O marketing pessoal é, muitas vezes, visto com maus olhos, como ostentação e algo demasiado egoísta. Seja por questões culturais e de educação, que nos ensinam que a modéstia é a maior virtude, seja pelas más experiências passadas, onde alguém chegou a parecer arrogante, ou por outra situação qualquer, muitos acreditam que apenas o seu trabalho deve falar por si. Mas numa era em que somos bombardeados com informação a toda a hora, será que devemos mesmo deixar as nossas conquistas na sombra?

Quando compramos um artigo, analisamos todas as características e mais algumas, fazemos comparações e validamos a opinião de outras pessoas que adquiriram um artigo semelhante. É algo que tem um papel fulcral na decisão da compra. Se tivessem na vossa posse um produto único, iriam sentir-se mal por publicitá-lo? Não iriam querer que o mundo soubesse das suas características únicas e benefícios? Pois bem, a verdade é que na construção de uma carreira, nós somos o nosso principal produto, e se queremos progredir, então temos de nos promover.

Estudos conduzidos por Michelle C. Haynes e Madeline E. Heilman demonstram que no caso das mulheres o cenário ainda é menos positivo. As mulheres tendem a ter mais dificuldade em fazer brilhar as suas conquistas visto que são, muitas vezes, consideradas mais altruístas e empáticas no trabalho. Estão mais dispostas a ajudar, a investir o seu tempo nos projectos dos outros sem esperar nenhum reconhecimento por isso.

Outro estudo, de Victoria L.Brescoll e Eric Luis Uhlmann (2008), demonstra que, ao contrário dos homens, quando as mulheres comunicam de forma directa e assertiva perdem credibilidade dos seus pares. Isto corrobora outros estudos que concluíram que uma comunicação mais directa e concisa pode prejudicar as mulheres, pois podem ser vistas como ditadoras e “mandonas”.

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Muitos destes estereótipos ainda afectam a nossa sociedade, o que pode ter um impacto negativo na carreira de muitos de nós. Ainda existem expectativas e padrões de comunicação fortemente associados à postura dos homens e das mulheres e isto, por conseguinte, pode impactar a sua avaliação no trabalho e atribuição de cargos de liderança. Contudo, é importante sabermos que, independentemente do género, partilhar conquistas e sucessos pessoais não é gabarolice.

Claro que existe uma linha que separa o marketing pessoal da blasonaria. Reconhecer o contributo e a ajuda dos outros, comunicar de forma assertiva e não nos escudarmos num simples “está tudo bem” quando os responsáveis questionam o estado das coisas são alguns exemplos. Não é obrigatório ser-se extremamente autorreferente mas criar uma narrativa e evidenciar que problemas é que solucionou, comunicar com energia e procurar feedback poderá evidenciar na medida certa o seu esforço e dedicação ao projecto. Por exemplo, em vez de “foi tudo graças à equipa”, podemos responder “muito obrigada. Esforcei-me imenso para conseguir entregar este projecto e com a ajuda da equipa conseguimos fazer um excelente trabalho”.

Numa era em que temos que aprender continuamente e dedicar o nosso tempo ao desenvolvimento pessoal, o marketing pessoal é crucial. O seu trabalho deve falar alto e evidenciar as suas qualidades. Mas para alguém reparar nisso, talvez precise de publicitá-lo um pouco primeiro. Afinal, se não fosse o marketing, talvez ainda não tivesse descoberto os produtos de que tanto gosta.

Lina Kulakova, nascida em Chernivtsi, Ucrânia, é atualmente QA Engineer na tb.lx. Com um background académico em Anatomia Patológica, decidiu mudar para a área das TI. Fundadora da comunidade de testes de software de Lisboa “QualityTalks”, já teve a oportunidade de ser Head of QA numa startup Suíça, participar em diversos projetos internacionais e ser formadora e mentora dentro da mesma área. Atualmente, para além de outros projetos pessoais, encontra-se a terminar a licenciatura em Matemática Aplicada. É certificada em ISTQB e é speaker em conferências nacionais e internacionais como UCAAT e GoogleDevFest.

O Observador associa-se à comunidade Portuguese Women in Tech para dar voz às mulheres que compõem o ecossistema tecnológico português. O artigo representa a opinião pessoal do autor enquadrada nos valores da comunidade.