Estes últimos anos estão muito loucos, mas não tais os loucos anos 20 cheios de folia do século passado. Não se vive nenhum ambiente eufórico, não ressoa o jazz nem se dança charleston, tango e foxtrot. Não nos deslumbramos com os cenários de art déco, nem nos vestimos para festas de glamour. Não se vive nenhuma ascensão económica nem se desenvolvem novas tecnologias e indústria com prosperidade. Não estamos no pós guerra; parece que estamos na década anterior ou posterior, entre a crise e o declínio. Atravessamos uma era difícil e o mais manifesto à nossa volta é um ambiente de fatalidade. Vivemos com pouco ou quase nenhum entusiasmo.
Enquadramo-nos à beira de um cenário mais pró black tuesday, sentindo-nos derrotados. Não estamos entusiasmados nem esperançados. Olhamos um horizonte um tanto desfocado. Estamos tristes, estamos cansados.
Mesmo com a chegada da primavera, não despertou a sensação de renovação como esperado. E, perante o mal estar do contexto envolvente que não nos é indiferente, resta-nos uma palavra muito em voga no senso comum, resiliência. Ou fazendo uso de outra, quase seu sinónimo, resistência. Resta-nos suportar, aguentar e tendo de nos contorcer e ajustar, fazer por não nos deformarmos e transfigurarmos por completo. Um lugar da nossa essência ainda sobrevive.
É verdade que grandes sustos, perdas, guerras, transformam-nos e deixam danos irreversíveis. Mas, sendo inevitável ter de aceitar as condições desfavoráveis que não controlamos, mantermos a firmeza e a coragem pode ajudar qb. A dita aprendizagem da vida nem sempre é feita pelos caminhos mais doces e quanto mais passam os anos, as cores por vezes empalidecem e desbotam. Algures, no entanto, há um farol que indica que a vida é cíclica e como tal, melhores tempos virão sempre. Houve-os atrás, virão adiante. No entretanto, continuar a andar com a cabeça entre as orelhas como cantava o Sérgio, ou a nadar como dizia a Dori ao seu amigo, para o ajudar a fazer face ao desespero de não encontrar o seu pai. As histórias tristes também não só coincidem na sua multiexistência desastrosa, sendo possível intercalar pequenos momentos que sopram algum alento.
Há um lado da tristeza que nos coloca mais em contacto connosco e com os outros, que proporciona sentir empatia, que nos sensibiliza. E por conseguinte, faz-nos pensar e reflectir. Tal, faz reequacionar um conjunto de valores e princípios. Um lado não mau dos momentos difíceis. Não que resolva mas é certo que um trabalho de aceitação, de integração do pensamento, suaviza. As pessoas mais criativas, ajudam a acrescentar umas doses de humor, e sabemos bem, como o uso do bom humor é sempre um bom recurso.
Manter a noção que tudo, mal ou bem, vai ter de passar porque a história também assim o diz, outras festas virão, mesmo sem saber em qual ano dos 20, deve-nos servir como alavanca para não entorpecer em terrenos pantanosos com o melhor discernimento possível. Não somos super-heróis, somos humanos, temos um tecido mole mas uma base estrutural que nos permite manter erguidos e fazer jus à nossa força. É também premente o sentimento de desejo e retomar a esperança.
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