Sempre que defendia as quotas para a administração pública, governo e listas eleitorais, quem não concordava usava o argumento estafado e profundamente intelectualmente preguiçoso do mérito: que as pessoas deviam ser escolhidas em função do mérito, não do sexo. (E deixavam subentendido, muitas vezes com pouca subtileza, que as mulheres não eram escolhidas, antes das quotas, por não terem tanto mérito como os sortudos eleitos.)
Eu ria-me, claro. Ou não, porque às vezes a desonestidade intelectual e a má-fé do argumento era tão gritante que nem servia para risota. Porque, bem, toda a gente sabe como são feitas as escolhas políticas. Mérito (no sentido de competência e capacidade de análise e concretização) é um atributo que vem no fim de uma lista onde constam características mais importantes como ‘afinidade ideológica’ e ‘lealdade política’ (no lado benigno), ‘devo-te um favor’, ‘apoiaste-me, agora pago-te com uma nomeação’, ‘preciso de controlar a tua fação’, ‘fazes muito barulho mediático ou no partido e quero calar-te’, ´és um arruaceiro traiçoeiro e quero controlar-te’ (no lado maligno) e outras que tais.
Esta singela realidade ‘do mérito’ não surgiu apenas agora. Sempre esteve lá para quem quisesse ver. Em todos os partidos. O PS simplesmente lhe juntou um novo critério de seleção para cargo político: ser familiar de alguém com (ainda) mais poder.
Este artigo é exclusivo para os nossos assinantes: assine agora e beneficie de leitura ilimitada e outras vantagens. Caso já seja assinante inicie aqui a sua sessão. Se pensa que esta mensagem está em erro, contacte o nosso apoio a cliente.