Eu ia escrever sobre o Prédio Coutinho. Ia sugerir que se convidasse Sérgio Godinho para dar uns retoques na “Liberdade”, versão Viana do Castelo. Parece que, no Minho, “Só há liberdade a sério quando houver / A paz, o pão / habitação / desde que o imóvel não seja um aleijão / nesse caso, tudo bem, vem parar ao meio do chão”. Se há artista com capacidade para torcer a métrica de uma música e enfiar o que quiser lá para dentro, é Sérgio Godinho. E eu já tinha uma data de dicas para o Sérgio adaptar aquele hino revolucionário à situação actual. Por exemplo: “A sede de uma espera só se estanca na torrente / A não ser no prédio Coutinho, onde cortaram a água / Mas como o governo é das esquerdas, tal atitude é decente”. Ia ser uma crónica bem catita.
Infelizmente, o tema desapareceu do espaço mediático. Foi substituído pela polémica à volta do texto de Maria de Fátima Bonifácio. (Abro este parêntesis para a execrar publicamente, como todas as pessoas de direita obrigatoriamente têm de fazer, se não querem ser consideradas nazis por gente que, curiosamente, às vezes faz essas avaliações enquanto enverga uma t-shirt do Che Guevara. MFB fez umas generalizações e, por isso, generalizou-se que qualquer pessoa que com ela tenha a mínima afinidade intelectual é culpada por associação).
O grande erro de MF Bonifácio (pessoa que, sublinho, abomino e de quem repudio tudo o que escreve, seja artigos académicos, crónicas nos jornais ou recados para a mãe) foi não ser de esquerda. O segundo, foi ter sido factualmente incorrecta e logo desmentida pela realidade. Bonifácio (que, lembro, esconjuro e decreto que lhe salguem o útero, para que não nasçam Bonifacinhos racistas) disse que os africanos não fazem parte da Cristandade e, passados dois dias, Mamadou Ba veio contradizê-la ao demonstrar que está perfeitamente integrado na cultura desse momento-chave da Cristandade que é a Inquisição. O nosso Torquemada dos Trópicos apareceu logo a exigir o respectivo auto-de-fé. Maria de Fátima Bonifácio (que, recordo, não conheço pessoalmente, mas sou amigo de uma pessoa que um dia esteve numa festa dada por uma rapariga que em tempos namorou com o filho da irmã da antiga professora primária do sobrinho do homem que arranja o frigorífico de casa do cozinheiro do restaurante predilecto de Bonifácio. Obviamente, já cortei com essa personagem repelente), também exclui os africanos da herança da Revolução Francesa e, azar dos azares, saiu-lhe ao encontro um jacobino à antiga, o Fouché de Dakar.
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