já tem na sua estrutura acionista um grande fundo norte-americano: o BlackRock, que porém só tem 2,68% do BCP (de acordo com os últimos dados disponíveis, que têm cerca de um ano).

Do lado do Novo Banco, depois do anúncio de que António Ramalho deverá sair até agosto, já foi anunciado que o próximo líder da comissão executiva é um estrangeiro que já integra neste momento a cúpula da instituição financeira: Mark Bourke.

O banqueiro irlandês já está na instituição desde 2019, quando assumiu o cargo de administrador financeiro (CFO). Com 55 anos, é descrito pelo Conselho Geral e de Supervisão  do Novo Banco (dominado pelo fundo Lone Star) como “o candidato ideal” para “liderar o Novo Banco nesta próxima fase de desenvolvimento”.

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O Novo Banco fechou o exercício de 2021 com lucros de 184,5 milhões – o que não impediu a instituição de fazer uma nova chamada de capital ao Fundo de Resolução, de 209,2 milhões de euros. Um pedido de injeção que, em linha com a recusa inicial pelo Fundo de Resolução, ainda não foi satisfeito, segundo informações do Observador.