A adjunta do director do Plano Nacional para a Promoção da Alimentação Saudável garante que as alterações legislativas que proíbem a venda de bolos, croquetes e enchidos nos bares dos hospitais não vão afastar os clientes. Porquê? Porque “quem consome nestes espaços fá-lo porque tem de ser”. É muito interessante o despudor satisfeito com que a senhora adjunta alardeia a sua capacidade para condicionar a vontade de cidadãos livres.

Não sei se a senhora adjunta leu Helvétius. É possível que não. Claude-Adrien Helvétius, nascido em 1715, foi arrematador de impostos para o Rei de França e amigo de Voltaire e Montesquieu. Ao contrário da maioria dos pensadores do Iluminismo, desconfiava da natureza humana. Considerava os homens, nas palavras de Isaiah Berlin (*), “demasiado ignorantes, demasiado cegos”. E recomendava a criação de um sistema “que recompense os homens sempre que façam algo que conduza a maior felicidade e os puna quando pratiquem algo que a reduza.” No admirável mundo novo de Helvétius não há liberdade para praticar o mal.

Berlin argumentou, contra esta “tirania tecnológica”, que “uma das coisas mais valiosas na vida humana é a escolha pela escolha, não apenas do que é bom, mas a escolha enquanto tal”. Ainda que fosse certa a felicidade, “não é claro que a felicidade seja o único valor que o homem busca”. O argumento de Berlin é simples e poderoso. Mas, do lado dos proibicionistas, há outros argumentos para além da crença ingénua na felicidade por decreto. Argumenta-se, por exemplo, com os interesses da comunidade e os deveres de cidadania. Os amadores de fast food, tal como os condutores que não usam o cinto de segurança, custam ao Estado dinheiro que seria mais bem empregue a tratar doenças como o cancro. São os custos de oportunidade. O argumento é pertinente. Como escolher?

(*) Isaiah Berlin, “Rousseau e outros cinco inimigos da liberdade”, Gradiva (2005).

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