Os radicais sempre colocaram os problemas apenas de um ponto de vista e apresentando-os na forma de alternativas extremas, sem posições intermédias. Neste tempo em que os radicalismos florescem, temos de aprender a reconhecer a falácia dos seus argumentos.

Em geral, isso consegue-se simplesmente observando os vários aspectos que a realidade comporta, não apenas o que nos querem mostrar. Se só se considera uma perspectiva, temos uma visão a uma dimensão (como a do burro com palas) e perdemos tudo o que as outras dimensões nos podem dar: a área, a forma, a consistência. E ainda temos de ter em conta as nuances que nos podem dar as cores: para o extremista só existe preto e branco, os bons e os maus. Não existem os tons de cinzento e muito menos outras cores.

Um exemplo clássico desta dicotomia redutora é a divisão do mundo político em esquerda e direita. A realidade política não se reduz a esta divisão, aliás um tanto ambígua uma vez que estas palavras em si não dizem nada sobre o pensamento subjacente. Na política, como em tudo, há diversas dimensões: estatista ou liberal, democrático ou autoritário, centralizador ou regionalista, conservador ou progressista, etc. E para cada par de conceitos temos todos os graus intermédios e ainda derivações. A insistência numa dimensão apenas, definida de modo ambíguo, é apenas uma estratégia para taxar uns de maus e outros de bons.

Os radicalismos mais recentes referem-se a causas: “Temos de deixar de comer carne da vaca porque as vacas emitem metano que é um gás que contribui para o aquecimento global”. É evidente que só se está a olhar para as vacas e para o problema do aquecimento global de uma perspectiva bastante estreita.

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Vejamos: se não comermos carne de vaca, o que a vai substituir? E para obtermos a mesma quantidade e qualidade de alimentos que uma vaca produz, quantos gases de efeito de estufa vamos produzir? Dito de outro modo: uma galinha produz muito menos metano do que uma vaca; mas quantas galinhas perfazem uma vaca? E uma alimentação baseada em verdes (o que a vaca come) não levará os humanos a produzir mais metano, pelo mesmo processo que a vaca o produz?

Podemos acrescentar ainda as perspectivas sociais de quem trabalha nessa indústria, as alterações na agricultura que gira em torno do gado bovino, a possibilidade de extinção da espécie por deixar de ter qualquer interesse comercial, etc. O problema não se reduz a um “não às vacas”.

Outro exemplo de visão unidimensional é a defesa do Bloco de Esquerda do fim das barragens porque a água evapora e é um bem precioso. Mas a água só é útil se puder ser utilizada. E o armazenamento em barragens é uma das melhores formas de a utilizar para a rega, para a produção e armazenamento de energia limpa, e para beber. Se não querem a água para isto, então para que é que a querem?

As contradições são típicas nestes raciocínios: não se quer as barragens por razões ecológicas e no entanto elas são uma das melhores formas de reduzir as emissões de gases de efeito de estufa.

Por isso, para definir políticas não nos podemos deixar levar pelos slogans simplistas dos radicais. As políticas devem definir-se a partir de estudos tão completos quanto possível, analisando todas as dimensões dos problemas. E depois monitorizam-se os efeitos, confrontando-os com o esperado e, se necessário, corrige-se o rumo.

Professor de Física na Universidade do Minho