A vaga da violência xenófoba na África do Sul não travou o sonho de três jovens moçambicanos do interior de Chibabava, província de Sofala, de emigrarem para o país vizinho e tornarem-se “homens”.

“Soube dos ataques contra estrangeiros, mas reuni dinheiro por muitos anos para ir a África do Sul, para dar peso à família e conseguir conquistar e casar com uma mulher, e esta é a minha oportunidade”, disse à Lusa Filipe Thausen, 19 anos, sorridente, momento antes de iniciar a viagem ilegal, num “chapa” (semicoletivo de passageiros) de matrícula sul-africana, apesar da vaga de violência contra estrangeiros no país vizinho.

Com as poupanças da venda de ananás e castanha de caju, e para fugir dos altos índices de pobreza em Moçambique, milhares de jovens das zonas rurais do sul e centro do país, emigram ilegalmente para a África do Sul, à procura de melhores condições de vida numa das principais economias do continente.

Os emigrantes chegam a pagar até 15.000 meticais (375 euros), pela viagem e travessia ilegal da fronteira, e são depois “oferecidos” a fazendeiros como mão-de-obra barata em explorações agrícolas e pomares, ou apenas entregues à sua sorte.

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“Vou lá fazer negócio. Só posso prosperar na África do Sul para garantir o sustento da minha família em Rambananhe (sudeste de Muxúnguè)”, declara Tomás Machava, 23 anos, antes de iniciar a viagem, levando somente um saco plástico com pares de calças e uma tigela com frango assado preparado pela mãe.

Desde que os ataques contra estrangeiros começaram na África do Sul, estima-se que mais de 2.000 moçambicanos tenham regressado ao seu país, em caravanas organizadas pelo Governo de Maputo ou pelos seus próprios meios.

Os distritos de Chibabava (Sofala) e Machaze (Manica), zonas pobres e com terras inférteis, são os principais fornecedores de mineiros para África do Sul, onde chegam e de onde partem todas as terças e quintas-feiras os semicoletivos de passageiros.

“Tenho o endereço de um primo que já trabalha nas ‘farmas’ (aportuguesamento da palavra ‘propriedade’) na África do Sul e ele garantiu que trabalho não falta. A propriedade onde trabalha não foi vandalizada nem atacada, por isso estarei em segurança”, disse por seu lado Zacarias Titosse, exibindo uma cédula pessoal, o único documento que detém.

Com 19 anos, Titosse largou o 8.º ano de escolaridade com o objetivo de se tornar “madjoni-djoni”, nome dado aos mineiros moçambicanos que trabalham na África do Sul,

O Presidente sul-africano já condenou a vaga de violência xenófoba no seu país e que já matou pelo menos três moçambicanos, mas acusou em simultâneo os estados vizinhos de contribuírem para a violência ao permitirem grandes remessas de migração ilegal.

A vaga de violência teve início após declarações atribuídas ao rei zulu, Goodwill Zwelithini, convidando os estrangeiros a fazer as malas e a partir, e que o próprio disse posteriormente ter sido mal interpretado.