Se bem compreendo os especialistas, um voto no Chega é um voto no PS. E é sabido que um voto no PSD é um voto no Chega. E que um voto na IL é um voto no BE. E que um voto no CDS é um voto no PSD. Com jeito, ainda se vai apurar que um voto no PPM é um voto no PAN, um voto no Aliança é um voto no Livre, um voto no Nós, Cidadãos é um voto na LCI (que faleceu em 1978), um voto no Ergue-te é uma impossibilidade estatística e os votos em geral vão desaguar no “radical” Pedro Passos Coelho, que infelizmente não concorre.

Citando o transeunte médio, é complicado. Antigamente, as pessoas votavam na certeza de que o “X” que riscavam no boletim correspondia ao partido representado ao lado do “X”. Com maior ou menor entusiasmo, faziam uma escolha. Agora têm de fazer contas, reflexões intrincadas acerca das verdadeiras consequências dessa escolha, as quais pelos vistos nunca são as que se pensa.

A culpa é do dr. Costa e da artimanha que concebeu em 2015, ano em que pela primeira vez um partido derrotado conseguiu formar governo. Até então, as coisas eram simples. Até então, por estranho que hoje pareça, o partido ou coligação que ganhava as eleições era o partido ou coligação que ganhava as eleições. E que – pasme-se – governava, fosse por maioria directa, mediante a ajuda de queijos ou, enquanto podia, perante um parlamento hostil. Em 2023, o destino da “vontade popular” é incerto como as propriedades das partículas de Heisenberg, dependente de uma retórica nebulosa em volta de “pré” e “pós”-acordos, de pactos e rejeições de pactos, de juras escusadas, de garantias precoces, de promessas de mão no peito, enfim de interditos que o PS decretou.

Curioso é o facto de semelhante enrodilhado apenas afectar os partidos à direita do PS. Do PS para lá, o assunto está perfeitamente esclarecido, e todos os votos à esquerda vão parar ao mesmo lugar: a esquerda, unida no sonho de nos transformar numa sucursal de Caracas. Desprovido de escrúpulos e constrangimentos, o PS mostra-se disposto a governar caso ganhe, caso perca, caso careça de se juntar a leninistas (além dos leninistas que prosperam no PS) e, se necessário fosse, a canibais.

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À direita, as mesuras imperam. Conforme os seus representantes não se cansam de lembrar, o PSD só governa se for o mais votado em Março. O Chega só permite um governo do PSD se participar directamente nele. A IL e o PSD só toleram entendimentos que excluam o Chega. Quanto ao CDS, o CDS contenta-se em eleger um deputado e, se a palavra se aplica, ressuscitar. O PS tenciona manter o poder a qualquer custo; a “direita” parece relutante em conquistá-lo.

A situação é desigual em desfavor da “direita”. E sobretudo em desfavor do país. Recapitulemos: económica, moral e institucionalmente o país está de rastos graças a trinta anos quase ininterruptos de manigâncias socialistas, os últimos oito particularmente destrutivos e impunes. Renovar a tendência, por um, dois ou setenta e sete mandatos, para cúmulo sob a orientação de uma nulidade perigosa como o jovem Pedro Nuno, já é forçar a nota. Seria preferível referendar de uma vez o rebentamento figurativo e literal desta amada, e pouco estimada, pátria.

O dilema é básico, basta trocar a disjunção pela conjunção no velho dichote revolucionário: socialismo e morte. Ou, no mínimo, socialismo e incompetência, corrupção, leviandade, opressão e censura. E pobreza, a imensa pobreza que, acima da propaganda e à revelia das negociatas, asfixia uma percentagem crescente da população. Ou se prossegue o desastre ou se esboça uma alternativa, débil que seja.

A alternativa compete à “direita”, que presumivelmente mandará no Parlamento. Por mim, não estou demasiado interessado no que separa PSD, Chega, IL e CDS. Interessa-me o que os devia unir. Na verdade, só precisam de concordar num ponto, um pontinho evidente e decisivo: a urgência em enxotar o socialismo. Também não me importam os procedimentos logísticos, na forma de coligações assumidas, contradições flagrantes, combinações secretas ou concurso de sapos engolidos. Importa-me, a mim e espero que a uma quantidade razoável de portugueses, que, dê por onde der, os partidos da “direita” arranjem maneira de o jovem Pedro Nuno não se tornar o próximo primeiro-ministro.

Antes de 10 de Março, é até legítimo que cada partido da “direita” exalte ocasionalmente as respectivas especificidades e condene discretamente as especificidades dos vizinhos. A 10 de Março, porém, convirá perceber que as cedências mútuas são um custo diminuto se comparadas com o preço de se prolongar e agravar a agonia em curso. Os “princípios” são muito lindos mas prejudiciais se favorecerem o PS e os compinchas, que não têm nenhuns – e os fins ameaçam ser trágicos. Tudo somado, o melhor é ignorar os especialistas e votar em quem quisermos. Pelo sim, pelo não, é preferível que os eleitores sejam responsáveis. Depois se verá se os partidos da “direita” o são.