Temos a fórmula perfeita para o mercado de trabalho não funcionar.

Por um lado, verificamos as empresas com necessidades de funcionários, preocupadas em atrair talento, com departamentos dedicados ao “employer branding”, a oferecerem (em alguns casos) salários competitivos e a terem déficits enormes de pessoas.

Por outro, temos pessoas, em geral, bastante qualificadas (44% têm o ensino superior completo), com acesso a informação e com experiência profissional, e não conseguem ter oportunidades de emprego.

O que se está a passar?

Carga fiscal elevadíssima

O tema já está bastante debatido e é um facto: há uma diferença abismal entre o custo de um trabalhador para a empresa e o salário líquido recebido pelo trabalhador. A solução da emigração torna-se numa opção (por vezes a única) viável para quem se recusa a receber no final muito aquém do que produziu.

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Com assimetrias destas, um trabalhador não é competitivo, e uma empresa não consegue ser atrativa. A solução tem de passar inevitavelmente pela redução da carga fiscal do trabalho. Não pode ser o fator fiscalmente mais penalizado (tanto para empresas como para pessoas).

Mais concorrência de empregadores

Em setores como a restauração e construção, a concorrência pelo talento não é só a empresa da porta ao lado e não é só a emigração. Surgiram novas formas de emprego (como as plataformas de entregas ou plataformas de transporte) que tornaram ainda mais escassa a mão-de-obra disponível.

E note-se que aqui nem estamos a falar de salários baixos, pois tanto na restauração, como na construção, como nas plataformas, os salários são igualmente baixos para quem recebe. A preferência pelas plataformas passa em grande medida pela flexibilidade de horário de trabalho e autonomia na gestão das horas a trabalhar, algo que os setores mais conservadores (restauração, construção e retalho) não têm qualquer possibilidade de oferecer. A forma como algumas empresas estão a ultrapassar esta escassez de mão-de-obra é (tanto quanto possível) automatizar algumas destas funções, tentando equilibrar mais a oferta e procura destas formas de trabalho (atendimento automático, self-service, etc.).

Geração mais qualificada de sempre

Será um problema para as pessoas que algumas funções manuais tendam a ser automatizadas? Não me parece. A maioria dos trabalhadores não querem empregos manuais e braçais. 44,3% da população entre os 30 e os 34 anos tem o ensino superior completo (era 10,7 % em 2000). Os trabalhadores têm, naturalmente, expectativas diferentes relativamente às funções a desempenhar. Por um lado, continuamos a forçar os nossos jovens a ser doutores, mesmo quando não é isso que os faz felizes. Não temos uma boa cultura de escolas profissionais que formem aqueles de que as empresas mais precisam – mecânicos, técnicos agrícolas, técnicos informáticos, técnicos de comunicação, etc.

Temos os trabalhadores com (e sem) qualificações a emigrar (até já foram convidados por governantes para o fazer). Os empregos que as pessoas querem são principalmente empregos qualificados. O trabalho remoto permite, para algumas das funções mais qualificadas, desempenhar funções para qualquer lugar no mundo, mesmo a partir de casa.

Mais uma vez, a concorrência das empresas para estes trabalhadores são as empresas do mundo inteiro. As empresas nacionais só se tornam competitivas quando os salários são competitivos, tendencialmente a nível mundial.

Leis de imigração paralisadora de empresas e imigrantes

As leis da imigração, em vez de facilitarem a chegada e acolhimento de imigrantes e de proteger as populações que estão a chegar, complicam e beneficiam os infratores que têm tudo para explorar populações vulneráveis.

Nem os imigrantes conseguem empregos e condições de vida dignas, nem as empresas cumpridoras conseguem suprir as necessidades de funcionários. O processo prejudica as pessoas que estão a chegar e penaliza muito estas empresas. Parece urgente a transparência e simplicidade do processo.

Não podemos ter uma postura em que não queremos ter uma nação xenófoba e depois criar leis que impedem a circulação de pessoas e o seu emprego.

São todos pessoas. “Apenas” pessoas que querem trabalhar e que querem ser tratados com dignidade e respeito. Nós somos um país de emigrantes e expatriados e quisemos ser bem recebidos.

Só conseguimos dignidade de habitação, trabalho, educação, sociais, quando todos forem tratados “apenas” como pessoas.

O mito da produtividade como responsabilidade do trabalhador

A produtividade é a maior desculpa de “mau pagador”: os portugueses são, em geral, bons trabalhadores e produtivos. Quando trabalham em outros ambientes são reconhecidos e estão (pelo menos) a par com qualquer outra nacionalidade. É óbvio que se eu for motorista de um Ferrari, consigo conduzir mais depressa do que se for motorista de um Twingo… Isso não faz de mim melhor condutora. Apenas tenho mais meios.

A burocracia do Estado consegue transformar qualquer empresa portuguesa de um Ferrari num Twingo. Mais uma vez, há que libertar as empresas de responsabilidades e exigências burocráticas e processuais totalmente improdutivas e estranguladoras (principalmente das micro e PME que não têm estrutura para o fazer).

O Estado tem a obrigação de libertar e permitir a agilidade do mercado de trabalho. Se nada mudar, a tendência é piorar…