Tenho o hábito de tentar olhar para tudo com equilíbrio de posição e interpretação. Vamos ver se, mais uma vez, consigo. As Jornadas Mundiais da Juventude (JMJ) foram um grande êxito caseiro e na esfera da Santa Sé. Parabéns a todos que as tornaram possíveis em tão pouco tempo. Pouco tempo de planificação e, acima de tudo, de realização. Somos os campeões do “desenrascanço” . Recuperou-se tempo perdido e isso exige uma saudação muito especial aos autarcas envolvidos. No meu caso, conhecendo as capacidades dos Senhores Presidentes das Câmaras de Lisboa, aquele que teve mais trabalho, e de Cascais, não me admiro. Quanto aos outros, não os conheço, mas ficaram devidamente cumprimentados nos parabéns que enderecei a todos que trabalharam para este sucesso nacional. Foram milhares de pessoas. A maioria, os que mais terão feito, estão e ficarão anónimos. Independentemente da sua confissão religiosa são todos bons Cristãos.

Escrevi que as JMJ tinham sido um grande sucesso caseiro, embora de índole que transcendeu a unidade paroquial, porque, em bom rigor, para lá dos reflexos que terão tido nos presentes, as JMJ não foram O Tema da comunicação social internacional. Pena que assim tenha sido. As mensagens de Sua Santidade, cobrindo inúmeros e importantes aspetos da atualidade e do futuro da Humanidade e do Mundo, mereceriam maior destaque. A seu tempo serão revisitadas e melhor compreendidas. Pelo que tenho lido e ouvido, há muita digestão ainda por fazer. Lamentavelmente, as exortações dos “improvisos” tão pensados do Papa Francisco, saborosas e cheias de força, talvez só fiquem nos cadernos de notas de jornalistas ou em algumas gravações que interessará transcrever. Foram Doutrina. A caridade não é só uma coisa de gente rica que gosta de ir “ajudar” os pobrezinhos. Tocou-me fundo a do “nojo da pobreza”, a assepsia de quem quer ser generoso sem ver, tocar, cheirar, sem verdadeiramente sentir o corpo e o espírito de quem sofre. O Santo Padre também é médico e não só das almas.

Finalmente, tardiamente, já todos terão percebido o engodo que foi a hipótese de retorno financeiro com as JMJ. Não se gastou tanto em altares como ao princípio se pensou. Houve, estou certo, alguma contenção e assomo de bom senso. Mas foram caras. Demasiado caras? Para quê o altar no Parque Eduardo VII? Por que não só no Trancão? Para quê e porquê tanta comida e bebida desperdiçada? Afinal que oportunidades de investimento com maior retorno social deixaram de ser feitas? Esta é e será sempre a pergunta mais importante. Não houve, com os turistas religiosos a que se chamou “peregrinos”, investimento turístico que se tenha visto. O melhor que podemos almejar é que alguns deles queiram cá voltar para reviver bons tempos. Desde que não volte a cidadã que foi filmada a “aliviar-se” na via pública, embora com o rolo de papel higiénico na mão. Ainda não há contas para ver. Se algumas vez forem publicadas, será com discrição e daqui a muito tempo. Mas tenho a certeza de que as contas de D. Américo Aguiar serão conhecidas e estarão certas, pelo menos essas.

Quanto a ganhos imateriais, sempre impossíveis de quantificar, já acredito que pode ter havido alguns. Confesso que a questão identitária de género, o tema minoritário recorrente de quem não quer falar de outras coisas significativas, não será o problema mais candente para os Católicos (com a exceção de uns fanáticos intolerantes que só servem para que haja quem se possa vitimizar). O que não quer dizer que as aflições de poucos não devam ser a preocupação de muitos, idealmente de nós todos. Também, já o tenho escrito, não me parece que o tema dos abusos sexuais deva ser a marca da Igreja Católica. Não se tome o todo pela parte. E, querendo “ir buscar” páginas mais negras da história religiosa da Europa, podemos sempre revisitar os massacres durante a Reforma, as piras para apóstatas e bruxas (também usadas por Protestantes), e muitos outros exemplos de comportamento reprovável de fiéis, de Papas e do Vaticano. E, no entanto, como terá dito Galileo, “eppur si muove” e a Igreja Católica Apostólica Romana resiste. As desculpas já foram pedidas, resta trabalhar na prevenção de danos futuros.

Não sei se houve conversões ao catolicismo, nem foi isso que o Papa veio pedir. Mas houve a oportunidade de nos fixarmos em Valores, aquilo que mais tem faltado na política de Portugal e na Europa (deixo o resto do Mundo para a apreciação dos leitores). Valores que devem ser de todos e para todos, por todos exigidos e julgados. Valores que têm de resistir a tudo o que de descrédito lhes tem sido atirado, de dentro e de fora. E na exaltação dos Valores ainda não vi referido o orgulho de bandeira, as verdadeiras Nações Unidas que estas JMJ foram. Foi bom, diria mesmo educativo, ver como as culturas se afirmam, exibindo as suas “cores”, em torno de um denominador comum, neste caso o Papa. É possível criar unidade na diversidade. Em segundo lugar, correndo o risco de ofender os mais internacionalistas do que eu, estas JMJ foram uma afirmação da Europa que se espalhou pelo Mundo e com ela levou os Valores que estão sempre ameaçados, mas de que não nos devemos esquecer. Em terceiro lugar, uma reflexão sobre a Europa que neste século XXI, como já o fez no passado, procura não perder uma ideia de unidade identitária. Por mais que isso queira ser contrariado por alguns espíritos pensadores, o conjunto de ideais mais perenes que pode unir os povos de génese Europeia, mesmo que estejam em Continentes diferentes, é o Cristianismo. É uma consequência histórica, começada na Ponte Mílvia e consolidada no Édito de Salónica, que não se pode alterar. Lembro-me de que isto estava nos manuais de História que, no meu tempo, se estudavam nos liceus. Tenho medo de ir ver os de agora e já nem isto encontrar. Se calhar estou a ser pessimista. Vou beber um copo de água e seguir em frente.

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